AUTENTICIDADE E AMOR (ALMA-GÊMEA)

Há um mito de que é importante ler bastante. Mas, mais importante do que ler muito é como absorvemos o conteúdo lido e como o utilizamos. É claro que a qualidade do conteúdo contribui para formar uma bagagem cultural ampla, mas uma pessoa pode extrair verdadeiros aprendizados até mesmo de leituras mais simples. Ora, criticamos tanto a ignorância de alguns cristãos, mas eles são especialistas em um único livro — a Bíblia. Sabem recitá-la de cor e conseguem relacioná-la com a sua vida prática, utilizando-se das parábolas ou versículos. De certa forma, eles fazem muito com pouco.

 

Essa é a proposta deste texto: quero escrever algo rico e erudito, baseando-me principalmente em leituras da minha juventude infantojuvenil. O tema proposto será autenticidade e amor — mas não qualquer amor, e sim aquele que encontramos na alma gêmea, como se fosse a nossa outra metade. Este será um texto de nostalgia e reflexão.

 

A autenticidade e o existir

 

Para o ser humano ser autêntico, ele precisa primeiro existir. Descartes já havia cunhado a máxima: “Penso, logo existo.” Mas há um trecho memorável no Guia do Mochileiro das Galáxias, de Douglas Adams, que ilustra bem essa ideia. A obra narra a concepção de uma baleia (que surge inesperadamente no espaço devido a uma improbabilidade cósmica). Ao se dar conta de sua existência, a baleia começa a identificar os próprios membros, batizando-os com nomes enquanto reflete sobre o que está acontecendo. No entanto, esses breves momentos de consciência terminam abruptamente quando ela cai no solo e desaparece. Ela existiu, mas não viveu tempo suficiente para adquirir essência ou singularidade que a definissem em relação às demais baleias.

 

Jean-Paul Sartre, em sua filosofia existencialista, afirma que o ser humano “primeiro existe e, com as experiências e o convívio social, ganha sua essência.” A autenticidade, para Sartre, nasce da liberdade de agir conscientemente e de tomar decisões. Quando uma pessoa se recusa a exercer essa liberdade e age conforme papéis preestabelecidos pela sociedade, ela está em “má-fé”. Sartre dá o exemplo de um garçom que, ao exagerar nos gestos e movimentos enquanto equilibra uma bandeja, interpreta um papel social imposto a ele, negando sua liberdade e, portanto, sua autenticidade.

 

A autenticidade e a originalidade, assim como a beleza, despertam o amor. A beleza é sempre singular e extraordinária, algo que se destaca na multidão. Contudo, encontrar a alma gêmea vai além dessa autenticidade.

 

O mito dos andróginos e o amor de alma gêmea

 

No Banquete, Platão apresenta a visão do comediante Aristófanes sobre o amor, narrando o mito dos andróginos. No início, os seres humanos eram esféricos, possuíam ambos os sexos e viviam em harmonia, bastando-se a si mesmos. Contudo, insatisfeitos, decidiram construir uma torre para alcançar o céu e viver entre os deuses. Irritados com essa audácia, os deuses os puniram, dividindo-os ao meio. Desde então, os seres humanos passaram a vagar pela Terra buscando a sua “cara-metade”, a parte que falta que foi separada do corpo, a sua alma gêmea.

 

Embora a autenticidade possa despertar o amor e a paixão, ela não é suficiente para garantir que você encontrará sua alma gêmea. Contudo, pode acontecer de sua alma gêmea ser alguém singular, único e original.

 

Referências infantojuvenis e o amor

 

No Guia do Mochileiro das Galáxias, Zaphod Beeblebrox, o alienígena de duas cabeças e comportamento extravagante, conquista Trillian, a terráquea, com uma cantada inusitada: “Venha na minha nave espacial, vou te levar para outro planeta.” Essa frase, tão fora do comum, a fascina e a distancia do insosso Arthur Dent, também terráqueo. A originalidade de Zaphod é o que o destaca.

 

Outro exemplo vem de Harry Potter. Tiago Potter, pai de Harry, é descrito como carismático, talentoso e descolado, qualidades que encantaram Lílian, a mãe de Harry, levando-a a escolher Tiago em vez do “weirdo” e apaixonado Severo Snape. A força do amor entre Tiago e Lílian foi tamanha que gerou o feitiço protetor que salvou Harry do Avada Kedavra, a maldição mais mortal do universo bruxo.

 

Já Harry, por sua vez, perdeu o BV com a Cho Chang, mas foi com Gina Weasley que encontrou sua parceira de vida. Embora a intensidade desses amores não seja tão explorada nos livros, são relações que mostram como o amor pode unir pessoas de maneiras distintas. Muitos, contudo, “shipparam” Harry com Hermione, e quem pode culpá-los?

 

Por fim, na trilogia Fronteiras do Universo, de Philip Pullman, os protagonistas Lyra Belacqua e Will Parry descobrem juntos o amor e a puberdade enquanto enfrentam forças malignas. Lyra possui um aletiômetro (uma bússola que revela a verdade), e Will carrega uma faca capaz de cortar dimensões. Apenas indivíduos únicos poderiam usar esses artefatos, e a união entre Lyra e Will simboliza o encontro de duas almas gêmeas que se completam.

 

Reflexão final

 

Assim, termino este texto provando minha autenticidade e originalidade ao transformar reflexões sobre livros infantojuvenis em um artigo cultural e erudito. Quem sabe, ao fazê-lo, não atraio minha própria alma gêmea para mais perto de mim?

 

 

 

Dave Le Dave II
Enviado por Dave Le Dave II em 22/01/2025
Reeditado em 22/01/2025
Código do texto: T8247343
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