O princípio da legalidade em Direito Tributário

INTRODUÇÃO. O Estado foi criado para ser, acima de tudo, um pacificador na ordem social. Visando obter uma garantia de poder exercer em paz as suas liberdades, desde muito os homens destinaram uma parte delas para a criação do Estado, pelas quais lhe concedeu diversas prerrogativas para que pudesse cumprir suas finalidades. Dentre essas está a de instituir e arrecadar tributos de todos os que se encontram inseridos no território de sua soberania.

É de destacar, todavia, que tais concessões não são absolutas. São antes limitadas por uma série de princípios consubstanciados em sua Constituição. Estes formam um conjunto de regras e preceitos que são fixados para fundamentar todas as espécies de ações jurídicas, disciplinando o modus faciendi da função estatal.

No que tange ao Direito Tributário, a aplicação dos princípios objetiva não apenas limitar a ação do Estado, impondo freios para sua voracidade, cada vez maior, mas também facilitar a compreensão das normas jurídicas pertinentes à matéria e ainda oferecer garantias aos contribuintes de que a relação tributária será uma relação jurídica e não simplesmente uma relação de poder.

1 - Princípio da legalidade. A legalidade constitui o mais importante limite para os governantes em matéria de tributação. Está explicitamente consubstanciada na CF/88, em diversos de seus artigos, dentre os quais destacamos o 37, caput e o 150, I, ipsis verbis:

Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (n.n.).

Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

A administração pública, detentora da capacidade tributária, não pode fugir aos ditames da lei. De acordo com o princípio da legalidade, “o administrador não tem a liberdade de tomar a medida, ação ou decisão que bem queira, sem o devido amparo legal. Todas as providências devem estar previstas em legislação específica, diferentemente do que ocorre com o particular, que pode fazer tudo o que não seja proibido por lei”(1) .

Dois elementos sobressaem das disposições constitucionais: a lei e o ato de criação de impostos. Nesse sentido, trazemos à colação o conceito de Clóvis Beviláqua, segundo o qual “a lei é a ordem ou a regra geral obrigatória que, emanando de uma autoridade competente e reconhecida, é imposta coativamente à obediência de todos”(2) .

A autoridade competente é aquela definida na Constituição Federal, haja vista que a competência tributária consiste na divisão do poder de tributar entre os entes federados: União, Estados, Distrito Federal e Municípios, estabelecidos por ela.

Assim, seguindo o princípio da legalidade, os tributos somente podem ser criados ou aumentados por meio de lei, a qual pode ser a ordinária ou a complementar. É de destacar que esta somente será utilizada para criar tributos em alguns casos especiais, como v.g., a contribuição previdenciária de que trata o art. 195, § 4º, CF. Vale dizer que, das contribuições previdenciárias, apenas esta necessita da lei complementar para sua instituição, pois, segundo o Pleno do STF, não se verifica essa mesma exigência para as demais contribuições previdenciárias previstas no art. 195, I, II e III, da CF (Ac. Um. do STF - Pleno – RE 138284-8-CE – J., 1º/7/92, IN RJIOB 1/5486)(3) .

Em suma, em se tratando de tributos, somente a lei pode instituí-los ou ampliá-los, seja ela ordinária, seja complementar. Isso dá certa margem de segurança para o contribuinte, uma vez que não somente ele ficará vinculado pela lei, enquanto sujeito passivo da relação jurídica tributária, mas também a Administração Pública, a qual não poderá ultrapassar os limites legais estabelecidos, somente podendo cobrar-lhe o que já foi instituído e na forma como o foi.

Quanto à criação, é de dizer que a lei não deve apenas preceituar que “fica criado o tributo tal”. Ela também deve estabelecer qual seja o fato gerador do novo tributo, sua base de cálculo, as alíquotas que serão aplicadas, os sujeitos ativo e passivo, as sanções para o inadimplemento e todos os demais elementos mandamentais para que o novo tributo possa efetivamente ser constituído e arrecadado.

