Entrevista com o escritor
Mingau Ácido (Marcelo Garbine)
por Adriana Fernandes e Priscila Barros

Entrevista publicada no blog Café com Amigas

Entrevistadoras: Adriana Fernandes e Priscila Barros
Entrevistado: Mingau Ácido (Marcelo Garbine)

A entrevista de hoje é com uma pessoa incrível cujo trabalho eu já admirava e tive o prazer de conhecer um pouco mais nos últimos meses. É uma das mentes mais brilhantes que já vi. Inteligentíssimo sem ser arrogante, talentoso e humilde, sensível e ao mesmo tempo, como o próprio se denomina, ácido.

É o Marcelo Garbine, mais conhecido ultimamente através de suas crônicas onde escreve como Mingau Ácido, e eu não posso deixar de comentar que uma dessas crônicas foi analisada recentemente em trabalho acadêmico! Mas ele não é só um cronista excepcional como escreve poemas, músicas e luta para difundir a cultura divulgando e patrocinando outros talentos.

Café: Marcelo, eu já soube que você foi uma criança precoce, que leu George Orwell antes da adolescência. Pode contar um pouco sobre a sua infância ?

Mingau Ácido: Aos três anos, eu ditava estorinhas para a minha mãe escrever em papel almaço. Ela recortava e grampeava em forma de livrinho, com direito a capa, título e minha assinatura como autor. Os meus olhinhos pueris encantavam-se e brilhavam de alegria. Era divertido. Eu era bem introspectivo, cheio de amigos imaginários. Não brincava com as outras crianças. Divertia-me mais no meu mundo e ficava emocionado com as coisas que a minha imaginação criava. Lembro-me que, com cerca de oito anos, eu olhava objetos, como a toalha da mesa da cozinha, observando suas formas geométricas e, através delas, inspirava-me para compor músicas. Com doze anos, eu fazia paródias com as minhas músicas preferidas dos anos oitenta. Geralmente, as das bandas de rock nacional. Eu não gostava dos livrinhos infantis colocados à disposição das crianças, na escola. Eram medíocres e subestimavam as nossas inteligências. Títulos como “O tatuzinho feliz” davam-me nos nervos. Com dez anos, eu li “A revolução dos bichos” de George Orwell. A estória ficou na minha cabeça e, conforme fui crescendo, pude compreender que se tratava de mais que uma estória de porquinhos e cavalinhos: era uma crítica ao totalitarismo. Creio ser esse tipo de literatura que deva ser apresentado às crianças. O conteúdo será assimilado com o tempo, conforme se desenvolvem e amadurecem.

Café: Sei que escreveu diversas letras de músicas. Quais são seus ídolos inspiradores?

Mingau Ácido: Com doze anos, eu fazia paródias com as minhas músicas preferidas dos anos oitenta. Geralmente, as das bandas de rock nacional.O Renato Russo foi o meu ídolo de adolescência. Os jovens da minha geração, a geração X ou geração Coca-cola, deixaram-se levar. Essa visão de mundo emprestada do Renato deu-me um gosto peculiar pela nuança maviosa da vida, entretanto, também, fez doer, lá no fundo do coração, quando o choque da realidade bruta deu as caras. A saída, para não abandonar o que me era doce, foi forjar um espírito humorístico para acalentar o que se manifestava por aspereza.

Café: Com uma infância tão intensa, acredito que a adolescência não tenha sido diferente. Soube que publicou seus primeiros livros antes dos dezoito anos. Fale um pouco sobre aquela época e conte-nos sobre tão tenras conquistas.

Mingau Ácido: Publiquei os meus primeiros livros aos dezessete anos: “A ressurreição do poeta” e “A refeição dos micróbios”. Eu dava palestras sobre os livros, em escolas, para adolescentes da mesma idade que eu. Na adolescência, eu me apaixonei por Franz Kafka e Hermann Hesse. Com o Kafka, eu aprendi uma nova linguagem. O homem anti-social e com problemas familiares fez-me compreender um paralelo novo de expressão pra mim. Já o Hermann Hesse fez com que eu antevisse o meu futuro e constatasse, vinte anos mais tarde, que, para o bem ou para o mal, eu estava certo. Era tudo muito previsível, mesmo que eu não quisesse aceitar. Ao falar sobre esses dois autores, acabo ficando abstrato demais. Acho que é algum bloqueio. Algo que eu não quero que as pessoas saibam. Com o Machado de Assis, pude organizar melhor as minhas ideias soltas. Sua literatura robusta ajudou-me a não permitir que um turbilhão de pensamentos fosse dissipado na minha mente. Ainda jovem, pude complementar o meu conjunto de formação intelectual com os filósofos socráticos.

