Vai Uma Memória Aí?

 

Estamos no ano de 2036 e a Dona Sílvia já com setenta e cinco anos nunca imaginou que chegaria até aqui inteira e lúcida.
A  família toda está reunida para um almoço especial. Não é aniversário de ninguém, nem festa para comemorar alguma data específica. A família vai  almoçar aquela comidinha caseira gostosa, nada de delivery, muito menos fast food. Apenas boa comida e  papo, muito papo gostoso.
A família vai chegando aos poucos e os últimos que chegam são os bisnetos, Max e Theo, que pegam o resto da família no meio de uma conversa sobre o tempo da infância e  das traquinagens.
Max e Theo  estão naquela fase meio que complicada da transição de adolescente para jovem adulto onde, 'Se não me diz respeito, não tenho interesse'. Mas, por algum motivo, a conversa cai bem aos ouvidos dos jovens e ambos ficam bem ligados  enquanto  seus pais, tios, primos e a bisa contam suas histórias.
Do nada, o Max interrompe o Tio Mário e pergunta, "Nossa Tio! Como é mesmo o nome desse jogo?"
O tio faz cara de quem não entendeu e questiona, "Que jogo, Max?"
"Esse jogo que você acabou de comentar, oras." "Não é nenhum jogo, menino. É uma lembrança da minha infância. Pôxa! Tudo é jogo, game para vocês!"
"Lembrança? Como assim, uma lembrança, Tio Mário?"
"Uma lembrança, Max ... uma memória, uma recordação  que guardo comigo de quando era criança. Assim como tenho muitas outras que daria para escrever um livro do tamanho da bíblia." O Tio Mário solta aquela sua gargalhada gostosa ainda com jeito de moleque. Ninguém resiste e todos acabam rindo juntos com o tio.
O Max olha para o seu primo e pergunta, "Você tem alguma lembrança assim, Theo?"
Theo diz que não, mas ele lembra do primeiro Play Station que ganhou quando tinha três anos. Max também se lembra daquele dia. Ele tinha três também, quase quatro.
"Você ganhou no seu niver, né?"
Theo meio que sem jeito responde, "Acho que foi no Natal. Não foi, mãe?"
A mãe do Theo responde que nem um, nem outro. "O jogo você ganhou no Dia das Crianças, filho." "Aha! Sabia que era uma data especial." E os dois jovens se acabam de rir.
Já no fim da tarde, os dois primos ficam de conversa na varanda, sem celular, sem joguinho. Foi um pedido da  Bisa Sílvia, na verdade ela proibiu qualquer tipo de hi-tech gadget na sua casa naquele dia. Ela jurou que se pegasse, quebraria em pedacinhos.
"Theo, sabe, fiquei com invejinha branca do pessoal e das lembranças que elas contaram. E eu sem nenhuma."
"Sabe que também fiquei!"
"Coisa boa essa de, 'Ter lembranças, memórias', né?"
"Achei da hora a cara da família  toda quando contavam suas histórias. Parecia que estavam passando para a última fase de um jogão daqueles
bem fodão!"
Os meninos riram muito, mas a vontade de ter 'lembranças', que nem aquelas que ouviram, não saia da cabeça deles.
E lá se foi um  mês inteiro quando a Bisa Sílvia encontrou com os meninos na casa da Vó deles, a Renata.
"Tomaram chá de sumiço vocês dois, foi?"
"Nada disso, Bisa linda!", respondeu o Theo todo sorridente e beijoqueiro.
"A gente tava dando duro no trabalho, Bisa, mas de boa, tudo de boa", acrescentou o Max todo orgulhoso e sorrindo mais do que o Sílvio Santos.
"Desde quando vocês dois trabalham?"
"Fizemos um tremendo 'brainstorming' depois daquele nosso incrível almoço e, eureca! Conseguimos fazer um jogo muito da hora, Bisa! Já temos um  Start Up que está interessado em comprar o jogo. Tem umas duas semanas que estamos focados só nesse game. Vamos ficar ricos!"
A Bisa Sílvia está impressionada com a história dos meninos. Tão novinhos e já fazendo sucesso no mundo dos games.
"Então meninos, do que se trata esse tal jogo que vai fazer vocês ricos?"
"Nesse jogo o gamer  vai em busca das suas próprias lembranças. O jogo começa com o gamer ainda bebê e daí começa a sua busca, o 'pursiut', atrás das lembranças que quer ter."
"Na verdade, Bisa, ele cria suas próprias lembranças, ou pode escolher do menu, e depois  salva tudo aquilo que lhe interessa. O bacana mesmo é que o gamer pode apagar e acrescentar novas lembranças quando bem entender."
A Bisa não entendeu qual era a vantagem de comprar um jogo desses, mas o Max sem querer querendo revelou.
"Na próxima reunião de família, o Theo e eu vamos ter muitas lembranças para contar à família toda, viu!"
"Isso mesmo! Max e eu vamos contar cada história incrível que buscamos que nem vão acreditar!"
A Bisa apenas sorriu e pensou como era bom ouvir histórias no seu tempo, mesmo se fossem de pescador.
Calada Eu
Enviado por Calada Eu em 22/01/2017
Reeditado em 09/02/2017
Código do texto: T5889331
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