De grão em grão (EC)
Este texto faz parte do Exercício Criativo - De Grão em Grão
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De grão em grão é que a galinha enche o papo, já diziam as avós, já dizia a avó dela, continuamente, como um mantra. Certamente por isso esse pensamento era contínuo  em sua vida, essa ideia de que é de um em um que se forma o infinito. Mas quando pensava na frase que a avó dizia, vinha-lhe a mente a imagem repelente de um papo de galinha transbordando de grãos de milho, que a avó lhe mostrara para ilustrar o ensinamento. Mas repelindo a imagem, mantinha a ideia em todos os momentos de sua vida. Pois é, a sua vida era feita de momentos,  como minúsculos grãos de areia escorrendo por uma ampulheta e quando percebeu isso passou a valorizar cada momento como se fosse o único.

Quando saía pela manhã acompanhada de seus cães para vistoriar  o povoado cada passo era vivenciado ao máximo. Observava tudo ao seu redor e por isso era capaz de notar cada uma das transformações da natureza, imperceptíveis aos olhos mais apressados. Quando se sentava na varanda, nas tardes modorrentas, para bordar sua história em finos tecidos, cada ponto era um retorno ao passado, cada ponto era importante para construir a beleza do todo. Quando colhia cada jabuticaba nos pés selvagens que se espalhavam pelos quintais do povoado, cada goiaba perfumosa, para fazer seus licores e geleias, era ali, na colheita de cada fruto, que o produto começava a ser produzido. Com isso aprendera muitas coisas que sempre lhe seriam úteis. Aprendera que toda caminhada começa com o primeiro passo e que é impossível dar mais de um passo de cada vez. Nem agora, que precisara se afastar dali rapidamente, se apressara. Era preciso apenas dar o primeiro passo, só isso. E foi o que fez, subindo tranquilamente naquele ônibus em direção a um novo presente. Passo a passo. Um passo de cada vez. Como se fossem grãos de milho alimentando a sua vida.