Alguém

Eu gosto muito da ideia de conhecer alguém do nada. Igual nos filmes. E apesar da consciência de que isso realmente só acontece em filmes, ainda sim acredito que quem sabe essas coisas possam acontecer um dia. Acho que gosto de me iludir em alguns momentos. Esbarrar com alguém na rua, pedir desculpa, e acabar conhecendo amizades e pessoas que possam acrescentar grandes fatos, histórias e sentimentos em uma vida tão monótona. Mas alguém que entenda. Entenda as peculiaridades. Entenda os detalhes. “A pessoa que muda nossas vidas para sempre nunca é a pessoa que desejamos, ou sonhamos, ou pensamos. É sempre alguém totalmente diferente, oposta do que acreditamos ser.” Mas em minha mente é tão impossível isso acontecer com alguém que não seja tão estranho quanto eu. A pessoa mais próxima a isso que já conheci foi o meu melhor amigo. Mas mesmo assim ele ainda é o quase lá. O quase a pessoa que esperamos, mas não é exatamente aquilo. As vezes eu sinto que eu preciso de alguém, mas alguém que entenda. Entenda a paixão de olhar um desconhecido e ele sorrir, sem motivo nenhum. A paixão por rostos quadrados e mandíbulas definidas. A paixão desenfreada por pipoca. Por tomar chá. E café. E suco natural. E água. O sentimento de colocar uma música no último volume, ir para o lugar mais alto possível que dê pra ver a cidade, e ficar andando por lá, só andando mesmo de um lado pro outro. Os desejos repentinos, que tão repentinamente quanto apareceram, já se foram. As conversas. É o que eu mais preciso. Alguém que saiba conversar comigo. Não porque as pessoas não sabem conversar comigo. Elas sabem. Acho até que sou eu quem não sabe conversar com os outros. Mas alguém que consiga fazer com que eu fale. Fale os pensamentos, as dúvidas, as coisas mais idiotas, sem parecer tão idiota. Ou se parecer idiota, mas que eu ainda me sinta confortável sobre isso. Eu não quero alguém pra fazer sexo, eu não quero alguém para beijar, eu não quero alguém para me dizer que sou bonita, ou que sou legal, ou que sou interessante, ou que sou diferente. Não quero alguém pra dizer que gosta do meu cabelo, que gosta do meu estilo, que gosta do meu gosto musical. Eu só quero alguém que fale que minha alma é bonita. Que eu sou tão poesia quanto ela. Que sou uma galáxia inteira, e na verdade todos nós somos, e estamos esperando para sermos descobertos. Não porque eu acredito nessas coisas, mas porque a pessoa percebe que eu gosto dessas coisas sem que eu precise dizê-las. Alguém que entenda meu sentimento de amar muito tudo, e por isso não consigo ter preferência sobre as coisas, e não consigo ter coisas favoritas. Alguém que concorde que até as piores coisas tem coisas para serem amadas nelas. Alguém que ria do meu péssimo senso de direção, mas não se importe de se perder tanto quanto eu não me importo. Não alguém que se sinta peculiar por falar sobre coisas que não parecem tão faladas mas que na verdade são faladas pra caralho, como eu sou. Alguém que realmente puxe o assunto mais aleatório e esquisito, e que me mantenha preso nele. Alguém corajoso, que nunca esteja numa zona de conforto, que ouse fazer coisas que normalmente diriam que esse tipo de pessoa não faria. Não alguém que me faça sentir única, exclusiva. Alguém que me faça sentir realmente alguém. Alguém que me lembre meus ideais. Alguém que seja humano, que precise de minha ajuda também, e que eu sempre esteja disposta a ajudar. Alguém que não necessite de mim, que não precise de mim pra viver, mas sim alguém que, mesmo não precisando de mim pra viver, prefira viver ao meu lado. Alguém que não se importe pela minha paixão por gogós masculinos, nem pela contradição de não gostar de homens malhados, mas que me derreto com músculos das costas definidos. Alguém que não precise se esforçar pra me encantar ou me surpreender, que simplesmente o faça acidentalmente. Porque eu amo coisas acidentais, espontâneas. Alguém que não sinta constantemente que preciso provar meus sentimentos, porque sabe que apesar de eu não demonstrá-los, se eu ainda estou aqui é porque eu o amo muito. Alguém que me veja tomando chuva e ache lindo. Alguém que tome a chuva comigo. Alguém que me abra portas novas do mundo, e que eu abra portas novas para ele. Alguém que faça com que eu me sinta bem dentro de um abraço, mesmo eu odiando. Que me abrace quando eu estou distraída fazendo nada, porque é o único momento que eu gosto de abraços e o único momento que eu gosto de surpresas. Alguém que beije a minha testa porque secretamente amo esse gesto. Alguém que eu possa encarar por mais de 10 segundos, sem falar nada, sem sentir meu coração bater mais