Um olhar no sertão

Olhei o sertão, senti gosto de chão;

cheirei capim seco e furei as mãos nos espinhos.

Vi saudades e lamentos no pinho seguro e tocado por dedos finos.

Eu vi o sertão como um pedaço de pão e chorei uma chuva.

Espalhei sementes; nasceu a tarde árdua

e todas as faces pálidas nas janelas de casas de barro e bambu.

Eu vi o mundo nu, assolado pela fome,

fatigado pelos escombros que a miséria deixa acontecer;

e deu-me dores no ombro, de carregar tanta gente na mesma emoção.

Lamento o que não pode ser; lamento não ser todo mundo igual.

Pelo menos teríamos repentes solitários;

vacas magras num pasto que se foi; panelas de barro e colheres de pau mexendo algo verde-amarelo e amargo.

E teríamos um punhal para furar cactos e aparar pedaços de madeira. Seríamos sertanejos ao pé da serra, caminhando a caatinga, balançando a moringa quase vazia;

e olhando a distância, mais vazia que a moringa; e então os olhos cheios d água, mirando uns aos outros;

e a boca movendo devagarzinho, mas sem dizer nada.

Eu vi o sertão com a força do sobrevivente e caí no chão da cidade cheia de gente. Gente ignorante, mais seca que o sertão.

Takinho
Enviado por Takinho em 14/08/2017
Reeditado em 26/12/2018
Código do texto: T6083281
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