Rede Hildenet – Terceira parte

*Hildebrando Souza Menezes Filho

Numa das premissas em que venho abordando, em paralelo, eu falei sobre as gritantes desigualdades de desenvolvimento* (dual e separado), entre as diferentes regiões do Brasil. O assunto mereceu do Presidente do CNPq, do próprio ministro do MCT e de diversos estudiosos da problemática a abertura de créditos, através de editais do FNDCT, para apoio à pesquisas. Essas ainda são iniciativas muito tímidas, na tentativa de aproximar as regiões.

Irei elencar aqui estas premissas para uma melhor compreensão e clareza do meu pensamento, Ana da Cruz**. Uma estratégia usada pelo autor neste trabalho foi a de evitar exageros de designar e enfatizar dominantes e dominados de poder, que acabam obstruindo o resgate de informações necessárias ao diálogo franco e aberto na sociedade.

A primeira premissa é a de que ciência e tecnologia são fatores determinantes para o desenvolvimento econômico e para o bem-estar social, com especial distinção no papel desempenhado pelas nações, quaisquer que sejam que buscam uma harmonia entre a modernidade técnica da racionalidade econômica e a modernidade ética, que preconiza objetivos sociais somados aos valores éticos.

A segunda premissa é a de que o desenvolvimento científico e tecnológico não é privilégio dos países centrais, também chamados de países de Primeiro Mundo. Uma articulação com o sistema produtivo revelou-se, ao longo do tempo, fundamental. Com pesados investimentos em C&T, pode-se reduzir a fome e gerar empregos para milhões de jovens que ingressam no mercado de trabalho.

A terceira premissa básica é a de que o desenvolvimento científico e tecnológico de cada país depende diretamente de políticas, atitudes e ações públicas de seus governos e, para tanto, exige-se determinação e continuidade dos investimentos que contribuirão para que a sociedade usufrua os benefícios oriundos do conhecimento intelectual adquirido

A quarta premissa é a de que o pleno desenvolvimento de um país só será alcançado por meio de um grande esforço para diminuir as desigualdades regionais, de acesso a bens e serviços, de renda, desconcentrando espacialmente os recursos humanos e materiais para a pesquisa, das regiões mais favorecidas para as menos favorecidas.

A quinta premissa quer dar também um tratamento diferenciado para a formação de novos grupos de excelência (que são conhecidos no CNPq como grupos emergentes), visando a diminuir as disparidades regionais, integrando as diversas regiões, construindo uma infra-estrutura promotora do desenvolvimento sustentável e equilibrado, livrando as regiões menos favorecidas de políticas compensatórias nocivas e perpetuadoras do atraso.

Buarque(1999) discorreu, em uma de suas aulas no CDS/UNB, que o desequilíbrio econômico, social, cultural, educacional, científico, tecnológico perversos, injustos, é causado por uma arquitetura secular de distribuição concentradora de renda, onde o padrão de vida dos trabalhadores de qualificação média de São Paulo, por exemplo, está se aproximando do de seus chefes e patrões, enquanto que aumentou a desigualdade entre esses trabalhadores menos qualificados e aqueles não atingidos pela modernidade. Some-se a esse exército de mão de obra a dos parentes e amigos que não emigraram do nordeste para o centro-sul do País e que permanecem na "idade da pedra lascada" em matéria de inovações.

É dever de todos os cidadãos, estimular e fomentar medidas para combater, enfrentar e corrigir essas diferenças e dessemelhanças ( também explicitadas no cruzamento do pensamento de Amartya Sen e Cristovam Buarque, quando tratam da economia e da ética do bem estar) Abordagens regionais nos programas sobre pobreza podem ser valorizadas e estar na agenda governamental com medidas concretas, para enfrentar com eficácia a universalidade dos problemas relativos às causas da pobreza.

