Ir a Marte?

IR A MARTE?
Miguel Carqueija

Atualmente volta-se a falar na fantasmagórica expedição ao planeta Marte (o planeta vermelho). O pior é que tem gente que acredita, e isso não é de hoje.
Acontece que já se fala nisso desde o milênio passado, não como uma idéia de ficção ou um projeto para o futuro, mas como algo que já estaria iminente. Lembro de terem me falado — isso lá mais ou menos em 1990 — que já haveria um brasileiro na NASA querendo ir nessa expedição. E eu nunca acreditei nisso.
Antes que me acusem de ser reacionário, retrógrado, negacionista ou lá o que seja, lembro que sou leitor e escritor de ficção científica, amo a Astronomia e também a Astronáutica. Com 14 ou 15 anos li um verdadeiro manual de Astronáutica, “A exploração do espaço” do Arthur C. Clarke, obra escrita pelo início da década de 50 e apresenta excelentes parâmetros para a então ainda futura exploração espacial.
Ora bem, muita informação desse grande livro, que li e reli várias vezes ao longo da vida, continua válida.
Como se pode falar em viagem a Marte se nem sequer iniciamos a colonização da Lua? Se não existe espaçoporto na Lua? Se nem sequer temos uma verdadeira estação espacial nos moldes apontados por Clarke?
Vamos refletir o seguinte: desde 1972 (é tempo demais) não surge nova expedição à Lua. E a Lua está em média a uns 384.000 quilômetros da Terra. Marte fica a mais de 50 milhões de quilômetros e pode se afastar bem mais do que isso. Não há comparação entre as duas distâncias.
Teria de haver uma colônia no espaço à volta da Terra, ou seja, uma base orbital, que serviria de início para uma viagem espacial de longo percurso, sem o empecilho da pesada gravidade terrestre. Uma base na Lua também serviria. Mas não existe até hoje base na Lua, onde teria de haver população permanente e os recursos necessários de auto-suficiência até onde for possível.
Que me desculpem os entusiastas dessa viagem a Marte. Mas o fato é que nas condições tecnológicas atuais se esta expedição tresloucada ocorrer será para não voltar. Quem for vai morrer por lá ou no caminho. Aliás em Marte a atmosfera não é respirável, não esqueçam.
Antigamente era comum em romances, contos e filmes de ficção científica a figura do cientista maluco que construía uma nave espacial no seu quintal ou na oficina, não se sabe com que recursos financeiros, e de lá partia para uma viagem à Lua, a Marte, a Vênus, não se sabe com que combustíveis. Ou com algum combustível imaginário e maravilhoso. É o que acontece em “Perdidos na estratosfera”, de A.M. Law, autor inglês (que ainda por cima confunde espaço sideral com estratosfera), e em muitas outras histórias, inclusive “Aélita”, do russo Alexei Tolstoi, parente distante do célebre Leon Tolstoi. Mesmo em tempos mais recentes coisas desse tipo acontecem em histórias em quadrinhos, como as do Professor Pardal. Mas puxa, vamos pensar em termos de realidade! A navegação espacial, ainda mais de longa distância, requer vastos recursos humanos e financeiros, além de insumos específicos de tecnologia, combustível e substâncias utilizadas na fabricação das naves.
A exploração do espaço, se tem futuro, tem de seguir passo a passo, e só a construção de uma base permanente na Lua (e nem se fala nisso) demandaria décadas.

Rio de Janeiro, 7 de junho de 2021.