forte e precise desviar o olhar. Alguém que eu consiga olhar por 3 minutos, sem falar nada, e sentir apenas admiração. Alguém que sorria sem motivo e me faça sorrir de volta, sem ter dito nada antes, e sem dizer nada depois, e de novo isso, porque sim, é o gesto que eu mais amo e admiro no universo. Alguém que não se importe de olhar pro céu toda hora, sem esperar o por do sol, como se fosse o único momento que o céu merecesse ser admirado. Alguém que faça com que eu me sinta constantemente como se o vento estivesse batendo em meu rosto, fazendo meus cabelos voarem, e fazendo com que a roupa se movimente sobre meu corpo, e mesmo eu não gostando de roupas coladas em mim, fazendo o arrepio e a sensação dela se movimentando sobre minha pele seja tão agradável quanto realmente é. Alguém que repare em manias idiotas. Não do tipo que eu constantemente mordo os lábios, ou do tipo que mordo o interior da boca quando quero chorar ou me sinto mal. Do tipo que repara que quando eu to nervosa eu simplesmente agarro meu dedo indicador e fico apertando ele. Ou que na esteira de compras do supermercado eu gosto de colocar as coisas extremamente encaixadas e organizadas, só pra ficar bonitinho. Mas que coisas coloridas, como mm’s, lápis de cores ou canetinhas, precisam estar inteiramente misturadas, e não separadas por cores ou em escalas de cores, porque misturadas são bem mais bonitas. Do tipo que repara que apesar da minha expressão inteira estar séria, só meus olhos sorriem. Alguém que aprenda a ler o peso dos meus olhos. Alguém que dance desajeitadamente comigo, porque também não se importa em não dançar errado. Alguém que não me dê buquês de flores, e sim vasos, e mudas, e sementes, porque sabe que eu amo plantinhas. Alguém que entenda a minha vontade de um dia andar de bicicleta de novo pelo sentimento de liberdade, mas também entenda que quero continuar com certas exclusividades porque é o que faz eu dar risada ao ver a reação das pessoas ao dizê-las. Alguém que compreenda que as vezes eu vou chorar só ouvindo uma música, ou pensando em como as pessoas conseguem ser realmente ruins as vezes, e que as vezes uma notícia terrível chegará aos meus ouvidos e não escorrerá uma única lágrima de meus olhos. Alguém que não julgue minhas saudades por algo que eu nunca vi, por algo que nunca conheci. Que não julgue meus sentimentos por coisas que não conheci, que não vi, que não senti. Alguém que abra o suco pra mim porque sabe que eu nunca consigo abrir sozinha, ou que deixe o suco fechado só pra que eu tenha que abrir com uma faca tentando tirar os lacres, pra pressão de dentro da caixinha diminuir e eu conseguir abrir sem usar a força, porque sabe que eu amo física e amo utilizá-la a meu favor. Alguém que eu não precise mentalizar 20 segundos de coragem, porque eu não precisaria mentalizar coragem ao lado dela. Alguém que me faça abrir mão do bloqueio ao sentimentalismo, e faça com que eu sinta, de braços e olhos abertos, sem me acanhar do modo que me acanho. Alguém que veja meu caderno de palavras e não ache apenas interessante alguém ter um caderno de palavras, e que ache interessante as palavras, que entenda que palavras são tão mais cheias de sentimentos do que acreditamos. Alguém que saiba que quando eu to muito feliz eu sinto uma vontade devastadora de sair andando sem rumo, só pra andar por aí e sentir a minha felicidade sendo espalhadas nas ruas e esquinas viradas. Alguém que bagunce tudo dentro de mim, mas que seja a bagunça que vai organizar meu eu interior. Acho que no fundo o que eu quero mais é saber, saber como é o sentimento de ter alguém assim. Eu nunca entendi como as pessoas conseguem amar tanto a outra a ponto de querer passar a vida ao lado dela, a ponto de não conseguir demonstrar seu amor e sentir necessidades físicas por outréns. Isso não faz o menor sentindo na minha cabeça. Pra mim as pessoas só estão se iludindo, querendo acreditar que amam as outras desse jeito porque em algum momento alguém colocou em nossas cabeças que isso era possível. Eu quero saber se é possível, porque até agora não foi. Quero saber como são todas essas físicas e químicas dos hormônios. Quero saber o quão verídico é Camões e suas antíteses. Quero saber o que é amar. Não necessariamente romanticamente, só quero alguém pra amar genuinamente. Não quero simplesmente sentir. Quero saber o que é sentir, já que ainda não sinto. Eu só quero sentir, porque sou refém dos sentimentos, que, apesar de não me controlarem, são o que me fazem viver.

Sarabi
Enviado por Sarabi em 24/09/2017
Código do texto: T6123190
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