PALMADAS PARA A VIDA

Cada vez mais assistimos o Estado fazer ingerências legislativas em nosso cotidiano. Primeiro foram as leis sobre Tributos, depois sobre as Aposentadorias. Agora querem determinar a Cartilha de uso nas Escolas e, finalmente, que tipo de Disciplina os pais devem aplicar nos filhos. Não falta muito para o Leviatã querer determinar em que lado da cama deve dormir marido e esposa.

Ingerências legais a parte, o fato é que, quanto à educação dada por nossos pais não há como rotular de certa ou errada. Basta saber que foi a possível e necessária à época. Cada família tem sua linha de disciplina própria, única e impossível de ser copiada. É esta diversidade celular que torna bonito o tecido social.

Em nossa família, por exemplo, tínhamos um padrão de disciplina especial. Papai nunca foi de muitas palavras, mas tinha um grande arranque. Se nos pegasse estávamos ferrados! Nunca esqueço de um episódio em que minha irmã retirou o banquinho de papai quando ia sentar e ele caiu no chão. Por pouco não a pegou. Escapou pela porta da cozinha. Não entendo até hoje como ela pôde fazer aquilo.

Recordo-me da última vez em que fugi. Algo de errado havia feito. Já tinha uns treze anos e quando o vi acelerando em minha direção não tive dúvidas. Só me restou ao fundo a janela do quarto e que, por sinal, era ornamentada por uma roseira na parte externa. Eu era especialista em saídas pela janela. Contudo, não foi suficiente para impedir o mapa de riscos deixados pela roseira. Saí no lucro. Papai só me fez correr. E, como foi bom aprender a correr.

Dos três lá de casa, o que mais corria era eu. Minhas fugas me ensinaram a correr atrás de todas as oportunidades que a vida proporcionou. Aos 15, 19, 22, 28, 29, 30, 31, 43, 47 anos. Idades que obtive aprovação em concursos. Ao todo foram 15, quase sempre bem aproveitadas. Corridas de uma pessoa mediana. Os medianos não desistem porque utilizam a técnica do esforço e este sempre se renova.

A verdade é que só tive a ganhar com estas lições. Isto também não me impediu de aprender a correr para seus braços. Hoje, com 47 anos consigo abraçar e beijar meu pai de forma muito natural. Ele está com 77 anos. Minha filha com 12 anos estranha esta atitude.

Minha mãe, por sua vez, deixou suas palmadas em nossa alma. Quantas vezes sabíamos que estávamos certos em alguma posição mas ela não reconhecia. Era durona. Hoje é uma doçura. Foi bom. Aprendemos a fazer muito e esperar pouco dos outros. Se nos decepcionam o impacto é menor e conseguimos sobreviver em paz.

Devo dizer, é a primeira que vez que abro a “caixa preta” da história de minha família. Talvez meus pais e minhas irmãs nem lembrem destas memórias. Para mim fizeram muita diferença.

Seja uma educação ao estilo Exupéry, na base da razão, ou uma educação com rigorismo de prêmios e castigos, o principal é que os filhos saibam tirar as lições para sua própria vida.

Quanto ao Estado, que deixe lá os pais cuidarem da educação dos filhos dentro de seus lares. Com sabedoria e liberdade de ação todos ganharemos.