“ENTENDEU OU QUER QUE EU DESENHE?”: O GÊNERO INFOGRÁFICO NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

Artigo publicado também em: Anais do VI SIELP - Simpósio Internacional de Ensino de Língua Portuguesa. Volume 4, Número 1. Uberlândia: EDUFU, 2016. ISSN: 2237-8758.

Disponível também em: https://www.academia.edu/32513327/_ENTENDEU_OU_QUER_QUE_EU_DESENHE_O_G%C3%8ANERO_INFOGR%C3%81FICO_NO_ENSINO_DE_L%C3%8DNGUA_PORTUGUESA_T%C3%A2mara_Lyz_Milhomem_de_Oliveira_Especializa%C3%A7%C3%A3o_em_Lingu%C3%ADstica_UFMG_IFPI_1

RESUMO: Em meio a crescente produção e consumo de textos imagéticos apresentamos este estudo cujo objetivo é propor e discutir uma atividade didática que gênero infográfico. Nesse sentido, realizamos pesquisas bibliográficas em torno dos Gêneros Discursivos. Em seguida caracterizamos o gênero infográfico e analisamos uma possibilidade de trabalho com o mesmo no contexto de ensino de língua materna. A discussão teórica delineou a atividade sugerida, que explora o gênero infográfico e busca desenvolver as capacidades de percepção das articulações discursivas dos gêneros, análise de informações, concatenação de conteúdos de diferentes materialidades de forma a imprimir coerência ao todo que isso constituirá.

Palavras Chave: Gênero discursivo, infográfico, multimodalidade.

ABSTRACT: In the face of the growing production and consumption of pictorial texts, we present this study, whose aim is proposing and discussing a pedagogic activity that is the infographic genre. Thus, we carried out bibliographical researches on Discourse Genres. After that, we conceptualize the infographic genre and we analyze a work possibility with it in the context of L1 teaching. The theoretical research supported the suggested activity that explores theinfographic genre and it searches for developing the capabilities of discourse articulation perception of genres, information analysis, content relations of different materialities in order to give coherence to what all of it will be constituted.

Key- words: Discourse Genre; Infographics; Multimodlity

1. Introdução

O título do nosso trabalho remete a utilização da imagem para representar significados que por vezes a linguagem verbal não alcança. As imagens, as cores, o layout são recursos cada vez mais presentes nos textos que nos cercam. Parte da razão pela qual isso ocorre está na tecnologia, nas diferentes ferramentas que temos disponíveis hoje para elaboração de nossos textos. Temos muitos recursos a mão e muitos novos formatos de comunicar, o que incide em uma maior exposição a textos compostos por múltiplas materialidades, múltiplos modos. O infográfico é um exemplo de gênero cujos recursos não se restringem ao texto verbal, a natureza imagética ultrapassa a exposição de figuras e transparece nos layouts, que guiam toda sua estrutura. Esse é o gênero envolvido na atividade que propomos neste artigo. Acreditamos que sua articulação e características nos auxiliarão a imprimir em nossa atividade uma abordagem multimodal da língua, pautada pelo entendimento sócio discursivo do gênero e por uma concepção de língua interacionista.

2. Concepção de gênero

A proposta de atividade apresentada nesse trabalho apoia-se na concepção de gênero formulada por Bakhtin ([1979], 1997) e seguida por muitas pesquisas acerca do gênero. Sua definição sócio-discursiva conversa com uma concepção de língua dialógica, abarcando os sujeitos e o contexto inerentes às práticas comunicativas como preponderantes para a construção do discurso.

A utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos), concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da atividade humana. O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo (temático) e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua — recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais —, mas também, e, sobretudo, por sua construção composicional. Estes três elementos (conteúdo temático, estilo e construção composicional) fundem-se indissoluvelmente no todo do enunciado, e todos eles são marcados pela especificidade de uma esfera de comunicação. Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros do discurso (BAKHTIN [1979], 1997, p. 279).

