Há 12 anos, Olavo de Carvalho escreveu besteiras ao tentar mostrar que Newton estava errado (parte 1)

O texto “Nas origens da burrice ocidental” (Jornal do Brasil, 15 de junho de 2006) mostra como o pseudofilósofo Olavo de Carvalho parou no tempo. Homem com mentalidade medieval, ele tentou rebater a mecânica newtoniana com conceitos obsoletos da filosofia e ciência antigas.

Isto fica evidente na interpretação que ele fez da “eternidade do movimento” – na verdade, o termo correto é “movimento perpétuo” - presente na mecânica do físico Isaac Newton. “No movimento eterno, tudo é fluxo e impermanência”, ele escreveu no texto, referenciando, mas não explicitando, o filósofo pré-socrático Heráclito.

A partir desta frase ele diz - para tentar mostrar que Newton está errado - que “se o movimento é eterno, não faz sentido falar em ‘estado presente’ a não ser por referência a um observador vivo dotado do sentido da temporalidade”.

O “estado presente” refere-se ao estado de repouso ou movimento mantido pelo corpo graças ao poder de resistência da força inata da matéria. Um exemplo concreto: uma bola de boliche – em um vácuo sem atrito ou resistência do ar -, em tendência natural de movimento retilíneo, é atingida por uma bola de papel, mas ainda assim mantém-se movimentando em linha reta.

Isto é a vis insita, ou seja, a bola de boliche resistiu e se manteve no estado de movimento retilíneo (aliás, o uso do termo “estado presente” é questão de tradução, poderia ser traduzido como “determinado estado de movimento”, por exemplo).

Para mostrar uma suposta contradição na mecânica newtoniana, Olavo alega que aceitar a concepção de "movimento eterno" implica em negar a existência de "estado presente" . O problema, para o pseudofilósofo, está neste próprio conceito de "movimento" utilizado por ele.

Como qualquer bom aluno do ensino médio sabe, as concepções de movimento dentro da ciência e filosofia foram modificadas ao longo do tempo. Olavo não sabe, porque sequer terminou o ensino fundamental.

Para a física aristotélica, o movimento é como se fosse uma alteração qualitativa ou quantitativa dos corpos (como o crescimento de uma planta). Segundo Heráclito, as mudanças seriam a essência do universo – é uma tese cosmológica que nada tem a ver com as Leis de Newton. A ciência moderna – fundada por Newton e Galileu Galilei - não adota nenhuma destas duas definições de movimento.

Em suma, o conceito de “movimento”, que Olavo utiliza para atacar a física newtoniana, é obsoleto e equivocado. Esta tese se confirma no quarto parágrafo, quando ele afirma que “todo movimento é, por definição, uma mudança ocorrida dentro de uma escala de tempo determinada”. A princípio parece uma conceituação correta. Parece se não questionarmos o que ele quer dizer com “mudança”. A sentença a seguir responde: “Se você esticar indefinidamente os limites do tempo, não haverá mais diferença possível entre a mudança e a permanência, entre o acontecer e o não acontecer. ‘Movimento eterno’ é conceito autocontraditório”.

Errado. O movimento, para a física, é uma variação da posição de um ponto material em relação a um determinado sistema de referência com o decorrer do tempo. O que Olavo fez no “argumento” dele foi colocar uma concepção filosófica clássica de “mudança” (ou “movimento”) onde não devia. Daí a conclusão equivocada: “movimento eterno é autocontraditório”. O movimento, a qual o cientista inglês se referia, trata-se de deslocamento de um corpo, não de conceituações ontológicas de acontecimento e devir.

Experimentos mostram que Newton está correto. Um corpo em movimento no vácuo, sem influência de força alguma, tende a se manter assim até que uma força o pare – se não houver força para parar, o movimento é eterno. Não conseguimos notar isso no dia a dia por causa de obstáculos como a resistência do ar ou o atrito.

Há mais besteiras sobre Newton neste mesmo artigo de Olavo. Mas abordarei em outro texto.