É de observar que para uma parte da doutrina, a falta de prazo legal para o recolhimento de alguns tributos pode gerar uma grande polêmica jurídica. A esse respeito, Hugo de Brito Machado traz a lume o caso dos tributos sujeitos a “lançamento por homologação, em que o pagamento é antecipado pelo contribuinte”(4) . Para ele, as disposições do art. 160 do CTN a respeito do prazo para o pagamento dos tributos em que a legislação não o tiver fixado, não se aplicaria a essa espécie de tributos. No seu entendimento, o prazo de 30 dias, a contar da data em que o sujeito passivo tenha sido notificado, refere-se apenas aos “lançamentos de ofício” e não aos casos em que o contribuinte calcula e recolhe o tributo antecipadamente. O STF, no entanto, já manifestou seu entendimento em matéria semelhante, no RE 140.669-PE, da relatoria do Ministro Ilmar Galvão (Informativo STF 134), dando a entender que a omissão poderia ser perfeitamente suprida, sem que a lei, por isso, venha a ser declarada inconstitucional..

"IPI: Fixação do Prazo para Recolhimento

Concluído o julgamento de recurso extraordinário interposto pela União Federal contra acórdão do TRF da 5ª Região, que declarara a inconstitucionalidade da Portaria 266/88, do Ministro de Estado da Fazenda, que estabelecia o prazo para o recolhimento do imposto sobre produtos industrializados - IPI. O Tribunal, por maioria, conheceu do recurso e lhe deu provimento, declarando a constitucionalidade do art. 66 da Lei 7.450/85 que atribuiu ao Ministro da Fazenda competência para expedir portaria fixando o referido prazo, ao fundamento de que a fixação de prazo para recolhimento do tributo não é matéria reservada à lei. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Carlos Velloso, por entenderem que a disciplina sobre prazo de recolhimento de tributos sujeita-se à competência legislativa do Congresso Nacional. RE 140.669-PE, rel. Min. Ilmar Galvão, 2.12.98.(5)

CONCLUSÃO. Como visto, o princípio da legalidade é realmente de destacada importância, principalmente no que diz respeito à segurança dos contribuintes de não serem surpreendidos com o aparecimento de um novo tributo da noite para o dia. Ante a necessidade de lei, haverá pelo menos um tempo para que a matéria tramite pelos canais competentes do Poder Legislativo, dando, inclusive, oportunidade para que seja amplamente discutida com a sociedade ali representada.

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NOTAS

BOSELLI, Paulo. Como ter sucesso nas licitações. São Paulo: Edicta, 1998, p. 31.

2 PAULO, Antônio de. Pequeno dicionário jurídico. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 189.

3 CONTI, José Maurício. Sistema constitucional tributário interpretado pelos tribunais. São Paulo: Oliveira Mendes, 1997, p. 36.

4 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 64.

5 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo nº. 134. Disponível em <http://www.stf.gov.br//arquivo/informativo/documento/informativo134.htm>. Acesso em 23 fev 2008.

BIBLIOGRAFIA

BOSELLI, Paulo. Como ter sucesso nas licitações. São Paulo: Edicta, 1998,.

BRASIL. A Constituição e o Supremo. Disponível em: < http://www.stf.gov.br/portal/constituicao/constituicao.asp>. Acesso em: 24/02/2008.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo nº. 134. Disponível em <http://www.stf.gov.br//arquivo/informativo/documento/informativo134.htm>. Acesso em 23 fev 2008.

CONTI, José Maurício. Sistema constitucional tributário interpretado pelos tribunais. São Paulo: Oliveira Mendes, 1997.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28.ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

PAULO, Antônio de. Pequeno dicionário jurídico. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p. 189.

PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado / ESMAFE, 2007.

SHOUERI, Luís Eduardo. Exigências da CIDE sobre Royalties e Assistência Técnica ao Exterior. RET 37/144, jun/04.