etimologia da língua portuguesa nº87

Etimologia da Língua Portuguesa por Deonísio da Silva Nº87.

Noiva, do latim nupta, recém-casada, misturou-se na antiga Lusitânia com nova, nova. E a futura esposa passou a ser noiva. Já tanga, do quimbundo ntanga, é inseparável do impacto que o recém-anistiado de volta ao Brasil causou na praia por vestir a parte de baixo de um biquíne.

Coletiva: feminino de coletivo, do latim collectivus, ajuntado, reunido. A raiz é a mesma do verbo colher, por sua vez radicado em ler, do latim legere, que significa reunir, colher. Na imprensa, a palavra coletiva descolou-se da expressão entrevista coletiva. Passou de adjetivo que qualificava a sessão de perguntas e respostas a substantivo que a designa. Tal mudança foi registrada na década de 1980, quando a abreviação e a síntese passaram a dominar a mídia, às vezes com certo exagero. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu apenas duas entrevistas coletivas, mas nenhuma pode ser classificada como tal, vez que os jornalistas não tiveram direito a réplicas. Faziam a pergunta e, ouvida a resposta, não podiam aprofundá-la com réplicas . Quem mais perdeu foi o público. Antes de chegar ao poder, o então candidato encantava os jornalistas com sua argúcia e original perspectiva ao comentar os problemas nacionais.

Noiva: do latim nupta, casada, feminino de nuptus , casado. O português registra a palavra entre o final do século XII e começo do século XIII, décadas antes de noivo. É provável que os antigos romanos, quando ocuparam Portugal, então denominado Lusitânia, falando um latim vulgar, misturaram nupta, mulher recém-casada, com nova, feminino de novus, novo. E a mulher prometida em casamento ou já casada passou a ser conhecida como noiva. Mas as histórias de amor, cujo final feliz foi sempre o casamento, ganharam outras cores na televisão, onde, principalmente nas telenovelas, nem sempre noivos e noivas foram indispensáveis. Com o gênero consolidado, na década de 1980 apareceram telenovelas, que substituíram namoros, noivados e casamentos por casos, paixões e rolos, que são exemplos Tieta, em que o harém do coronel Artur da Tapitanga , prefeito da cidade vivido por Ary Fontoura, era povoado de rolinhas e não de odaliscas. Betty Faria, a Tieta, tinha um caso com o sobrinho Ricardo, Cássio Gabus Mendes, filho da ressentida Perpétua, vivida por Joana Fomm, viúva que guardava numa caixa branca o órgão genital do falecido marido. Quando vieram as minisséries, prosseguiram os amores heréticos e ilegítimos, mas em outras bases, como em Dona Beija e Marquesa de Santos, personagens históricas vividas por Maitê Proença ; em Rabo de Saia, o caixeiro viajante Quequé , Ney Latorraca era casado com Eleuzinha , Dina Sfat (1938-1989), mas tinha dois rolos: com Santinha, Lucinha Lins, e Nicinha, Tássia Camargo. Cada uma das três achava-se que era a única, mas o público sempre soube que o ousado Quequé tinha uma mulher em cada Estado: Pernambuco Alagoas e Sergipe.

Redução: do latim reductione, declinação de reductio, redução ação de trazer de novo, recuar, levar para trás. A busca de síntese atinge as palavras. Na língua falada, principalmente na gíria., vem ocorrendo uma redução vocabular impressionante, cujas alterações atingem o próprio léxico, em geral com a exclusão das últimas sílabas, de que são exemplos moto para motocicleta, profe para professor ou professora, apê para apartamento. Moto, redução de motocicleta , existia no latim com outro sentido e designava o conjunto de palavras que os cavaleiros medievais traziam inscritas em brasões ou bandeiras. Redução designa também um tipo de formação social que existiu nos séculos XVII e XVIII, em territórios hoje pertencentes ao Brasil, Paraguai e Argentina. Cerca de 40 reduções jesuíticas constituíram a República Guarani, que chegou a reunir 300000 índios. Foi destruída na metade do século XVIII. Três dias antes da batalha decisiva, a de Caibaté , no Rio Grande do Sul, morreu o líder indígena Sepé Tiaraju, abatido por forças pertencentes ao maior exército europeu do período, destacado para fazer cumprir os acordos entre Espanha e Portugal.

Tanga: do quimbundo ntanga, tanga, pedaço de tecido que povos antigos utilizavam para cobrir o espaço que vai do ventre às coxas, a fim de evitar arranhões e outros desconfortos da vida na selva. Designou também proteção semelhante adotada pelos índios. Entre os brasileiros civilizados, tanga foi sucessora do biquíni. O jornalista e hoje deputado federal Fernando Gabeira, escandalizou o país ao posar para os fotógrafos vestindo apenas minúscula tanga. Voltava do exílio, no verão de 1979-1980, quando a abertura política dava os primeiros passos no governo d João Batista de Figueiredo (1918-2000). A fotografia foi feita nos arredores do Posto 9, na Praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. A tanga de Fernando Gabeira tinha sido a parte de baixo do biquíni da também jornalista Leda Nagle, sua prima, que lhe emprestara.

Deonísio da Silva é doutor em Letras pela Universidade de São Paulo, diretor do Curso de Comunicação Social da Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, autor de De Onde Vêm as Palavras (A Girafa, 14ª edição) e Avante, Soldados: Para Trás (Siciliano), entre outros 28 livros. E-mail: deonisio@terra.com.br

Revista Caras

2005

Doutor Deonísio da Silva
Enviado por zelia prímola em 16/07/2017
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