Poncho Pilatos?

Pra dar limão como aquele limoeiro, que tivemos no Brumado dos anos cinquente, tá pra existir. E nem chegava a espantar o tamanho do

arbusto, ou o de seus frutos, embora com aquele biquinho pronunciado, os mesmos estivessem a sugerir coisa do paraíso.

Mas paraíso pra criança é mais poder trepar do que chupar. E chupar, só fruta doce. A prodigalidade do limoeiro, entretanto, era coisa que

saltava, e adoçava, os olhos, com a vantagem de ser maior o número de limões do que o de espinhos. E os galhos mais baixos até permitiam que a meninada neles subisse, ainda que nem precisasse.

E ainda tinha a vantagem de ter crescido na porta da cozinha, antes até que a cozinha fosse ali construída, como um crescente à casa. Mas como consumir aquela limoada toda? "Poncho" era doce, refrescante e sublime até, mas tinha o seu limite de consumo. E antes de tomá-lo, havia que prepará-lo. E criança não é de ter muito "sufrimento" para isso. Demais, bebido além da conta, o "poncho" enfara. E aí, se pára?

Havia a alternativa da venda dos limões, pois era raro o quintal que por ali tivesse um limoeiro que fosse. E pra se comparar àquele nosso, quase impensável. Assim, nas travessas e latinhas saíamos a vender limões, a quatro por um Tamandaré. E um Tamandaré, se muito,

dava um picolé - da era pré-kibon. Contudo, enfrentar aquele solão, a insolência de eventuais compradores e outros menores dissabores, eram empecilhos de todas as cores.

Bom foi o dia em que o Geraldo, amigo de papai, que trabalhava num bar em Belorzonte - mais propriamente na Cidade Industrial - veio nos visitar e com a visita surgiu a idéia de limão se exportar - pra capitar, e pra recursos captar. Foi coisa de encher o saco. Daqueles de aniagem. E mais de uma partida foi feita, seguindo de trem. Como convém. Com pouco, veio também o tempo de nossa mudança do Brumado para a cidade de Pitangui, apenas a uma légua dali. Sem pernas, não nos acompanhou o limoeiro, senão na doce lembrança, assim como, por inteiro todo aquele terreiro. Mas se chorou, foi só o limoeiro.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 27/08/2015
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