Temos nessa descrição uma verticalização dos âmbitos pelos quais circulam a realização dos gêneros do discurso, na qual o ponto macro concentra-se nas esferas comunicativas e afunila-se até alcançar as características linguísticas estruturais do texto, como procuramos representar na figura seguinte. Por essa lógica do tratamento dos gêneros, lidamos inicialmente com as esferas comunicativas - situações de prática discursiva de onde emergem os gêneros. Segundo Rojo (cf.2015, p. 68), a finalidade, o funcionamento e as especificidades dessas esferas, em seu tempo e lugar históricos, determinam as características do gênero discursivo no que este tem tanto de estável como de flexível. Esse lugar de acontecimento do discurso molda-o como um todo, desde sua intencionalidade até sua materialidade.

Tal materialidade realiza-se por meio de uma estrutura composicional, conteúdo temático e um estilo, como traçado pelas palavras de Bakhtin ([1979], 1997). A estrutura composicional pode ser entendida (de uma forma concreta), como o desenho do texto, a forma/ fôrma na qual ele é produzido e reconhecido como um gênero específico. Rojo (2015, p. 87) expõe a relação entre a estrutura composicional e o gênero tomando como exemplo um soneto, tradicionalmente configurado em dois quartetos e dois tercetos. A mesma autora também traz observações relativas ao tema e ao estilo, sendo o primeiro descrito como “o conteúdo inferido com base na apreciação de valor, na avaliação, no acento valorativo que o locutor (falante ou autor) lhe dá.” Para a autora (2015, p. 87) um texto é todo construído (composto e estilizado) para fazer ecoar um tema. Já o estilo estaria relacionado às escolhas materiais do locutor para compor seu texto. Na voz de Rojo (2015, p. 92), essas escolhas estão no âmbito do linguístico, porque a autora se refere a textos verbais. No entanto, quando se trata de textos multimodais, devemos considerar também outros elementos, como as imagens, por exemplo. O gênero abordado neste artigo é uma amostra dessa possibilidade, portanto é necessário pensarmos nos constituintes do gênero de forma mais ampla.

A recorrência desse conjunto de aspectos que estruturam os textos (estrutura composicional, tema e estilo) possibilita o seu reconhecimento. Se começamos a seguir padrões comunicativos com os quais as outras pessoas estão familiarizadas, elas podem reconhecer mais facilmente o que estamos dizendo e o que pretendemos realizar com o texto (cf. BAZERMAN, 2006a, p.29). Sobre essa relativa estabilidade dos gêneros, Bakhtin ([1979], 1997, p. 301) afirma que nos utilizamos sempre dos gêneros do discurso e todos os nossos enunciados dispõem de uma forma padrão e relativamente estável.

Ao trabalhar o ensino de língua portuguesa pela abordagem dos gêneros discursivos, queremos levar o aluno a perceber os mecanismos pelo qual a comunicação funciona socialmente, habilitando-o com o conhecimento acerca da materialidade do texto multimodal, de sua arquitetura e dinâmica de funcionamento dentro das esferas de comunicação. Entendemos que direcionando-nos para este propósito, buscamos formar um sujeito ativo socialmente.

3. O gênero e o ensino de língua materna

Ao trazermos a abordagem do ensino de língua materna pautada pelos gêneros discursivos, trabalhamos o texto englobando aspectos que interferem em sua produção. Saímos do campo cotextual (restrito ao texto) para o campo contextual, evidenciando o funcionamento da língua, atribuindo ao ensino um olhar social na medida em que discutimos estratégias de comunicação e o exercício da mesma.

Essa demanda de um ensino de língua voltado para as práticas sociais realizadas pela linguagem é apontada pelos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (1999, p. 22). O documento orienta que a o ensino básico deve instrumentalizar o aluno para seu desempenho comunicativo. Segundo essas indicações, a escola deve munir o aluno para competir em situação de igualdade com aqueles que julgam ter o domínio social da língua. Entendemos que essa formação direcionada ao desenvolvimento de habilidades para agir com textos pode empoderar o aluno. Bazerman (2006b) também discute a esse respeito e define o gênero como um meio de agência, da qual o aluno pode se apoderar através da escola.

