O POEMA É MATÉRIA VIVA

Entendo o fenômeno da “inspiração” ou da “espontaneidade” – aquela centelha originária desencadeadora do processo do criar – apenas como o primeiro momento da criação literária. Portanto, como poeta/autor, jamais jogo na rua o poema sem as necessárias e várias revisões. Cumpridas todas essas etapas revisionais é que a peça textual vai tomando o seu formato definitivo. Ressalto que há poemas (com Poesia) e outros em que a Poesia não comparece – são exemplares com rarefeita expressão de linguagem e beleza estética. Em regra, trata-se de embriões textuais aos quais poderiam ter sido aportados elementos poéticos que os ‘salvariam’, caso houvesse sido feita a “transpiração” sobre a primeira e original versão, aquela que temos como embrionária. O aporte da comumente chamada “linguagem figurada” ou “figuras de linguagem” a este embrião (pretensamente) poético, pode ser uma saída esteticamente válida, geralmente com a utilização das metáforas de palavra ou as preciosas e raras metáforas de imagem. Estas últimas conformam a singular poética dos grandes mestres do ofício e têm extraordinário efeito quanto à prática e à sugestão ínsita ou imanente à Poesia. Tenho que um poema ou qualquer peça poética em qualquer formato (como no soneto, no haicai ou na trova literária, por exemplo), se não se fizerem presentes as expressões metafóricas, não se configurará a Poesia – aquela que nunca DIZ ou AFIRMA, e sim, quando muito, apenas indica o seu conteúdo sugestional, força da imagética, convite para a convivência com o Novo. Tudo isto devido à linguagem em sentido conotativo assentada na codificação textual apresentada na peça. Bem, para mim, por concepção, e pelo modo como vejo a Poética, a peça verbal poética nunca está definitivamente pronta. Porque o poema (com Poesia) é matéria viva, portanto um cadinho sempre em ebulição conceptual para que se possa lavrá-lo cada vez mais intenso, objetivando beleza e veracidade para o convencimento do poeta/leitor. Mesmo que a Poética – curiosamente – seja o singular território da farsa, da fantasia e do sonho, peça oriunda de criatividade do artista da palavra, sem compromisso com o plano da realidade. Singela proposta de reflexão sobre a matéria da vida...

– Do livro OFICINA DO VERSO, 2015/16.

http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/5604687