Café: Agora falemos sobre filmes! Quais são seus diretores e obras prediletas ?

Mingau Ácido: No cinema, eu aprendi muito com Woody Allen, Buñuel e Roman Polanski, principalmente, mas os meus diretores preferidos são Stanley Kubrick e Vittorio de Sica. Em segundo plano, entram Bernardo Bertolucci e Pasolini. Conservo especial predileção por filmes épicos que contam a história das revoluções russas do século XX e seus desdobramentos, como: “Encouraçado Potemkin”, “Doutor Jivago”, “Stalin”, “O círculo do poder” e outros. Dos brasileiros, eu gosto do Nelson Pereira dos Santos e das críticas sociais do Sérgio Biachi.

Café: Eu conheci primeiro o Marcelo Mingau Ácido e só depois fui conhecer o Marcelo poeta. Confesso que parece que há duas pessoas na mesma mente! Quais poetas mais admira?

Mingau Ácido: Tratando-se de poesia, faço menção a Mário Quintana e Fernando Pessoa. Musicalmente, nos dias atuais, apesar de gostar muito de música clássica e New Age, é através da MPB que encontro o descanso do meu espírito, destacando-se: Milton Nascimento, Lô Borges, Flávio Venturini, Zeca Baleiro, Tim Maia, Elis Regina, Paulinho Moska, Guilherme Arantes, Vanessa da Mata e Gal Costa. O Chico Buarque ocupa um degrau mais elevado porque também o admiro no campo da literatura. Aprecio a obra de um músico amigo, que também é produtor musical, o Pedro Georges Eleftheriou. Na infância, eu me divertia escrevendo estórias cômicas. Na adolescência, eu descobri a expressão através dos versos. A partir daí, o meu natural, quando ficava de frente com um papel em branco, era exprimir-me com poesias. Lutei para romper essa minha tendência e resgatar a arte através da prosa, que estava dormente dentro de mim.

Café: A sua formação profissional nada tem a ver com artes. Como foi esse processo?

Mingau Ácido: Houve um desvio muito forte na minha rota. Fiz faculdade de economia e depois me tornei funcionário público do poder judiciário. A literatura e a poesia continuaram acompanhando a minha trajetória, mas ficaram, artificiosamente, ofuscadas, relegadas aos momentos de profunda inspiração. Evidentemente, era uma bomba relógio que, uma hora, explodiria. Por isso eu estou aqui. Atualmente, escrevo sempre, independentemente de inspiração. Cobro-me profissionalismo. Consigo escrever uma crônica de humor, mesmo nos momentos em que não estou bem, no meu íntimo.

Café: Quando você diz “relegadas aos momentos de profunda inspiração”, o que quer dizer? Como expressava seu lado artístico e criativo durante a faculdade de economia?

Mingau Ácido: Com dezoito anos, durante a faculdade, eu compus muitas poesias e músicas. Era um estado ambíguo. Coexistiam um curso superior que nada beneficiava a minha criação e um rio na alma que insistia em escorrer pra fora. Para desafogar o ânimo, fui ser redator de textos comerciais numa rádio, já que era técnico em publicidade. Logo, fui convidado, também, para escrever as noticiais – que eu gostava de inventar (risos) – e as poesias de um programa noturno chamado Night Music. Todos os dias, à meia-noite, o locutor lia uma poesia minha. Eu entrava em êxtase vendo as coisas que eu criava, naquela tenra idade, sendo difundidas pelas ondas do rádio. Era pura brincadeira mesmo. Fazia bem pra mim.

Café: Agora quero saber sobre o Marcelo cronista, de humor ácido, irônico, que costuma me fazer rir. Acredita que esse seu lado tenha sofrido algum tipo de influência?

Mingau Ácido: Fui muito influenciado pela nova era do humor inteligente: essa turma que veio com o programa humorístico CQC. Fiquei encantado com esse veículo, que utilizava o humor para falar de coisas sérias. Políticos e poderosos, que abusam da ignorância do povo desde a época do militarismo, ficaram desconcertados com essa reinvenção da linguagem jornalística, não acompanhada por eles. Para cada ação existe uma reação. A zombaria dos governantes do povo foi replicada com a zombaria do humor inteligente. Achava o máximo quando os repórteres humoristas perguntavam para os deputados, por exemplo, o que é a Lei Maria da Penha, o nome do ministro da agricultura ou qual das duas Coréias é comunista e eles não sabiam. Finalmente, estava desnudado o nível do típico representante do povo brasileiro, o primeiro passo para que se tome consciência e o rumo da história comece a mudar para melhor.