Acreditamos que o ensino de língua materna voltado para as práticas discursivas, e por sua vez para o funcionamento social da língua estruturado em gêneros é mais significativo e diríamos, até, mais útil do que a mera análise de partes do texto ou frases para estudo da morfologia, sintaxe e ortografia.

Não negamos a importância desses conhecimentos, porém julgamos que a repetição de abordagens descontextualizadas e meramente abstratas não auxilia o aluno a inferir a necessidade de apropriação dos domínios discursivos. Posto nessa condição, na qual não consegue enxergar um para quê do que lhe é ensinado, é compreensível que o aluno não tome o aprendizado da língua como parte de sua vida, do seu desenvolvimento intelectual e profissional.

Esse ensino de língua, desvinculado da prática, vai de encontro ao que preconizam alguns dos documentos reguladores da educação básica brasileira. Podemos constatar essa dissonância nas linhas dos PCNs, cujo excerto deixa claro o posicionamento favorável ao ensino situado. Segundo as Orientações Curriculares para Ensino Médio (BRASIL, 2006), outro documento oficial, o ensino de Língua Portuguesa deve direcionar o olhar do aluno para...

[...] compreender o funcionamento sociopragmático do texto – seu contexto de emergência, produção, circulação e recepção; as esferas de atividade humana (ou seja, os domínios de produção discursiva); as manifestações de vozes e pontos de vista; a emergência e a atuação dos seres da enunciação no arranjo da teia discursiva do texto; a configuração formal (macro e microestrutural); os arranjos possíveis para materializar o que se quer dizer; os processos e as estratégias de produção de sentido (BRASIL, 2006, p. 32).

Constatamos nessa orientação um delineamento para o ensino de língua materna que caminha pelas esferas de estruturação do gênero desenhadas por Bakhtin ([1979], 1997), indo desde as esferas de comunicação até os processos de materialização do texto, de produção do sentido. É tomando essa relação entre a concepção de gênero discursivo já mencionada, os documentos orientadores da educação básica e as discussões de outros autores a respeito do ensino de língua que pensamos a atividade sugerida neste trabalho.

4. O gênero infográfico

Tomando como base as discussões de Ranieri (2008) e Paiva (2009), dentre outras, entendemos que o infográfico é um gênero independente, pois é visto por muitos editores e pesquisadores como um texto completo e tem ganhado bastante espaço em revistas de divulgação científica, de notícias e em muitos sites direcionados para os mais diversos fins.

Segundo Colle (2004, p. 12), os principais campos de aplicação do infográfico são: os manuais de instrução, os informes de empresas, a infografia pedagógica, a infografia científica, a infografia jornalística e a infografia publicitária . Em nossa atividade, seguiremos por sua utilização pedagógica, pois nossa proposta tem como objetivo a leitura, produção e divulgação de um infográfico direcionado a uma comunidade de estudo.

Sua natureza composta por uma plasticidade imagética configura o gênero como uma ferramenta útil para visualização de dados, de notícias e um meio para organizar informações de forma objetiva, resumida e didática. Em razão disso, o gênero pode funcionar como instrumento para explicar processos complexos , narrar fatos e encadear diversas informações relacionadas.

Tais características denotam a potencialmente da inserção do gênero no contexto escolar, como um instrumento que auxilie o aluno a sistematizar os conhecimentos adquiridos em Língua Portuguesa ou em outras disciplinas. Segundo Cortes et al. (2014, p. 04), esse gênero “pode ser usado na vertente educacional, como recurso facilitador no ensino-aprendizagem de assuntos complexos em sala de aula”, para os autores “os infográficos multimídia permitem mostrar uma grande quantidade de dados, explicar como sistemas funcionam ou explicitar ideias, através de notas visuais.”(CORTES et al., 2014, p. 09).

