45% para quem?

Wilson Correia

A “proposta” feita pelo governo federal aos professores em greve nas universidades federais se deu na última sexta-feira-13. Até quem não gosta de especular com numerologia e folclore agora vê que a tal “proposta” trazia em suas entranhas coisas severamente duvidosas. E uma dessas coisas é a propalada notícia de que o governo federal oferece aos docentes um aumento salarial que chega a 45%. Não é verdade. Se essa proposta for aceita, apenas em 2015 esse percentual estará integralizado no salário dos professores titulares (existem os auxiliares, especialistas; os assistentes, mestres; e os adjuntos, doutores). Os professores titulares, os do topo da carreira e já perto da aposentaria, somam algo em torno de 8% dos professores federais. Além disso, esse aumento desconsidera as variações inflacionárias e as correções monetárias, as quais recairiam sobre os ombros desses pouquíssimos professores.

A “proposta” para auxiliares, assistentes e adjuntos segue a mesma trilha. Pela vontade do governo, o professor Adjunto 1, por exemplo, que, hoje, ganha em torno de R$ 7.300,00 brutos, passaria a ganhar R$ 8.400,00 em 2013, R$ 9.200,00 em 2014 e R$ 10.000,00 em 2015. Isso chegaria perto de 32,5% de aumento, assim escalonado. Não há proposta de ganho real para os professores.

Como afirma o professor João Alberto da Costa Pinto, da Faculdade de História da UFG, “Para janeiro de 2012, esse aumento ficaria apenas em torno de 14% sobre o salário atual. Os propalados 45% de aumento não atingem a imensa maioria dos docentes do Magistério Superior federal, muito pelo contrário: atingem apenas uma reduzidíssima minoria da categoria e, mesmo assim, só para janeiro de 2015”.

A par dessa inverdade, a “proposta” cria a regra segundo a qual apenas 20% dos professores federais poderão alcançar o topo da carreira: ser professores titulares. Isso é acirrar a competitividade entre os docentes, como já vem acontecendo nas disputas por editais e assemelhados. 80% dos docentes federais não poderão, por força dessa norma, alcançar o coroamento da carreira no nível mais alto nela previsto.

Hoje, por conta de atribuições com ensino, pesquisa e extensão, o professor federal leciona 8 horas-aula semanais. A “proposta” estipula que deve passar para 12 horas semanais em sala de aula, aumentando o trabalho dos professores, já assoberbados de atividades e vítimas de adoecimentos por conta do exercício da profissão. Esse aumento de trabalho no ensino fere a LDBEN em vigor, como bem lembra a professora Ana Pellegrin, também da UFG.

Não bastasse isso, a “proposta” não faz referência aos servidores técnico-administrativos e nem aos professores aposentados, deixando brechas para futuras normatizações que colocam o controle da malha remuneratória e do ingresso e desenvolvimento na carreira de professor federal nas mãos dos reguladores da educação superior brasileira. Aqui e ali, nos faz ver a professora Ana Pellegrin, encontram-se no documento da “proposta” expressões como “‘a partir (sic) de normas a serem expedidas pelo MEC’” e “‘a partir (sic) de diretrizes a serem estabelecidas pelo MEC’, quer dizer, “normas e diretrizes que não sabemos quando, como e com” base em “quais critérios serão formuladas”.

Como alerta, com propriedade, o professor João Alberto da Costa Pinto, “A proposta do governo Dilma é humilhante para com os professores, humilhante para com a carreira do Magistério Superior federal, a tecnocracia dos ministérios da Educação e do Planejamento de um modo insidioso vem a público afirmar um aumento de 45% de salário quando de fato o que nos oferece é a obrigatoriedade de 50% de aumento de trabalho em sala de aula, roubando-nos uma quantidade de horas semanais que com bastante dificuldade tentamos preservar para as nossas pesquisas”.

Se é que o trabalho da imprensa é perscrutar e ser fiel à verdade dos fatos, o que vemos é uma meia-mentira (a dos 45%) sendo repetida, talvez na intenção de que ela se torne verdade integral. E, se não bastassem os nós da luta por educação de qualidade e como direito social, em uma época de tirania capitalista, ainda temos mais essa barreira a vencer para que a sociedade nos entenda e saiba que não lutamos apenas por salário e carreira, mas, sim, pela preservação do direito social à educação superior, o qual deve ser estatal e republicanamente tratado, e com a responsabilidade que essas suas características exigem de todos nós.