Numa entrevista à TV, o geógrafo Milton Santos recomenda a necessidade de se cuidar das conseqüências desse empobrecimento, que inclui o aspecto cultural e educativo, pois a educação, tal como ela é hoje oferecida, já condena as pessoas a priori. Quer dizer, a educação no Brasil condena as pessoas à desigualdade. Noutro trecho dessa mesma entrevista ele coloca:

“Hoje, com essa cobertura do planeta com as técnicas da informação, a instantaneidade com que as vozes, as idéias, as imagens circulam; essa capacidade de, num mesmo momento, os lugares todos poderem se comunicar em tempo real, isso cria um poder extraordinário a quem detém o comando da informação**.

Milton Santos, o geógrafo, dizia nessa entrevista a Bóris Casoy no “Passando a Limpo”: “Hoje o pensamento que domina é esse pensamento único que ele próprio é violento porque se eu peço ao outro que pense como eu penso, eu estou impondo a ele uma forma de ler as coisas, de ver o mundo que é a minha. Eu acho que é isso que distingue, talvez, a violência atual da violência do passado porque ela é estrutural. E ela é estrutural porque tudo é feito a partir da chamada competitividade. E a competitividade já é uma violência sem nome.

A proposta de ação da “Rede Hildenet” encontra amparo nos estudos e reflexões anteriores que, na medida do possível, merecerão ser lembrados e explicados sempre para a população: Por que as pessoas são pobres, miseráveis e quais são os seus papéis numa sociedade como a nossa? A “Rede Hildenet” assumiu como fundamental levar idéias e imagens que gerem esclarecimentos e reforcem a indignação e o inconformismo frente à essa discriminação reinante. Essa compreensão, sem dúvida, poderá vir a ser fator de mudanças de curto e longo prazos.

Este cidadão vivenciou uma rica experiência na vida pública de planejamento e execução de obras no Governo da Bahia, entre 1975 a 1979. Pelas suas características, ela merece registro:

(...) "viajávamos pelo interior, visitando 336 municípios, ouvindo e registrando as reivindicações da população carente. Desse contato e levantamento nascia o planejamento das ações governamentais, que eram controladas por um mapa sinalizado em cores diferentes (construção de sala de aula = vermelho; posto de saúde =verde escuro; posto bancário = amarelo; posto da Embrater = verde claro; estrada = preto e assim em diante). Por esse controle conseguimos atingir todos os municípios baianos com eqüidade e justiça social, naquilo que diz respeito à distribuição dos recursos.

Durante os quatro anos de gestão (Gestão do governo de Roberto Figueira Santos (março de 1975 à março de 1979) acompanhou-se a realização dos estudos, das obras e das inaugurações. Tudo isto foi condensado em quatro livros onde se discriminavam os custos de cada uma das realizações. Essa prática se assemelha, em muito, ao orçamento participativo desenvolvido aqui no Distrito Federal durante o Governo Democrático Popular. (...)

Essa informação é emblemática porque foi no CNPq, que este autor e vários colegas da Instituição, iniciaram uma Campanha Contra a Fome a Miséria e Pela Vida ( fundaram o 1ºComitê de Brasília, em 1994). Posteriormente fundamos também o primeiro Comitê para eleger Cristovam Buarque Governador de Brasília no “Bar Chiquita Bacana” da 311 Norte.

Em abril de 1999, foi repassado pelo Professor Cristovam aos alunos da disciplina “globalização ética e modernidade”, em sala de aula, um histórico das realizações desenvolvidas em seu mandato, com o título de “A Revolução das Pequenas Coisas.” A Experiência de Brasília - 1995/1999. A filosofia, então, separadas as suas devidas peculiaridades e proporções de estilo e ideologia, ao ver deste autor, guarda relações de interesse coletivo quanto à prestação de contas do dinheiro público, à sociedade, sendo um processo altamente salutar para a democracia. Emir Sader, In: Um plebiscito pela democracia - Correio Braziliense de 27/08/00, página 5, diz: (...) “pela socialização da política e do poder, delegando à cidadania organizada decisões fundamentais sobre orçamento; isto é, quem financia quem e o que. O orçamento participativo re-desperta na cidadania o interesse pela política e pelas soluções coletivas, democraticamente constituídas”.

