Breve Esboço da Caverna.
Existe um céu azul, lá em cima, no dia vinte e seis.
As máquinas e os corações pulsam em uníssono.
Ouço o esbravejar de homens em obras, crianças e noras, senhoras corocas, algazarras de aves nos pés de conde e goelas que tentam conquistar o Mundo aos berros.
Tentaram de todas as formas tapar a boca da consciência, mas ela jorrava sua incongruência por todas as ventas.
Aquela mãe só queria presentear sua filha com ovos de páscoa, esses de chocolate que o capitalismo inventara.
Não tinha grana. Foi lá furtar.
Pegaram-na com a boca na botija, flagrante delito, hipermercado lotado.
Levaram-na para o almoxarifado e deram-lhe uma sova que a fazia verter lágrimas não pela dor, mas pela impotência diante a ferrugem e acidez do sistema deplorável.
Diante o milharal que rodeia a rodovia, às quinze para as seis da tarde, pára um ônibus escrito "Rural", dividido em duas cores, branca e vermelha, e desce um homem carregando o cansaço, a garrafa térmica e o facão.
Olha para cima, tira o chapéu, limpa o suor da testa e dá o primeiro passo.
No final da avenida uma jovem mãe sentada diante sua simplória residência vê os três filhos pequenos brincarem com a inocência enquanto pensa no que lhes dar na hora do jantar.
É tudo tão duro e puro que a esperança olha presa detrás da cela de uma cadeia, suspira e tenta acreditar que o amanhã ainda há de vir