EU VOS SAÚDO BRASIL

Eu te saúdo, oh Brasil

Terra abrasada de sol e molhada das chuvas tropicais

Das encostas gastas e montanhosas

Das glebas das Gerais

Onde o vento fez a curva e se perdeu

Nos seus sertões e veredas Guimaranas

Saúdo-te das áreas verdes do interior de São Paulo

Inundadas de canaviais e pastarias

Saúdo-te pela bravura do homem comum, brasileiro da Silva,

que jamais desiste de suas potencialidades criativas

Saúdo-te pelo do sul europeizado, seu povo branco,

Seus vinhos tintos, suas mulheres também brancas e belas

Saúdo-te do sertão do Cariri onde a chuva nunca chega nem o governo

Saúdo-te com o olhar empobrecido do Vale do Jequitinhonha

E seu destino miserável, sem solução

Saúdo-te com as bromélias da Mata Atlântica

Saúdo-te com as águas volumosas do Solimões,

Com o negrume misterioso das águas do rio negro

Saúdo-te com as cheias do rio Amazonas

Majestoso e primitivo

Saúdo-te com as matas imensas da Amazônia Oriental

E suas florestas de chuvas

Saúdo-te pelos gritos das araras vermelhas,

Pelos urros depressivos dos bugios solitários

Saúdo-te com a solidão do peixe boi no cativeiro da extinção

Pelo reino silencioso e sem esperanças do seringueiro,

sem trilhas para voltar

Saúdo-te pelos últimos grasnados da arara azul

No corredor cruel da morte

Canto para ti a ladainha de suas despedidas

Canto com o canto fúnebre dos Jaós

Saúdo-te no encontro das águas,

Oferto-lhe a dança de Iara e seu boto sedutor

Nos interiores úmidos da floresta Amazônica

Saudaria você com o rosnado da onça pintada do cerrado

Se ela pudesse sair ao sol sem ser morta

Saúdo-te com a beleza da miscigenação da nossa raça, com suas etnias tão diversas

Saúdo-te com o misticismo da Bahia, seu candomblé e seus terreiros sagrados

Com a sensualidade efervescente do Rio de Janeiro

Saúdo-te com fluidez morta de Brasília, sua falta de auto estima, seus desenhos lógicos que contrastam a falta de logica da alma dos políticos que lhe habitam

Saúdo-te com o esplendor das montanhas Catarinenses,

Seus precipícios desafiadores, suas praias lúdicas e ingênuas

Saúdo-te com o vigor das araucárias

E o viço dos mantos verdes dos cafezais paranaenses

Saúdo-te do alto do meu coração pueril e cheio de juventude

Que ainda canta amiúde as cantigas do meu país

Saúdo-te com as árvores e capões de mata que restaram no centro oeste paulista, já nos seus estertores

Saúdo-te em nome dos índios exterminados,

Que aqui deixaram suas pegadas

Saúdo-te com a força do braço negro no eito da lavoura

Saúdo-te com reverência e vergonha, sob a mancha escura da escravidão

Este flagelo degradante que não cessa, gravado nas paredes da nossa conscência

Saúdo-te com as dores e melancolias deste povo místico

Ergo aflito um brinde com o vinho das terras novas

Do Vale do São Francisco para os retirantes da seca

Levanto no alto para ti, a bandeira de luta deste povo pobre, sempre enganado, eternamente em injustiça,

Brindo com um minuto de silencio, em respeito aos seus sonhos que nunca se realizarão

Saúdo-te pela realidade brutal dos trabalhadores da construção,

Outrora homens do campo, hoje cobertos do pó da cidade,

Saúdo-te com a simplicidade e desesperança do olhar dos abandonados

Saúdo te pela falta de voz dos humildes e pela humildade serena das domésticas

Saúdo-te com a humilhação de suas prostitutas, tão jovens e sem sonhos,

Que vagam nas noites perigosas de tuas cidades

Saúdo-te com a resignação dos operários, dos peões das fazendas,

E seus rendimentos ultrajantes que envergonham o país e constroem desigualdades,

Saúdo-te com a fé dos afligidos, saúdo-te com o denodo dos pequenos empreendedores lançados no mar da luta sem caminho para voltar

Presos nas engrenagens da máquina de moer esperanças

Todavia, saúdo-te com a força do vento minuano, com o silencio das coxilhas

Dos campos abertos e da carne salgada das campanhas

Saúdo-te com a faceirice da moça gaiteira e do seu cheiro de alecrim

Oferto-lhe o chimarrão quente dos pampas e amistosa alegria dos rio-grandenses

Saúdo-te com a fidalguia e leveza do samba do morro

Cantor das mazelas da vida, da graça e do balanço

Saúdo-te com a força e a desafetação do homem do planalto goiano

Saúdo-te com a fibra dos peões pantaneiros, das boiadas e tropas perdidas

Saúdo-te pelo fulgor da primavera que persiste em voltar ao Brasil, cada ano mais bela

Saúdo-te pela desesperança dos desenganados que esperam pela morte

Saúdo àqueles que vivem à margem da civilização moderna

Saúdo-te pela força do meu país, pela brasilidade que nos une,

Pelo altruísmo quase morto, pela confiança que ainda habita o coração do homem

e pelos sonhos que ainda nos restam!

Celio Govedice
Enviado por Celio Govedice em 23/07/2017
Reeditado em 13/04/2023
Código do texto: T6062358
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