Outra experiência de vida deste cidadão aconteceu em parceria com as Edições Paulinas (Irmãs católicas), num programa na TV Itapoã (Bahia), denominado “Chão e Paz”, todos os domingos. Através desse programa buscava-se, além da catequese religiosa propriamente dita, transmitir informações, filmes, desenhos animados, debates e entrevistas para mostrar que o “céu começa aqui”.

No entanto, ele se transformou muito mais em aulas práticas de democracia e de direitos humanos, cidadania, ética, justiça, saúde, reforma agrária, e tantos outros temas-cidadãos fundamentais para uma verdadeira escola de qualidade. Se tudo isso fosse levado em conta, de fato o “céu começaria aqui na terra”.

Registra-se, também, um momento especial, motivado pelo artigo: “Toda Autoria é Plágio”, de Geralda Paulista Piedade dos Santos (2000). A empatia que se mantinha na Rede com os autores permitiu-nos passar a apresentar seus pensamentos como sendo “nossos”! Nesse em específico, colocamos a assinatura da autora, no entanto, um dos editores do Correio Braziliense pediu nossa autorização para publicação e o encaminhamos a verdadeira autora.

O E-Mail solicitando autorização foi, no mesmo dia, encaminhado à autora: Geralda Paulista Piedade dos Santos, reforçado também por telefonema para esclarecer a dúvida do Correio. É importante também registrar que o artigo seguiu na “Rede Hildenet” com o nome e crédito de autoria e também a sua situação análoga de estudante de mestrado.

Pela originalidade e sucesso que provocou na “Rede Hildenet” ele merece este registro, até porque essa questão está sendo amplamente discutida entre os mestrandos, e nos interessa muito diretamente. Observem o que escreveu Geralda Paulista (2000) sobre isso:

(...)”Estou me perguntando quem foi que iniciou o processo de construção do conhecimento. Por acaso você sabe quem foi? Se eu puder encontrá-lo, vou conferir-lhe o título de "real autor" e atribuir-lhe todos os créditos pelo que penso, escrevo e realizo e ficar em paz.

(...) Toda vez que leio as leis que nos fazem ameaças nas primeiras páginas dos livros e de outras obras (direitos reservados, reprodução total ou parcial proibida), fico meio desorientada pensando: e agora, será que o que estou escrevendo ou propondo é “meu” mesmo? Será que é cópia?! Onde será que posso ter lido uma idéia que remeta para o que digo agora? E se não me lembro? E se nem li mesmo? Que chatice!

(...)Sim, porque tenho vivido um conflito de autoria. Vou de tal maneira me identificando com uma teoria, uma idéia, um autor, fazendo associações, que vou me transformando nele de tal modo que, de repente, já não sei mais se o que estou falando é algo que nasceu de mim mesma, se algo que ganhou consistência a partir da idéia de outros, ou se é expressão pura do outro. Incorporo seu discurso, que passa a me constituir, acrescido do que eu já trazia. Se digo que a idéia é do outro, estou perdendo a minha própria identidade. (...)

(...)Meu sonho era escrever coisas, publicá-las e imprimir na primeira página: “Pode copiar, pode gravar, pode rasgar e distribuir os trechos que você achar interessantes. Compartilhe com os outros, faça o uso que você achar mais adequado para o que escrevi”. Mas alguém teve o mesmo sonho que eu e já escreveu mais ou menos a mesma coisa no seu livro. Chama-se Fábio Otuzzi. E eu fico muito feliz e aliviada por ele ter feito isso”. (...)