Ao visualizar os muitos infográficos disponíveis na internet e em revistas, percebemos que esse materiais são criados com muitos modos, logo, ao abordarmos a leitura e a produção desse gênero traremos a multimodalidade inerente a essas produções, para a sala de aula. Essa composição múltipla é muito recorrente nos gêneros discursivos contemporâneos. Segundo Kalantzis e Cope (2005), a constituição dos textos por meio de vários signos, trazida em parte pelas novas mídias, exige do ensino um trabalho que envolva a leitura e a produção de textos multimodais. Assim como os autores, os PCN+ (BRASIL, 2002, p. 68) também apontam para o uso das diferentes linguagens nos eixos da representação simbólica como competências e habilidades a serem desenvolvidas pelo ensino.

Além de trazer essa diversidade de modos para o cerne do ensino de LP, também trabalharemos habilidades de leitura e pesquisa, momento em que discutiremos com o aluno as estratégias de busca de informações e de julgamento das leituras realizadas. Essa experiência será seguida pela produção do gênero infográfico, entendemos por via deste texto é possível resumir e articular informações. Pois o gênero funciona como uma espécie de mapa mental, composto não só pelo esquema de palavras e suas conexões, mas também por imagens e ainda outros recursos semióticos. Sua constituição possibilita a utilização desse instrumento como forma de avaliação. A partir de sua produção é possível perceber as informações que os alunos acreditam mais relevantes para determinado conteúdo, suas habilidades para articular tais informações e as expor por meio de imagens e palavras.

Diante de tantas ações e do envolvimento de vários modos para a construção do gênero, temos aqui uma atividade complexa, que perpassa diferentes ações e trabalha muitas estratégias comunicativas. Ao abordar o infográfico queremos verificar a capacidade do aluno de resumir, concatenar, avaliar informações, articular conteúdos de diferentes materialidades e imprimir coerência ao todo que isso constituirá.

5. Leitura, produção e reprodução do infográfico

A atividade sugerida neste trabalho será realizada em seis etapas, que compreendem a apresentação da situação de produção, o contato com o gênero a ser elaborado, o seu reconhecimento pelos alunos, sua composição e reprodução. Abaixo segue um quadro - organizado a partir de Lopes Rossi (2011, p. 72) - descrevendo os passos que pretendemos seguir e seus respectivos detalhamentos.

ATIVIDADE PROPOSTA

1. Apresentação da situação

Criar e divulgar um infográfico a partir de diferentes pesquisas sobre um determinado assunto. • Gênero abordado: infográfico

• Público alvo: comunidade escolar

• Reprodução: Redes sociais ou site da escola e ambiente físico de divulgação da instituição.

• Modus operandi: A pesquisa e os textos serão desenvolvidos em duplas, as buscas por informação serão realizadas em meio digital e impresso.

• Quantidade de aulas: 7 aulas em média.

2. Contato com o gênero a ser produzido • Exposição e leitura de vários exemplares de infográficos em seus suportes impressos e digitais (Revistas VEJA, Superinteressante, Mundo Estranho, sites diversos).

• Discussões a cerca do gênero, momento em que serão levantadas perguntas para os alunos sobre as características discursivas e textuais do infográfico:

- Onde geralmente são vinculados?

- Por que seus meios de publicação os utilizam?

- Qual o conteúdo desses textos?

- Quem os escreve?

- Com qual intenção são produzidos?

- Qual o público desses textos?

- Qual a forma de organização do texto (distribuição de informações)?

- Que elementos são usados na composição do texto (texto verbal, hiperlinks, cores, imagens...)?

- O nível do vocabulário utilizado é complexo?

- Quais as características em comum dos textos lidos?

• Distribuição de atividade escrita para retomar a discussão.

• Definição (com os alunos) do assunto a ser pesquisado e abordado no infográfico.

3. Orientações sobre a pesquisa e elaboração do texto • Apresentação do material de orientação que será distribuído para os alunos, com textos iniciais e algumas sugestões de fontes de pesquisa.

