Amor à puta

Eu disse amor

e a puta quis me pegar

e fazer em mim arruaça.

Iludiu meu corpo

com seu o jeito de encantar

e de ser moça,

lambuzou-se toda no meu poço,

grudou no meu pescoço,

me sufocou, me usou, me apertou.

Fez de mim seu castigo, sua prenda,

burro de carga,

bicho do mato.

E me jogou fora.

Neste corpo aceso de criança

cabe o mundo

cabe o cio

só não cabe amor à puta,

com seu coração de pedra,

seus seios cheios de leite

e seu turbilhão inesgotável de desejos.

Não direi outra vez amor

Eu não digo mais amor à puta.

Existirá amor nas estátuas, nos amantes

nos caprichos da velhice?

Em outra vida eu era um deus,

Tinha uma barba branca e comprida

E um monte de anjos ao redor,

eu amava o mundo e a puta

Mas era chato ser Deus

e ter de amar o mundo

e não ser dele e dela.

Hoje, o mundo é minha casa,

sou velho e triste

e na minha casa

tudo é velho e triste feito eu.

Existe a cidade, a insônia,

os ratos do supermercado e a puta,

a puta, a puta...

O amor é uma cisma em guerra

com o mundo

e comigo.

Ele mora comigo na minha casa,

me espia com olhar de bicho,

É estranho, feio e fede,

Tem nas mãos um anel de tucumã.

e um bocado de tabaco entre os dentes amarelos.

Às vezes eu acho que eu sou amor,

mas minha pele é a puta

E eu já disse

não digo mais amor à puta.

Geovane Belo
Enviado por Geovane Belo em 08/12/2005
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