O melhor presente de Natal que ganhei na minha vida- (série contos de Natal 4 e ou Série Histórias que me contaram 2)


“- Nunca contei para ninguém.
 -O que?
 - Porque terminamos.
 -Porque eu não sei. Realmente nunca me contou. Mas dou graças aos céus todas as vezes que me lembro.
 - Pensei que gostasse dele.
 -Gostava. Gostava dele como gosto de você. Separados.
 -Então eu vou contar.”

 
 Foi assim mais ou menos que minha amiga e eu reiniciamos a nossa conversa após um papo entremeado de reminiscências, seguido de longo silêncio.

Foi logo depois das férias de julho, meados de agosto, não me lembro bem. Eu estava descendo da Escola quando vi a camisa na vitrine. Era verde e era linda. De cara achei que tinha de ser dele. A cor realçaria seus olhos castanhos claros. Naquela tarde fui para casa pensando em como ficaria bonito com aquela camisa, mas bastante entristecida porque não poderia comprá-la. Os tempos eram de vacas magras, eu ganhava pouco e ainda fazia faculdade. Passei por ali mais algumas vezes sempre olhando a camisa que continuava exposta na vitrine. Feliz por que não tinha sido vendida ainda, mas sem coragem de entrar até para perguntar o preço. Um dia o dono da loja estava na porta e me cumprimentou. Decidi entrar e perguntei: quanto custa? O dono da loja era amigo dele, nosso amigo. Rindo perguntou-me: É para ele? Vai ficar boa, ele gosta dessa cor e desse tecido, eu sei. Já veio aqui e se interessou. Fiquei mais excitada do que já estava. Se fosse possível eu comprar um presente que ele iria gostar! Era tão difícil agradá-lo! Mas o preço... o preço foi como um balde de água fria. Era cara, tão cara! Vendo a decepção no meu rosto nosso amigo apressou-se a tranqüilizar-me. Eu poderia pagá-lo em quantas vezes pudesse, afinal ele era nosso amigo futuro padrinho de casamento. Seria uma honra dar-me aquela alegria. Pensei mais um pouco e acabei voltando e comprando a camisa. Guardei-há por uns tempos, só iria dá-la no Natal. E assim quando o Natal chegou,eu o esperei ansiosamente. Ao vir me buscar veio de mãos vazias e eu fiquei encabulada. Será que o presente estava no bolso e ele me daria depois? Será que estava no carro! Fiquei sem saber se lhe daria o presente ou não mas quando ele me disse que iríamos cear junto com a família de sua irmã, não tive dúvidas. Dei-lhe a camisa, vi como ele ficou enternecido. Fiz com que a colocasse imediatamente deixando a outra em minha casa. Eu tinha certeza, o meu presente estava lá. Quem sabe uma aliança de noivado?
Primeiro fomos à missa, todos. Quando chegamos à casa da irmã dele para mim foi puro encantamento já que não estávamos acostumados aquele tipo de comemoração. Uma grande árvore estava montada na sala e aos seus pés uma infinidade de presentes. Antes da ceia propriamente dita, começou a distribuição. Era presente para lá, era presente para cá, todos felizes e eu esperando o meu até que o último foi entregue. Pensei: é agora a surpresa, o meu está no bolso. Nada. Fomos comer, todos felizes, menos eu. Mesmo assim uma sombra de esperança. Ele vai me dar depois, quando chegarmos a minha casa. Na porta nos despedimos como sempre e ele ainda teve a cara de pau de perguntar: o que foi, você está esquisita? E eu respondi: nada não. Estou preocupada com a viagem amanhã. Então ele disse, até a volta. Me escreve, telefona. E nem se lembrou de pedir a própria camisa de volta.
No outro dia ainda estava na cama quando a campanha tocou. Minha irmã foi ver o que era, sinceramente eu estava tão decepcionada que perdi as forças. Ela voltou com um pacote enorme, para mim. Abri o cartão. Toda a família me desejava um Feliz Natal e esperavam que eu gostasse do presente. Abriram a loja logo cedo, pensei, para consertar a gafe. Eu, sem desembrulhar, peguei uma escada e fui tirar a mala do maleiro para me preparar para a viagem. Tirei a mala e coloquei o presente lá. Só vim a abri-lo muitos anos depois, quando não doía mais. Sabe o que era? Um secador de cabelos. Acredite: eu sempre tive cabelos curtíssimos, nunca usei um secador na minha vida. O resto você sabe. Conheci meu marido durante a viagem e seis meses depois já estávamos casados. Ele me procurou muitas vezes. Quando soube do noivado queria que largasse tudo e fosse ao cartório para nos casarmos imediatamente. Nunca soube por que eu não quis mais saber dele, depois de tanta paixão. Mas, naquela noite de Natal eu compreendi que se eu não me amasse ninguém mais me amaria. E de jeito nenhum eu queria viver com um homem sem a mínima delicadeza e respeito para comigo. Foi sem dúvida nenhuma, o melhor presente de Natal que ganhei na minha vida.