• Discussão sobre os critérios de busca de informação.

• Definição do meio (ou dos meios) de divulgação da produção - redes sociais, blog, mural da escola ou outros espaços físicos da instituição.

• Apresentação de critérios para a composição do gênero retomando discussão anterior sobre as características composicionais e discursivas do gênero.

• Apresentação de vídeo de um infografista da superinteressante relatando como realiza seu trabalho .

• Ferramenta de elaboração do gênero- apresentação de alguns dispositivos e suas ferramentas (websites e programas do pacote Officer) pelos quais o gênero pode ser produzido.

4. Produção escrita • Pesquisa para a busca de informações sobre o assunto tratado no infográfico.

• Confecção de esboço da produção.

• Escrita da primeira versão da produção.

• Revisão da primeira versão do texto pelo professor e pelos alunos.

• Adequações do texto às orientações da revisão.

• Revisão pelo professor da segunda versão do texto.

• Últimos ajustes do texto – se necessário.

5. Reprodução do infográfico • Divulgação do infográfico nos espaços virtuais (site, blog da instituição, perfis da turma e da instituição em redes sociais) e físicos (mural, biblioteca) da escola.

6. Avaliação da atividade pelos alunos • Análise da diferença entre as versões do texto que foram produzidas

• Discussão sobre o impacto do material em sua comunidade discursiva.

• Avaliação coletiva da experiência

Como exposto pelo quadro acima, a atividade que propomos inicia-se pela apresentação de seus delineamentos para os alunos. Nessa primeira etapa informaremos qual gênero será abordado e quais são as fases que constituem o trabalho prescrito pela atividade. Aqui o aluno toma ciência do público para o qual se destinará sua produção textual, quais os passos ele seguirá antes e depois da elaboração do infográfico. Na segunda etapa da atividade o aluno terá contato com o gênero em foco, nesse sentido serão realizadas leituras do infográfico digital e impresso em seus respectivos suportes (revistas e páginas web que tenham infográficos) tal como preconiza Lopes-Rossi (2011, p.75). Segundo a autora o momento dedicado à leitura do gênero “deve levar o aluno a discutir, comentar e conhecer as condições de produção e de circulação do gênero escolhido a partir de vários exemplos”.

Diante da leitura dos exemplos, discutiremos as características comuns entre os textos apresentados, indagaremos o aluno sobre a função comunicativa que o gênero exerce, o suporte e contexto no qual o gênero é veiculado, a relação entre o texto e o público para o qual ele se direciona e como o autor pode se valer do gênero infográfico para perpetuar seu discurso. Quando se trabalha por uma visão de gênero discursivo, todas essas indagações precisam ser levantadas, os alunos devem ser chamados a visualizar na estrutura composicional do texto suas relações discursivas e as estratégias argumentativas pelas quais estes foram formados. Com o infográfico não é diferente, esse gênero formado pelo extremo recorte de informações deixa transparecer o posicionamento presente em seus exemplares.

São textos com conteúdos linguísticos demasiadamente delimitados, atrelados ao texto imagético. Esse ultimo modo atribui valor de verdade ao infográfico, pois as imagens espelham objetos concretos [...] e assim constroem mais facilmente uma ideia de realidade. A máxima “uma imagem fala mais do que mil palavras” denuncia a credibilidade que esses modos possuem frente aos signos linguísticos (cf. OLIVEIRA, p. 5, no prelo). Apesar de tidas como reprodução da verdade, segundo Ferraz (2014, p.08) “as imagens não reproduzem a realidade, a constroem”, portanto são mais um modo que está a serviço do autor para enunciar aquilo que ele deseja. É por meio dessa elaboração entrecortada, híbrida e por vezes múltipla que os infográficos reverberam suas temáticas de forma mais visível.

