Oceano

Faz tempo que eu não escrevo. Anos, aliás. E olha que esse sempre foi meu hobbie, minha válvula de escape, o único lugar onde eu posso ser, fazer, criar e imaginar tudo e qualquer coisa que vier na minha mente. Sempre foi a minha maior terapia, onde eu posso simplesmente vomitar meus pensamentos. Sabe aquele amigo que todo mundo tem que tá sempre lá pra escutar suas reclamações e desvaneios da vida? Esse amigo é uma página no Word, no caso. Já li em algum lugar que quando escrevemos, nunca vamos transmitir exatamente o que estamos pensando. Concordo. Palavras não são o suficiente pra mostrar o que passa no meu cérebro, mas elas continuam sendo meu melhor equipamento de mergulho pra que eu possa nadar no meu mundinho confuso de pensamentos. Ok, depois dessa introdução, meu querido amigo Word, vou direto ao ponto. Quero falar sobre um mergulho que estou realizando já faz alguns meses e que eu estou prestes a me afogar. Eu queria saber por quê as coisas me atingem tanto. “Coisas? Que coisas?” Tudo – eu digo. Absolutamente tudo. Cada átomo do meu corpo se frustra, não importa o momento, o assunto, a circunstância, eu sempre vou ser atingida de alguma forma. Desde as mínimas coisas, como alguém não responder ao meu bom dia no elevador (e como me irrita essa sua cara de bosta no elevador às 6:55 da manhã de uma segunda-feira). Isso se chama intensidade. Por ser uma pessoa intensa, do tipo 8 ou 80, do tipo “ou eu amo você e vou cuidar e te proteger ou você me irrita e eu provavelmente estarei doidinha pra te mandar tomar no cu a qualquer momento”. Eu coloco intensidade em tudo porque tudo é intenso demais pra mim, e uma vez e outra me falta moléculas de oxigênio pra suportar tudo isso. E sabe o que eu concluo, todos os dias? Que não vale a pena. E essa é a única lição que levarei dessa vida. A gente se doa demais, sempre, pra porcaria nenhuma. Eu não digo apenas na minha vida social, mas na acadêmica também. Eu e todos os meus neurônios nos recusamos a passar dias estudando matemática pra conseguir uma nota boa. Sabe por que? Porque é insuportável, é torturante, eu não aprendo nada com isso e não vou usar nada disso na minha vida! A matemática me destrói de uma forma que nem se eu nascesse em uma versão feminina de Pitágoras sentiria prazer em resolver problemas. De problemas já bastam os que eu encontro e tenho que lidar nos meus mergulhos, onde nem com a ajuda dos 800 livros de Leonhard Euler seria possível resolver. É tudo tão profundo que não dá pra ser desvendado e no meio dessa profundidade toda é onde a cobrança externa vem. As pessoas são como os peixinhos. Peixinhos, peixes, peixões. Peixe pra tudo quanto é lado, observando cada bolha que sai do seu nariz. A fase de quase estar se tornando uma pessoa independente é como um BBB marítimo. O tempo todo esses malditos peixes estão te percebendo, te julgando, mandando e pedindo e cobrando e exigindo. Você nasce pra poder crescer e ser uma pessoa excelente. E ninguém vai aceitar nada menos do que excelente. Porque, afinal, ninguém tem crises e dificuldades. Ninguém pensa em abandonar o regulador e o octopus (instrumento principal que permite respirar debaixo d’água, pra quem não sabe). Ninguém pensa em parar de nadar. Óbvio que não, né. Fomos criados pra sermos felizes e produtíveis 24 horas por dia sem ao menos alguma estrutura pra isso. Temos que ignorar o fato de que o mundo está literalmente um caos em todos os sentidos possíveis e apenas focar em nós mesmos e como temos que ser excelentes. A Síria que se dane, tá tão longe daqui mesmo, né? A menina pobre que está grávida aos seus 15 anos e que não quer ter esse filho pois não tem condições de cuidar nem de si própria não pode escolher se quer ou não abortar, mas isso não é problema meu, né? O maníaco que fica enfiando agulha com doença nas mulheres nos metrôs é inofensivo, afinal, eu não uso transporte público mesmo, né? E o cara que foi morto pelo simples fato de ser gay? Vish, só mais um, graças a Deus eu sou hétero, né? Né? Né? Nénénéné??????????? Querido Word, se essas situações não te deixam angustiado, eu juro que eu não sei o que pode deixar. Mas, voltando às excelências: “Não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje”. Eu deixo pra amanhã, sim! Eu tenho TPM, eu sinto cansaço, não sou a Mulher Maravilha e nem quero ser. O stress não compensa. E penso em como a vida poderia ser prazerosa, sem toda essa estupidez de cobrança. Eu só quero poder ser livre pra viajar, construir minha identidade, sumir por alguns dias, meses e quem sabe anos e tudo isso sem ninguém no meu pé, resmungando sobre eu ser uma pessoa que odeia ter os pés no chão, sobre ser uma pessoa que está sempre querendo ir além desses padrões de vida. Como dizia Tati Bernardi (uma mulher que eu admiro muito, aliás) “Eu queria que existisse um canto do mundo que apenas me deixasse ficar quietinha e quente quando o resto do mundo resolvesse me magoar”. Ahhh, Tati! Como eu queria isso também. Dói, é horrível. Viver é angustiante e às vezes da vontade de abrir um zíper nas costas e sair do corpo porque dentro da gente, nesse momento, não é um bom lugar para se estar. Mas a gente aguenta. Ô se aguenta. Porque no meio de toda essa merda, existem coisas pelas quais vale a pena respirar. Os corais, as tartarugas, as ondas e a própria imensidão azul. Pra mim, escrever é uma necessidade, assim como o mar precisa das tempestades: é isso que eu chamo de respirar. Logo, mergulhe, mergulhe até achar o reino submerso de Atlântida, porém, sempre volte à superfície. Afinal, somos seres terrestres.

Nathalia Santos Bueno
Enviado por Nathalia Santos Bueno em 24/09/2016
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