O Ideb e seus problemas II

Wilson Correia

Meu texto sobre o Ideb gerou algumas discussões interessantes, com abordagens que vão na linha do pensamento apresentado nesse texto. Nele, argumentei que, dado que nossas metas são consideradas baixas (para uma escala de zero a dez, é de: 5 para os anos iniciais do Ensino Fundamental; 4,1 para os anos finais do Ensino Fundamental; e 3,7 para o Ensino Médio), estamos aprovando e certificando para o analfabetismo funcional.

Lembrei ainda que, a esse respeito, dia 15 de agosto passado o senador Cristovam Buarque sustentou que estamos estagnados e regredindo cada vez mais quando o assunto é Educação Básica. Para o senador, “Nós estamos sendo reprovados, [os prefeitos], os senadores, os deputados, os ministros, os governantes, os presidentes. Essa é a nossa reprovação, essa é a nossa nota. Nós deveríamos carregar no peito a nota 3,7, porque é esta a nota do ensino médio no Brasil”.

Nessa linha de análise crítica do Ideb, em resposta à pergunta “Mas o Ideb, em algum sentido, tem validade?” O professor Rudá Ricci, diretor-geral da ONG educacional Cultiva e estudioso do tema, deu a seguinte resposta: "Ele tem. Eu prefiro ter qualquer tipo de avaliação a não ter nenhuma. Qual é a principal avaliação, qual é o principal dado que a gente tem que é positivo do Ideb? É que ele tira uma foto do momento. Ao saber o que o Ideb acha que é correto em matemática, em português, o que é o ideal, eu pelo menos tiro uma foto de cada estado, de cada município, de cada escola e por turmas. Eu sei o que está ocorrendo. Qual é o problema? É que eu não sei o porquê está ocorrendo aquilo. O problema é que educação não é foto, é filme”.

Indagado se o índice é quantitativo, Ricci respondeu: “Ele é só quantitativo. Eu fico sabendo há anos que 30% dos nossos alunos não sabem interpretar e eu não sei o porquê [38% dos atuais universitários são considerados analfabetos funcionais]. Ninguém me diz que o problema é hábito, que o problema pode ser dislexia. Ninguém fala. Se você perguntar para alguém do MEC, eles não sabem te dizer”.

Além de quantitativista e de não diagnosticar as causas dos pontos fracos em alunos, professores e instituições de ensino, o Ideb apresenta outras características preocupantes. Uma delas, por exemplo, é a informação, oferecida pelo próprio Ministério da Educação (MEC), de que parte das avaliações utilizadas pelo Ideb é feita pelo próprio professor da turma que é avaliada. Isso se chama avaliação endogênica, a qual deveria ser evitada para o bem de todos. Só para problematizar um pouco esse detalhe, urge indagar: qual professor deseja que a própria turma seja mal avaliada? Nenhum, claro! Por isso, se ele (professor) é quem aplica e avalia a prova usada no Ideb, que garantias temos de que isso está sendo feito com o distanciamento que um procedimento avaliativo como esse exige?

Essa informação, como foi dito, é oferecida pelo próprio MEC. Segundo ele, "A orientação do MEC é que a Provinha Brasil seja aplicada no início e no final do 2º ano como avaliação feita pela própria escola, com aplicação e correção feita pelo próprio professor”.

De fato, nas provas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), por exemplo, há grande mobilização de profissionais externos às instituições para aplicar e avaliar as provas. Isso nunca se viu nas provas cujos resultados são utilizados na composição das médias e metas do Ideb.

Como se vê, a coisa é mais complicada do que se imagina. Cá comigo, fico a perguntar: quem pode dormir em paz com um barulho desses? Em termos de educação, nosso sono bem que poderia ser vivido sobre o leito da qualidade e do valor, e não da quantidade e do número pelo número.

Fontes: RICCI: http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-critica-ao-ideb; BUARQUE: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=3084483251346&set=a.1770955973985.70320.1841833193&type=1&theater; NOTA DO MEC: http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/171/artigo234971-1.asp

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COMPLEMENTO:::

NOTA DO IDEB MOSTRA GRAVES PROBLEMAS NA EDUCAÇÃO

Educadores veem causas na falta de prioridade estatal

Publicada em 17/08/2012 17h16m

Atualizada em 17/08/2012 17h18m

Cristovam Buarque: vivemos uma tragédia educacional, sem direito à comemoração

O resultado das notas do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) mostra que existem problemas graves na educação do país. Dentre as causas está a falta de prioridade ao ensino por parte do Estado brasileiro, nas três esferas de governo. A avaliação é da professora Martha Najar, do Sindicato dos Professores Municipais (Sinprosm). As notas divulgadas esta semana pelo Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) mostraram que, especialmente o ensino médio, teve um desempenho bastante tímido. Em 2007, o Ideb para o ensino médio subiu apenas 0,1 se comparado a 2007, chegando ao índice de 3,6.

