O CÃO DAS DESCOBERTAS

Eis que entra em cena o alter ego, o âmago volátil de meu irmão escriba, buscando caminhos na arte poética, aqueles itinerários vagos que talvez lhe possam dar respostas. Note-se que o questionamento já não é – simplesmente – o lírico-amoroso, o "toi et moi" com os seus dois polos de inquietações e o medo da perda, fruto das ausências de si e para si. Agora, o espiritual começa a questionar e tentar buscar suas próprias respostas. A busca já não é tanto sobre coisas palpáveis, e sim sobre o "ser e estar no mundo". Percebo a Poética crescendo dentro do poeta comprometido, tomando conta, e a partir de então, num hibridismo natural, a palavra flui mais fácil, em maior número de vocábulos e se compõe – a partir do primeiro momento de criação – a oração cursiva desde o nascedouro. O(s) alter ego(s) começa(ram) a se libertar em fôlego mais alongado, não mais se satisfazendo com versos curtos. A maturidade começa a mostrar seus zelos espirituais num registrar mais longo e percuciente. Passou-se o tempo de namoro, agora é laço indissolúvel com a Poética. E desta, dificilmente ocorre o divórcio. Hosanas ao novo ciclo de experimentações. Estou feliz como se fosse eu o cão farejador das descobertas no emaranhado da Palavra, na qual a farsa e a fantasia constroem o imaginário que imanta a realidade e a torna suportável graças ao bálsamo de querer viver, requintando o estar vivo. E o cão uiva a sua linguagem apenas para alguns que também deglutem suas rações de entendimento e beleza...

– Do livro O PAVIO DA PALAVRA, 2015/16.

http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/5608956