Em continuidade a segunda etapa da atividade, vamos sugerir um assunto (para efeito de exemplo, trazemos em anexo o material de apoio com um assunto previamente selecionado) a ser abordado no infográfico e também verificar se há algo emergente em sua comunidade que necessite de pesquisa, de mais informação. Uma situação social que possa ser atendida pela exposição de informações, já que o infográfico é um gênero propício à exposição de dados. Diante dessas possibilidades vamos decidir, com os alunos, qual assunto poderemos abordar no infográfico. Entendemos que ao dar voz para o aluno e abrir a sala de aula para uma produção mediada pelos discentes, nos encaminhamos para uma concepção social da escrita, em que o conteúdo abre espaço para práticas sociais, dentro das quais os textos são realmente significativos para os alunos, sua comunidade e suas vivências (cf. KLEIMAN., 2010).

Ao seguir pela terceira etapa da atividade, iniciaremos a discussão do material de apoio (exemplo em anexo), onde constarão orientações para a pesquisa que os alunos vão realizar no sentido de colher informações para a produção do infográfico. Nesta oportunidade levantaremos estratégias de pesquisa e de análise para as informações encontradas. Adiante, definiremos qual o melhor meio para a reprodução dos infográficos produzidos pelos alunos mediante análise dos locais físicos e digitais disponíveis.

Depois disso, faremos uma retomada coletiva sobre a estrutura dos gêneros relembrando critérios discutidos em etapa anterior. Complementando esse estudo, será exibido um vídeo que relata o processo de produção de um infográfico publicado em revista de grande circulação. Após as atividades descritas, apresentaremos algumas ferramentas pelas quais o infográfico pode ser confeccionado.

Diante das informações e materiais coletados durante a pesquisa e posterior instrumentalização com os recursos de produção do gênero, a quarta etapa será voltada para a elaboração dos infográficos e iniciará com o planejamento do texto. Segundo Antunes (2003, p. 55), produzir um texto supõe várias etapas, sendo a primeira delas o planejamento do texto. A autora ainda atribui a pouca qualidade das produções textuais de “nossos alunos” à inexistência dessa etapa e de uma revisão textual mais global, relacionada ao funcionamento da comunicação. Após planejar o texto, os alunos farão sua primeira produção, em seguida esse texto será revisado pelo professor e analisado pelos demais alunos - o olhar dos alunos será uma amostragem da recepção dos leitores a qual o gênero se destina, a comunidade escolar da qual os alunos fazem parte.

As demais fases da atividade se referem à reprodução do infográfico e a avaliação da atividade pelos alunos e pelo professor, esses dois momentos nem sempre são contemplados no ensino formal. Geralmente os textos produzidos no ambiente escolar são definidos como redações e direcionados para a leitura exclusiva do professor. Marcuschi (2008, p. 78) confirma essa ideia ao apontar o fato com um dos problemas da produção escrita escolar. Segundo o autor “não se define com precisão a quem o aluno se dirige. A cena textual não fica clara. Ele não tem outro (o auditório) bem determinado e assim a dificuldade de operar com a linguagem é escreve tudo para o mesmo interlocutor que é o professor”.

A visualização de um público real auxilia o aluno a delinear seu texto, direcionando tema, estilo e estrutura para um leitor de fato, que faz parte de uma esfera de comunicação. Ao inserir a atividade em um contexto de prática discursiva, abrimos espaço para outros leitores e distanciamo-nos das situações de produção textual artificializadas e comumente abordadas no ensino de língua materna.

No intuito de direcionar o texto produzido pelo aluno a um público, sugerimos a reprodução do material elaborado em formato impresso e virtual. Mesmo diante de tanta tecnologia, acreditamos que mais leitores da comunidade escolar na qual os alunos estão inseridos (discentes, professores, técnicos administrativos e responsáveis pela limpeza e conservação do local) teriam chances de acesso ao infográfico em formato impresso. No entanto, a publicação do texto em endereços web, traz a possibilidade de o texto produzido alcançar leitores que estão além da esfera escolar.