No Rio Grande do Sul, a situação foi bastante desfavorável. Na quarta publicação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) desde 2005, o Estado não alcançou metas que haviam sido estabelecidas para 2011, principalmente no Ensino Médio. Depois de desempacar do Ideb de 3,7, repetido em 2005 e 2007, para os 3,9 de 2009, o índice do Ensino Médio no Estado voltou ao patamar de seis anos atrás, os mesmos 3,7. Com isso, a meta planejada pelo Ministério da Educação para o Ensino Médio gaúcho ficou por terra. Deveria ter sido 4.

Conforme balanço publicado na seção UOL Educação, sete estados da federação mantiveram a nota anterior e apenas 11 tiveram crescimento na nota. Conforme a avaliação exposta no site, se continuar nesse ritmo, dificilmente o ensino médio conseguirá escapar de uma “nota vermelha” na avaliação de 2013. A situação é vista com olhos críticos pelo ex-reitor da Universidade de Brasília e atual senador, Cristovam Buarque (PDT-DF).

Segundo Buarque, os dados mostrando que, numa escala de zero a dez, em que a média das escolas é de 5 nos primeiros anos do ensino fundamental; 4,1 nos anos finais do ensino fundamental e 3,7 no ensino médio levam á conclusão de que todos estão sendo reprovados: “Nós estamos sendo reprovados, os senadores, os deputados, os ministros, os governantes, os presidentes. Essa é a nossa reprovação, essa é a nossa nota. Nós deveríamos carregar no peito a nota 3,7, porque é esta a nota do ensino médio no Brasil”, criticou ela.

Para a professora do departamento de Fundamentos da Educação da UFSM, Leonice Alves, ainda que se destaque que é preciso conhecer com profundidade os dados e a metodologia utilizada, eles, por si só, são uma sinalização de que algo está errado na educação do país. “Se a economia vai bem, somos a sexta economia mundial, se as instituições democráticas estão funcionando bem, o que justifica que a educação esteja mal”, questiona.

Leonice faz uma observação reflexiva, que deveria ser pensada por todos: qual o papel que a educação está ocupando na sociedade contemporânea? “Observando apenas números e índices divulgados, a conclusão é de que a educação no país tem ficado em segundo plano”, destaca ela, lembrando fatos, como por exemplo, a dificuldade em se aprovar que a educação receba 10% do Produto Interno Bruto (PIB) ou mesmo que estados e municípios cumpram o que prevê a legislação, que destina parcela específica do orçamento a investimentos no ensino.

Na avaliação da professora da UFSM, os governos precisam dar maior prioridade à educação e, quando se fala em investir, isso também significa qualificar os professores, estabelecendo a formação continuada, em que haja interação entre as diversas áreas do conhecimento e também um diálogo entre os setores educacionais, abrangendo o federal, o estadual e o municipal.

Questionando a amostragem

O Ideb é calculado a partir da combinação sobre o desempenho de estudantes nos exames Prova Brasil ou Saeb, combinadas com taxas de aprovação, reprovação e abandono. Responsável pelo Ideb, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) traça como objetivo ao país chegar ao índice 6 em 2021.

O secretário estadual da Educação no RS, Jose Clovis de Azevedo, questiona a forma como o Ideb é montado no Ensino Médio, por meio de amostragem no terceiro ano, o que não formaria um panorama completo. Ele salienta que, apesar da queda no índice, houve uma pequena melhora na aprovação dos alunos no Estado.

Tragédia educacional

Independente dos critérios usados para a pesquisa, o fato é que a educação brasileira não vai bem. E a tradução desse processo é feita de forma bastante clara pelo senador Cristovam Buarque. Segundo ele, a “tragédia’ na educação repete-se há muitos anos, tanto quando se divulga o Ideb quanto o 88º lugar que o Brasil ocupa no ranking da educação da Organização das Nações Unidas (ONU), além do resultado do exame Pisa, que avalia a educação em 56 países e o Brasil é o penúltimo e não se convoca o Conselho da República”, registrou ele.

“A tragédia não é culpa dele (o ministro da Educação, Aloizio Mercadante), que tem menos tempo no ministério do que eu fiquei. [Mas] ele não ajuda a educação ao comemorar com euforia um resultado trágico. O Brasil não pode se transformar em grande economia tirando nota seis, na escola particular, e média 3,8 nas escolas de pobres”, afirmou Buarque.

Cristovam observou que “é muito preocupante ver que o governo comemorou a tragédia, comemorou a vergonha, em vez de assumir perante a opinião pública que em cinco séculos não se conseguiu resolver os problemas e construir uma economia baseada em mão de obra qualificada, não se conseguiu fazer a educação igual para todos, única forma possível de acabar com o atraso no país”.

Texto: Fritz R. Nunes com informações do UOL; Zero Hora e Agência Senado

Assessoria de Imprensa da SEDUFSM