O segredo de Nara: os erros de uma animação educativa

Ultimamente, tem havido muita discussão sobre como prevenir e combater um problema que existe há muito tempo: o abuso sexual sofrido por crianças e adolescentes. Além das muitas campanhas, têm sido produzidos filmes, escrito artigos, livros e profissionais como psicólogos enfatizam a importância de se discutir abertamente o tema, que muitos ainda consideram tabu.

Entre os curtas-metragens produzidos sobre crianças que sofrem abuso sexual, há uma animação que merece nossa atenção: O segredo de Nara.

Neste filme, Nara é uma menina que é abusada pelo vizinho e este a ameaça, dizendo que, se ela contar a alguém, terá problemas. Aterrorizada por causa da violência e ameaças, Nara se vê sozinha e sem ter a quem recorrer até que sua professora, notando as suas mudanças de comportamento, aproxima-se dela e lhe pede que conte o que está errado. Então, Nara se abre e a professora garante que ninguém a culpará e deixará de gostar dela. O vizinho é preso e Nara então volta a ter uma vida normal.

Alguns pontos devem ser considerados: se o filme tem o mérito de mostrar que o abusador nem sempre é um estranho e que a criança abusada tem de procurar o apoio de alguém de confiança, ele peca por não mostrar algo bastante importante, que são as sequelas psicológicas que ficam na criança abusada.

Ao final do filme, temos a impressão de que basta o abusador ser punido que tudo ficará bem. E esta foi uma falha que prejudicou a verossimilhança do filme. Quem foi abusado ou conhece quem o foi sabe que não é suficiente que um agressor seja punido. A pessoa abusada e maltratada sempre ficará com traumas e desenvolverá distúrbios como depressão, ansiedade, baixa autoestima e outros problemas que podem levar até ao suicídio. Muitas pessoas que sofreram violência sexual na infância nunca conseguiram ter uma vida sexual normal.

Quem sofreu violência sexual de qualquer tipo sempre terá pela frente uma longa batalha para recuperar a sua saúde emocional. E ser abusado é mais grave para alguém que, devido à pouca idade, não tem condições físicas e/ou psicológicas de entender o que estão lhe fazendo nem de se defender contra quem se aproveita de sua vulnerabilidade.

O fato de não terem mostrado a menina enfrentando as consequências psicológicas da violência sofrida diminuiu a qualidade de um filme que foi feito para instruir acerca de como as crianças vítimas desse tipo de covardia precisam de apoio para superar tudo que sofreram.