ANÁLISE DA CRÔNICA DE MACHADO DE ASSIS

ANÁLISE DA CRÔNICA DE MACHADO DE ASSIS: ABOLIÇÃO E LIBERDADE

Na crônica “Abolição e liberdade” há uma forte crítica à classe burguesa da época. Datada de 19 de maio de 1888, foi publicada exatamente seis dias após a assinatura da Lei Áurea. O autor viveu e presenciou este período de libertação dos escravos. Machado de Assis era um crítico social e escrevia suas crônicas em vários jornais, como a Gazeta de Notícias, no qual foi publicada esta crônica, na série Bons dias! Sua linguagem predominantemente irônica, com certo humor, mostra a hipocrisia da elite brasileira.

O título da crônica nos passa a ideia de separação entre abolição e liberdade, que uma coisa não é sinônima da outra, pois o autor dá a entender que o escravo ao se tornar alforriado, não se tornara livre, porque além de não ter para onde ir, também não tinha como se manter financeiramente, ficando submisso ao trabalho doméstico que antes prestava ao seu “senhor”.

A crônica mostra um candidato político, usando um discurso abolicionista para conseguir se eleger, colocando-se como profeta depois do “gato morto”, ou seja, a abolição dos escravos chegou atrasada no Brasil e ele estava prevendo depois do acontecido, daí a ironia do autor. O político em questão tem um escravo de 18 anos, para o qual prepara a carta de alforria, aproveitando para mostrar aos amigos sua “bondade” em libertá-lo num jantar. Este senhor se coloca numa posição de santidade como se fosse o próprio Cristo, em que verificamos a intertextualidade com a Bíblia, ao dizer que os amigos chamaram o jantar de banquete. Ao longo da crônica, o autor dá a este senhor uma imagem de falsa modéstia, o qual se coloca como libertador dos escravos, assim como Jesus que era o Salvador.

O escravo, que se chama Pancrácio, está sempre numa posição de inferioridade, como no trecho: “Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio; daí para cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou outro puxão de orelhas, e chamo-lhe besta quando lhe não chamo de filho do diabo; coisas todas que ele recebe humildemente (...)” Nota-se, então, a ironia do autor, colocando sua crítica social.

O que queria o político com essa disfarçada prática do bem e da justiça era tornar-se deputado, por isso mantinha um discurso religioso e uma posição de humilde servo de Deus. Assim ele diria para os seus eleitores que se antecipou a abolição legal, tendo libertado seu escravo em casa.

O autor coloca a conversa do senhor e do escravo, mas este último não tem relevância, mesmo tornando-se cidadão pela nova lei, ainda não tinha voz ativa, pois era um mero empregado, a liberdade estava apenas no discurso do candidato. Machado de Assis foi brilhante na reflexão das condições sociais dos escravos frente a sua suposta liberdade.