Balzac e a Costureirinha Chinesa

Nunca fiz nem sei fazer resenha de filme ou livro, mas admiro muito quem as escreve – como a Maria Olímpia, que o faz com maestria; sempre que leio suas resenhas, me dá vontade de ver o filme ou ler o livro sobre os quais ela fala. Mas esta, em particular, foi motivada pelo meu filho, que caiu na gargalhada quando viu o título estampado na capa do DVD: “Balzac e a Costureirinha Chinesa”.

- Você que escolheu, mãe? -, disse ele no seu tom irônico, pois sabe que sou fascinada por filmes, segundo ele, “estranhos” – apenas por nunca estarem na prateleira dos lançamentos e quase sempre terem sido rodados fora das terras do Tio Sam. Aliás, quanto mais distantes, melhores eu acho.

E meu faro não me decepcionou. O filme, de 2002, se passa na China do fim da década de 60, mais precisamente durante a ditadura de Mao Tse Tung e sua chamada "revolução cultural", na qual se pretendia formar jovens através do trabalho duro junto aos camponeses e à terra, e não nas universidades - que foram fechadas. Dois jovens ainda não chegados à casa dos 20 anos são enviados para as montanhas para a chamada “reeducação”, por virem de famílias reacionárias, segundo o padrão comunista. Ali, em locais paradisíacos, comem o meipao* que o Diabo amassou: em condições precárias, trabalham a terra, dão duro nas minas e sofrem todo tipo de restrição, sendo que a maior delas é a proibição total e absoluta aos livros. Qualquer um.

Únicos alfabetizados da comunidade e mesmo da região, amantes das letras e da música, educados e refinados, os dois rapazes enfrentam com inteligência e perspicácia o chefe durão, enquanto se envolvem com a costureirinha do título - a mais linda adolescente das redondezas, filha de um respeitado alfaiate - por quem ambos se apaixonam. O bom humor permeia o filme, e a delicadeza está presente até no trato de temas difíceis como a ditadura de Mao e a pobreza local, que fazem um plano de fundo contrastante mas perfeito para realçar a beleza dos cenários e a alegria dos jovens quando encontram uma mala cheia de livros ocidentais – entre eles, alguns do autor citado no título.

O filme retrata com maestria como a educação, o conhecimento e a abertura a novas idéias podem efetivamente mudar hábitos e costumes, e, por conseguinte, também vidas. A situação política vira uma aquarela suave nas mãos do diretor, que com ela pincela a passagem do tempo e nos traz um final comovente.

Quando acabei de assistir ao filme, meu filho veio-me perguntar o que eu tinha achado. “Adorei. É muito lindo!”, respondi-lhe. E, pelo meu sorriso, ele entendeu que não vou mudar de prateleira na próxima vez que for à locadora.

(* meipao = pão chinês, que pode ser recheado com carne ou shitake, segundo a revista Veja São Paulo.)

- Margot, muitíssimo obrigada pela revisão. Beijos!