ACINZENTADO
Lembro-me
como se fosse hoje
da primeira vez em que abri “Humano,
demasiado humano”:
era um janeiro
que a nada iniciava, as chuvas
já me castigavam
adentro
e, ao me alagarem,
eu as deitava em [incontidas
e vesanas] tempestades
pelas bordas.
Em meados
de um mês depois, enforquei Zaratustra
ao ego de Nietzsche;
a alguns anjos, mitos
e lendas, preguei aos pés secos
de seus apócrifos
criadores;
às andorinhas azuis,
às santas alvissareiras e às mariposas
de voos razantes,
consenti-lhes
[com minhas atuações aracnídeas]
às ondulações do corpo, às ilusões da mente
e às quedas recorrentes:
houvera descoberto,
enfim, o grande palco das arritmias
por onde nos apresentamos
a tremeluzir,
entre fogos iludidos
e névoas secas [com anseios anímicos,
iluminuras vocais e hastes
selênicas]
os avessos túrbidos
de nossos reflexos, à ausência de fiéis espelhos
e sobre os sísmicos chão brancos
em que nos andamos.
Péricles Alves de Oliveira