Ao pensarmos nas questões mencionadas, suporte no qual o texto será veiculado, contexto de circulação e consequentemente o público para o qual se destina o texto, evidenciamos a relação entre esses domínios e a forma como os textos são construídos. O vocabulário, o estilo, os conteúdos ... enfim, toda a materialidade do texto é influenciada pelos domínios citados. Acreditamos que ao expor essa relação entre o gênero e todas as esferas que interferem em sua constituição e relacioná-las ao processo de produção textual dos alunos, auxiliamos esses sujeitos a perceberem a multiplicidade de fatores envolvidos na produção textual. Questões que incidem nos textos que eles leem e também deveriam ser consideradas nos textos que produzem. Para nós, tal direcionamento formaria leitores e produtores de textos mais críticos, cientes das potencialidades da língua e do ensino da mesma.

Após a execução das fazes elencadas até então, passaremos para a ultima etapa da atividade, momento no qual a proposta será avaliada. Analisaremos a atividade juntamente com os alunos, comparando as produções escritas realizadas em diferentes momentos, a repercussão dos infográficos divulgados na escola e as opiniões dos alunos sobre a atividade como um todo.

A proposta que apresentamos aqui não é um modelo engessado, a ela cabem aprimoramentos e adaptações. É possível ao longo da atividade, especialmente após a produção da primeira versão do texto, surgir o trabalho com questões sintáticas e ortográficas a partir das dificuldades e deficiências detectadas ao longo da revisão dos textos. Um trabalho direcionado à necessidade da turma, localizado e, portanto, mais significativo - já que nesse momento os alunos tem a oportunidade de perceber suas necessidades de aprendizagem e não lidam exatamente com mais um assunto a ser abordado em função da ordem prescrita no livro didático ou no currículo.

6. Conclusões

Apresentamos neste estudo uma proposta de atividade fundamentada na teoria do gênero discursivo, tomando como base a definição de Bakhtin ([1979] 1997). Acreditamos que ao evidenciar a relação entre linguagem e práticas sociais, o ensino de língua portuguesa torna-se mais significativo, pois se aproxima da aplicação real da língua.

Por essa via temos um ensino mais concreto, útil, para o qual o intuito de estudar a língua está voltado para desenvolvimento de habilidades comunicativas. Sob esse direcionamento, o trabalho com a linguagem não resume-se ao estudo de seus mecanismos estruturais, mas estende-se a questões discursivas inerentes à linguagem, envolvendo uma gama de aspectos para a construção, reprodução e recepção do gênero.

Com esse objetivo em mente, tentamos elaborar uma proposta que contemplasse ao máximo a potencialidade do ensino de língua pelo viés da produção textual. Para isso, escolhemos o gênero infográfico em razão da natureza de sua composição, constituída por características multimodais e uma configuração discursiva diferenciada (resumida e entrecortada).

Imaginamos que a possibilidade de articular muitas informações e modos em um mesmo espaço, tida pelo gênero selecionado, proporciona sua utilização enquanto objeto de retomada de conteúdos pelo aluno e torna-o um material de avaliação qualitativa para o professor.

Cientes que o cuidado com a escolha do gênero não é suficiente para contemplar a perspectiva discursiva no ensino de língua materna, preocupamo-nos com as etapas constituintes da atividade apresentada, de forma a desenvolver momentos muitas vezes descartados na sala de aula. Como por exemplo: a leitura direcionada para discussões dos aspectos discursivos presentes no texto, a leitura do gênero em seu suporte, o planejamento do texto e a reprodução do texto para um leitor real.

Mesmo com tantos detalhamentos, temos ciência que a atividade apresentada pode ser melhorada e que vários entraves no currículo - como o tempo de execução, que incide na diminuição do espaço para o trabalho com os demais tópicos curriculares a serem desenvolvidos com os alunos – podem inviabilizar partes desta proposta. No entanto, acreditamos que a abordagem do ensino de língua, pautada pelos gêneros discursivos, pode formar um aluno mais crítico e competente quanto ao uso e a recepção da linguagem.

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