Café: Quais humoristas você admira e o que faz admirá-los?

Mingau Ácido: Do CQC, saíram Rafinha Bastos e Danilo Gentili, dois revolucionários humoristas. Eu os admiro muito. Eles me ensinaram que é possível brincar com tudo. A rapidez de raciocínio do Danilo fez com que algo fosse despertado lá no fundo do meu “eu” e a resiliência do Rafinha transmitiu a força e a coragem que eu precisava. Acompanhei todas as suas polêmicas, entrevistas e reações. Meus olhos arregalavam-se toda vez que eu via aquele cara tomando bordoada de todos os lados e permanecendo de pé. Muito se ganha sendo autêntico. Acredito que um dos segredos do sucesso seja ser você mesmo em todos os instantes. Minha desenvoltura, ao falar, não é sagaz como a deles, mas tenho o meu estilo próprio e, quando desfruto do tempo que necessito, diante de um documento de Word em branco, consigo produzir textos que agradam um público.

Café: Como você fez para separar o Marcelo poeta do Marcelo do Mingau Ácido?

Mingau Ácido: Quando as minhas crônicas e as minhas poesias passaram a habitar o mesmo espaço publicamente, fiquei preocupado em como administrar isso, sem confundir o leitor. Conservava um leve receio de que o poeta afetasse o cronista ou, principalmente, de que o cronista afetasse o poeta. Com essa onda falso-moralista do politicamente correto de hoje em dia, decidi tomar as devidas precauções, alertando os leitores que eu fazia apenas humor, não escrevia teses de doutorado e nem tratados políticos, mas, mesmo assim, receava, ao escrever uma crônica polêmica, cortar o coração de alguma leitora que gostasse das minhas poesias românticas. A solução mais razoável, que eu consegui imaginar, foi criar um alter ego para assinar as crônicas de humor, o Mingau Ácido. Mesmo assim, muita gente confunde o Marcelo Garbine com o Mingau Ácido.

Café: Algumas pessoas, ao contrário de mim, conheceram primeiro as suas poesias. Houve algum tipo de rejeição ao novo estilo por parte dos admiradores do Marcelo poeta?

Mingau Ácido: Algumas leitoras, assumidamente, pollyannas, que gostam de enxergar o mundo cor-de-rosa, relutam em aceitar que o autor de poemas, que as fazem suspirar, seja o mesmo que escreve crônicas de humor ácido, que, mesmo conservando um estilo literário com uma classe que as agrada, fere os seus paladares líricos apurados, diante da visão de universo que as apraz. No outro extremo, estão os leitores sequiosos pelas alfinetadas recorrentes do temperamento ácido da comédia. Os mais radicais desse grupo não me querem ver derretendo-me ao contemplar o nascer do sol. Tive que me impor nesse sentido. Separei o máximo que pude, mas faz parte da assimilação do meu gênero a compreensão do equilíbrio desses elementos.

Café: Eu conheci suas crônicas através do Geração X2. Fale um pouco dessa parceria com o pessoal de lá.

Mingau Ácido: Com a turma do Geração X 2: Kchaço, Marreco, Linguiça, Chups, Carol e os demais, eu gravo podcasts (arquivos de áudio), nos quais falamos sobre temas existenciais e humorísticos. Lá, também escrevemos textos de humor ácido, que é a proposta do espaço. Eu gosto muito do blog e da turma. Apesar de ter um site que é só meu – Mingau Ácido – eu sinto um prazer enorme em fazer parte de um grupo, no qual trabalhamos juntos. Somos uma equipe. Na hora de divulgar uma nova crônica, geralmente, eu posto links para o Geração X2, mesmo com a opção de postar para o meu site. Considero mais gratificante trabalhar pelo grupo do que de forma individual. E essa preferência pessoal está presente em todos os instantes no meu trato com o público. É prazeroso fazer parcerias com escritores e poetas que eu admiro, como Eduardo Benetti, Rubem Leite, Ely Monteiro, Suely Sette, Cristiane Vilarinho, Simone Guerra e vários outros. Tenho consciência de estar fazendo injustiça por não citar diversos escritores e poetas, mas os admiro também e manifesto por eles a mais sincera gratidão.

Café: Já tive o prazer de ver suas poesias sendo declamadas várias vezes por pessoas diversas. Sei que é admirado por muita gente e também sei que você costuma ajudar na divulgação de vários talentos. Conta um pouquinho sobre essas parcerias.

