Pablo Neruda e as Dores do Mundo.

Se existiu um poeta que conseguiu fazer uma radiografia profunda da alma humana, esse poeta se chamou Ricardo Neftali R. Basoalto, mais conhecido pelo pseudônimo de Pablo Neruda (1904-1973). A sua poesia é múltipla, metafórica e enigmática. Não se pode sintetizar a sua obra poética, pois ela possui muitas faces. Em um determinado momento, ela é confessional e sentimental e em outra ocasião ela é descritiva, quase jornalística. Dependia da fase que enfrentava. Ele consegue nos abarcar com os seus versos, abalando-nos os pilares mais recônditos da alma. A sua poética vasculha as nossas lacunas pessoais, os nossos sonhos e as nossas dores. Ele encontra os nossos segredos e os coloca no balcão dos seus versos, expondo-os nas páginas dos seus livros. Em sua obra poética, ele grita as nossas dores em um palco repleto de holofotes e microfones. Segue abaixo alguns versos de sua autoria que explicitam essa intenção:

Inicial

O dia não é hora por hora,

é dor por dor,

o tempo não se dobra,

não se gasta,

mar, diz o mar,

sem trégua,

terra, diz a terra,

o homem espera.

(--------------)

*Extraído do livro “Últimos Poemas”, publicado em 1973.

A Estrela

Bom, eu já não voltei, já não padeço

de não voltar, a decisão da areia

e como parte da onda e da passagem,

a sílaba de sal, o piolho da água,

eu, soberano, escravo desta costa

submeti-me, me encadeei à minha rocha.

Não há vontade para nós que somos

fragmento do assombro,

não tem saída para este retorno

para si mesmo, à pedra de si mesmo,

já não existem mais estrelas que o mar.

*Extraído do livro “Jardim de Inverno”, publicado em 1971.

A poesia de Neruda é quase um hieroglifo quando ele usa o artifício da metáfora. O poeta usa algumas palavras como se fossem mantras poéticos. Mesmo que o tema não tenha qualquer relação com a referida palavra metafórica, ela surge como um trovão nos versos. Podemos tomar como exemplos as palavras mar, sinos e navios, elas aparecem em muitos dos seus versos. Possivelmente, isso é explicado pelo fato de que Neruda morava em uma ilha no litoral do Chile e esses elementos eram muito presentes em sua vida. Contudo, essa pode ser uma interpretação superficial, uma vez que elas desempenham papéis simbólicos na sua poesia. Enfim, podemos considerar que o poeta chileno enxergou um mundo que nenhum poeta houvera conseguido antes dele e expressou-o com muita qualidade, talvez tenha sido esse o motivo de ter recebido o Prêmio Nobel de Literatura em 1971. Pablo Neruda honrou e glorificou a poesia latino-americana com a sua obra e ela certamente subsistirá por vários séculos, dando um belo testemunho dos valores socioculturais do povo ibero-americano.

Fábio Pacheco
Enviado por Fábio Pacheco em 03/01/2016
Código do texto: T5498539
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