TRANSTORNO UNIPOLAR

Ouço a voz do cantador

as profecias de Brejo do Cruz...

"Quanto tempo temos antes de voltarem...

aquelas ondas...

que vieram como gotas em silêncio..."

A realidade esvanece-se em meus devaneios...

deixo fluir a inspiração,

deixo falar a intuição!

Caminho pelas ruas da cidadela,

o olhar atento aos sinais;

e vejo além, vejo demais!!!

Vejo o abominável sobre o altar,

a licensiosidade proclamada pelos alto-falantes,

vejo pedintes e pedantes

lado a lado sem se perceberem,

sem imaginarem nada melhor

que o conluio eleitoral.

Vejo a juventude embriagada

tragando ilusão...

vejo as urnas vomitarem ambição

e em todos os canais

os mesmíssimos inconfundíveis sinais

da falência deste sistema...

da inconsistência deste esquema

feito para escravizar!

Acima o sol causticante,

o vento que aguarda o instante

de tudo derrubar...

enquanto caminho com meus loucos pensamentos

de idealista sem razão.

Versos perdidos para esta geração.

"Não dá pé, não tem cabeça,

não tem nínguem que mereça,

não tem coração que esqueça...

eu não fiz nada e você fez

um bicho de sete cabeças!"

Quando deixei o sanatório

tive a certeza

que do lado de fora a loucura é bem maior!

E agora

muito embora

a medicina deste século

ateste o meu transtorno bipolar,

continuo a rimar

a criticar...

a zombar desta Divina Comédia.

Que tudo vire poesia,

afinal quase nínguem entende

e no final sou apenas mais um visionário

que leu demais o dicionário

e destila ironia sem meias palavras.

Mas declaro que estou feliz

por ver por um triz

o fim desta encenação...

o fim desta escravidão...

Então saio pelas ruas

sobre os pedais de minha bicicleta

portando o olhar sisudo

desta gente tão normal...

disfarce provisório

para andar neste imenso sanatório

com passe livre por onde for,

contemplando a árvore, o céu, a flor...

disfarçando a euforia

de portar um transtorno singular...

meu incurável e intransferível

TRANSTORNO UNIPOLAR!!!