Que universidade é essa?

Wilson Correia

A Constituição Federal de 1988 traz em seu Artigo 207 o que segue: “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.

Em uma perspectiva histórica, vale registrar que foi o Estatuto das Universidades Brasileiras de 1931, marco estrutural da concepção de universidade em nosso país, o documento que fez germinar o sentido das funções ensino, pesquisa e extensão.

Mas, na esdrúxula opinião de que no Brasil há “leis que pegam, outras que não pegam”, aqui parece ser o caso de afirmar que foi nossa Carta Magna, Lei das leis, o ordenamento jurídico maior que, lenta e sistematicamente, tem deixado de “pegar”.

Para isso vem contribuindo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e os sucessivos Decretos que a regulamentam.

Só para citar um exemplo, já no Decreto nº 3.860, de 9 de julho de 2001, o conceito de ‘indissociabilidade’ entre ensino, pesquisa e extensão não se fez presente, pois, em seu Artigo 8, podemos ler que “As universidades caracterizam-se pela oferta regular de atividades de ensino, de pesquisa e de extensão”.

Esse entendimento deixou para trás o entendimento expresso nos Decretos de nº 2.207/97 e o de nº 2.306/97, os quais sustentaram que “as universidades, na forma do disposto no artigo 207 da Constituição Federal, caracterizam-se pela indissociabilidade das atividades de ensino, de pesquisa e de extensão”.

Em uma sociedade em que o deus mercado (e tudo o que ele implica) surge qual ente intocável e portador do poder de balizar vidas e existências; onde o pragmatismo utilitarista exclui todas as condições apropriadas para o cultivo do espírito e da cultura simbólica e na qual a quantidade sacrifica a qualidade, parece mesmo insustentável uma concepção de universidade que fuja do produtivismo desprovido de ciência e consciência sobre si mesmo.

A universidade de hoje se resume a quê? A universidade atual está a serviço de quê, de quem? Ela existe para quem? Está sendo feita por quem? Por que a universidade que fazemos e sofremos se faz obediente à sociedade de mercado, abrindo mão da autonomia, também esse um conceito que se fez preceito constitucional?

Os professores universitários, sobretudo os federais, caminhamos para onde? O que queremos de nossa ação e trabalho duro? Apenas alimentar um sistema quantitativista, desprovido do humano e que nos recompensa com má qualidade de vida profissional, doenças e vários sacrifícios pessoais e institucionais?

Oxalá pensemos sobre essas indagações, em busca de respostas, inclusive para o disparate de ter que ler o entendimento de que, aqui, o “ensino é que é a prioridade”.