Educação e esclarecimento

Wilson Correia

O filósofo e músico alemão Theodor Wiesengrund Adorno (1903-1969) é o autor de um ‘paper’ (artigo de dez páginas) intitulado “Educação após Auschwitz”.

Educação deriva dos termos 'educare' e 'educere', os quais nomeiam o processo educacional que se dá ‘de fora para dentro’ e ‘de dentro para fora’.

Auschwitz é o nome do campo de concentração nazista onde milhares de pessoas foram eliminadas, compondo os seis milhões de humanos exterminados pelo nazismo.

Segundo Adorno, “A exigência de que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação”, pelo fato de aquele campo ser a barbárie e a educação, o esclarecimento.

Para Kant (1724-1804), esclarecimento é “a saída do homem da menoridade” ou “incapacidade de fazer uso do próprio entendimento” (O que é esclarecimento).

Na trilha kantiana, Adorno entende o esclarecimento como a racionalidade dinâmica, viva, em ação, e não como “razão” no sentido de aptidão ou capacidade de pensar.

Pensar não é mera virtualidade, mas reflexão, significação, valoração e julgamento da realidade vivida, considerando fatos e acontecimentos históricos concretos.

Essa forma de pensar seria, podemos dizer, o núcleo da educação crítica de Adorno, pela qual se daria o desenvolvimento e amadurecimento da personalidade humana.

Esse entendimento, na perspectiva adorniana, não quer dizer uma justificativa para o individualismo, que caracteriza o estilo de vida motivado por fatores sociais e externos.

Por isso, segundo Porto (2006, p. 37) a educação crítica não seria a potencialização do “cada um por si”, mas o meio para se libertar o pensar da ideologia dominante.

Isso é necessário para se evitar a barbárie, o estado de regressão do humano no qual o pensamento não é esclarecido, mas grotesco, desumano, tóxico e destrutivo.

O ‘paper’ de Adorno é atualíssimo e, hoje, ecoa até nossos ouvidos. Ondas, manifestações e expressões regressivas do humano nos espreitam diuturnamente.

Estamos segmentando os humanos por cor, orientação sexual, religião, ideologia, matiz política, estrato social, condição econômica, pertença cultural, atividade acadêmica.

A "guetificação" da vida (guetos para todo que é lado), ao contrário de afirmação de uma identidade, forma sujeitos sociais e subjetividades para a experiência da apartação, da fustigação e do ódio.

Isso tudo complica o mundo racionalmente ordenado do “homo sapiens”. Torna-nos meros “homo economicus” (individualistas), simples “homo belicosus” (guerreiros). É a lupocracia bárbara (pleonaticamente dita, assim mesmo: o princípio de que o homem é lobo do homem como princípio para tudo).

Que a educação nos aponte uma saída. Que o esclarecimento nos traga a maioridade. O pensar valorativo no sentido construtivo. Afinal, a vida espera por isso.

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ADORNO, T. W. “Educação após Auschwitz”. Disponível em: <http://www.digao.bio.br/bau/Adorno-Educacao-apos-Auschwitz.pdf>. Acesso em: 20.10.2010.

KANT, I. “Resposta à pergunta: Que é esclarecimento (Aufklãrung)?”. Disponível em: <http://www.ufsm.br/gpforma/2senafe/PDF/b47.pdf>. Acesso em: 17.11.2010.

PORTO, L. S. “Filosofia da educação”. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.