Mingau Ácido: O Marreco foi um colega de faculdade e república estudantil, que eu encontrei, depois de dezessete anos. Ele me convidou para escrever no Geração X2. Ele é multimídia, faz um monte de coisas. Uma de suas atividades é como palestrante. Tive o privilégio de assistir a uma de suas palestras. Ele, carinhosamente, declamou uma poesia minha, enquanto falava, no palco. Eu fiquei muito honrado. A Suely Sette e a Cristiane Vilarinho acreditam muito no meu trabalho, estão sempre incentivando. Inclusive, a Suely, a quem chamo, merecidamente, de Rainha, gravou uma poesia minha, que foi ilustrada com imagens e editada pelo seu filho, Daniel Sette. O Eduardo Benetti é um poeta que eu admiro. Ele está alcançando grande reconhecimento, sendo nomeado para várias Academias de Letras do Brasil e do exterior. E eu já tive a honra de patrociná-lo por duas vezes. A primeira, em sua nomeação para a Academia de Letras e Artes de Valparaíso – Chile. Estive presente na solenidade de sua nomeação, que aconteceu em Foz do Iguaçu. E, a segunda, para a Academia de Letras de Vitória – Espírito Santo. O Rubem Leite é outro escritor que admiro. Ele sempre recomenda as minhas crônicas, no rodapé de seus trabalhos literários. Recentemente, tive a honra de ser analisado por ele em um trabalho acadêmico. A Simone Guerra já me convidou para escrever texto a duas mãos. Poderia citar inúmeros leitores, como a Márcia Silva e a Alaíne Fonseca, que me acompanham desde o princípio, mas sei que vou esquecer nomes e não quero cometer injustiças, E, é claro, sou muito grato a você, Adriana Fernandes, e à Claudinha Cacau, que são tão gentis no trato comigo e com os meus escritos. A Cacau, desde o início, abriu vários espaços pra mim, em grupos de literatura do Facebook. Eu sou muito feliz por ter amigos maravilhosos.

Café: As pessoas costumam retribuir um pouco daquilo que recebem e uma pessoa gentil e educada como você só poderia ter amigos maravilhosos mesmo. Além de ajudar os amigos talentosos, como costuma contribuir para um mundo melhor?

Mingau Ácido: A minha paixão pela história foi uma constante na minha existência, todavia houve uma fase em que ela se tornou mais latente. Durante os dois últimos anos da faculdade, uni todo o meu conhecimento de autodidata nessa área para lecionar a disciplina num trabalho voluntário. Aliás, o trabalho voluntário é algo que considero de suma importância. O meu senso solidário é bem vasto. Contribuo com várias instituições de caridade. Pra mim, tudo só faz sentido com responsabilidade social. Estimo muito os animais, principalmente os cachorros. Tenho planos de direcionar parte dos lucros com o próximo livro para a causa de defesa dos animais. Também considero a doação de sangue muito importante, dôo sangue sempre quatro vezes por ano. É importante lembrar que os homens podem doar sangue quatro vezes por ano e as mulheres, três vezes. Com esse gesto simples, que não nos custa nada, salvamos vidas.

Café: Agora falando de assuntos do coração. Fiquei sabendo que a menina das covinhas arrebatou o seu!

Mingau Ácido: A minha musa inspiradora é a Camila Giacometti. Expressei o meu amor cândido por ela na minha poesia “O tempo, a Camila e as covinhas”.

Café: Já pensou em escrever um romance ?

Mingau Ácido: Eu sempre penso nisso. Existem quatro estilos literários que eu penso em começar a escrever: infantil, autoajuda, romance e roteiro. Quanto ao romance, primeiro eu preciso começar a controlar a minha ansiedade porque quando começo uma estória, quero concluí-la apressadamente. E eu estou tendo um feedback tão bom com as crônicas, que, por enquanto, vou continuar com elas mesmo

Café: Se um dia você publicar um romance estarei na pré-venda, pode ter certeza (risos). Mas pode me dizer agora quais são seus objetivos mais concretos?

Mingau Ácido: O meu foco no trabalho literário, poético, musical e humorístico é imensurável. Mas os meus objetivos práticos futuros não são claros. Existem tantas coisas que eu gostaria de fazer que ainda não consegui estabelecer uma ordem de prioridade. Só sei que quero desempenhar o meu trabalho criativo e quero que os meus amigos sejam vitoriosos junto comigo.

Marcelo, quero primeiramente agradecer pelo tempo cedido ao nosso blog, pela simpatia , pela gentileza e educação e também desejar que tenha sucesso e que consiga alcançar todos seus sonhos e objetivos. Você merece!

Se você quiser, pode ler a entrevista original no blog Café com amigas, clicando aqui

Marcelo Garbine (Mingau Ácido) – @mingauacido – mingauacido.com.br

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