Breve análise da letra "De frente pro crime", de Aldir Blanc para o samba de João Bosco

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Incrível a letra do samba "De frente pro crime"! Uma excelente mostra da habilidade do poeta Aldir Blanc com a palavra. É recomendável ler a letra para perceber a real intenção do texto e a forma sutil como ele articula o cotidiano com o existencial.

O texto é cinematográfico, mexe com o imaginário, e nos permite lançar os olhos para algumas direções. A janela é a primeira imagem de onde alguém aponta um corpo estendido no chão. Um morto que parece não inspirar maiores sentimentos porque "invés de reza, uma praga de alguém". Tudo indica que se trata de algum criminoso assassinado. Daí, os elementos de uma paisagem carioca vão ocupando espaço no samba. O local é um bar com suas mesas. Girando em torno dele, várias situações comuns no cotidiano da cidade são descritas, como o comércio informal e seus produtos de qualidade duvidosa traduzidos no verso "baiana pra fazer pastel e um bom churrasco de gato".

No entanto, o tema que gera essa movimentação toda no bar é a morte. Ela é o desconhecido, é o fator que exerce fascínio e move a curiosidade de todos indistintamente; "malandro junto com trabalhador", todos querem "admirar" a morte, ou seja, querem mirá-la de perto. Tanto que o bar lotou a ponto de um possível candidato subir em uma mesa e fazer discurso pra vereador.

A movimentação final do samba nos leva a imaginar o esvaziamento da cena do bar. É quando as pessoas retomam os seus caminhos, suas vidas. A subjetividade, então, prevalece com o esvaziamento da paisagem. Fica apenas o morto e o personagem impotente que fecha a sua janela de frente pro crime, exatamente de acordo com o comportamento social indiferente de todos diante da violência do Rio.

Cristina Ribeiro rj
Enviado por Cristina Ribeiro rj em 14/05/2020
Reeditado em 14/05/2020
Código do texto: T6946657
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