"vem deslizando lento sobre a tua pele de revolta"


vem deslizando lento sobre a tua pele de revolta
o enigma absurdo entra por ti adentro
como uma serpente triunfante
e nem sabes ao certo se é a serpente que te abraça
ou se é já o teu corpo aberto que a envolve

sabes contudo
que o absurdo está em ti
chegou efetivamente pela manhã
bem cedo
como se o tivesse acordado
o primeiro pássaro do dia

veio para se alimentar
devorando a incredulidade dos crentes
e a perplexidade dos incautos
amanhã não restará
uma única migalha de tédio em suas casas
e todo o mundo chorará
a morte do tempo


(Excerto do livro “É preciso calar o monólogo”)