O que ele foi escrito corresponde exatamente ao que penso sobre “autoria” e “conhecimento”. Penso que todo conhecimento está disponível no Universo, pertence a todos e não pertence a ninguém, exclusivamente. Ele é fruto de uma construção coletiva.

E não podemos perder de vista que a mobilização das pessoas tem que possuir essa perspectiva que nas rodas religiosas costuma-se chamar de “propriedade do Espírito Santo”, aliás, o sobrenome da autora (Santos) é altamente indutor.

(...)”Não há nada verdadeiramente novo! Todas as nossas expressões são resultados de milhares de expressões anteriormente registradas, culturalmente assimiladas e acessadas cotidianamente por milhares de pessoas, em pontos distintos.

A autora diz ainda que: “Quando dois astrônomos, em lugares diferentes, descobrem simultaneamente o mesmo cometa (Shoemaker-Levy, por exemplo), ambos acessaram pistas anteriores, fornecidas por toda a consciência acumulada ao longo da história do Universo.

(...) Mas age-se como se cada palavra ou gesto tivesse sido criado naquele exato momento! E o conjunto deles, intitulado “obra”, é um tesouro de individualidade egóica: “é meu”, “eu escrevi”, “eu descobri”, “eu inventei”, quando tudo isso é resultante de uma acumulação coletiva do conhecimento humano.

Sobre ‘egóica’ não foi encontrado no dicionário Koogan/Houaiss o significado dessa palavra, mas pelo processo de dedução com “egotismo” pode-se perceber que a autora quis expressar o sentimento exagerado da própria personalidade do indivíduo que se considera proprietário da obra escrita por ele.

“Portanto, se alguma dessas idéias lhe interessa, use-a sem constrangimentos, porque, certamente, minhas também não são” (...) O grifo é deste autor.

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A originalidade terminou por receber o “carimbo” da Organização Mundial de Saúde através de correspondência pela Internet de uma especialista que assim escreve :

(...)”Constantemente tenho recebido E-MAIL da rede hildenet e sempre são os primeiros a serem abertos, tendo em vista a MARCA, TITULOS DE REFLEXÃO, FATOS HISTÓRICOS, SOCIAIS E ATE MESMO POLITICOS idealizados pelo Autor (Hildebrando) e todos os demais parceiros dessa imensa equipe, pois nunca tiveram medo de mostrar a cara e a esperança do Brasil real. Parabéns. Antônia M Conceição/Consultora e Especialista da Organização Mundial da Saúde.”

Cumpre também registrar que além do editor do Correio Braziliense TT (2000) Catalão que solicitou autorização para publicação desse texto (de “não autoria”) de Geralda Paulista (2000); outras correspondências também atestaram que o conhecimento produzido de forma compartilhada não está no “ranking” da ciência mas é uma expressão viva e autêntica de qualidade e sabedoria.

NOTAS:

* Desenvolvimento que leva em conta o meio ambiente, procurando realizar uma economia que seja capaz de manter o equilíbrio ecológico.

** Ana da Cruz, a Internet começou no Brasil através do CNPq, que investiu os primeiros recursos financeiros e instalações da Rede Nacional de Pesquisas ( RNP), uma rede acadêmica idealizada em 1989, com a 1ª versão ocorrida entre 1991 a 1993, com baixa velocidade. Entre 1995 a 1996 os serviços foram atualizados e a velocidade ampliada.

***Abaixo o cabeçalho original da mensagem recebida:

Assunto: RES: TODA AUTORIA É PLÁGIO...[Fwd: Olá Hildelbrando]

Data: Fri, 23 Jun 2000 13:34:27 -0300

De: Antonia Maria da Conceição <antonia@saude.gov.br>

Para: Rede Hildenet hjuca@solar.com.br

*Hildebrando Souza Menezes Filho

É aprendiz de poeta e mestre em desenvolvimento sustentável pela UnB

Navegando Amor
Enviado por Navegando Amor em 27/05/2010
Código do texto: T2283542