Boate Verônica, em Manaus

A já desaparecida Boate Verônica, também chamada Lupanar Verônica nas crônicas policiais, foi uma das mais famosas de Manaus, funcionando entre as décadas de 1950 e 1970. Em algum momento de nossas vidas já ouvimos algum parente mais velho citar seu nome ou contar alguma história envolvendo o local.

Ela estava localizada na antiga Avenida João Coelho, hoje Avenida Constantino Nery, no bairro de Flores (atualmente a região corresponde ao bairro Chapada, mais especificamente onde fica o Millenium Shopping). Seu nome fazia referência à dona do empreendimento, a senhora Maria Verônica de Oliveira Sena (1902 - ?), de origem maranhense.

Antes da Boate Verônica, Maria Verônica de Oliveira Sena foi dona do Bar Bom Futuro, também localizado no bairro de Flores. Ao que tudo indica, ela comprou o negócio do comerciante Antônio José Teixeira, o reinaugurando em 1950, conforme anúncio publicado no Jornal do Commercio:

"Bar Bom Futuro

(bairro de Flores)

de Maria Veronica de Olliveira

Este notável estabelecimento comercial, com modernas instalações, agora completamente reformado e com nova gerência, acha-se à disposição dos seus fregueses, à qualquer hora do dia e da noite.

Cosinha eficiente - Perfeição - Asseio e esmero

Grande churrascada à gaúcha

Habilitem-se imediatamente para tomar parte na grande churrascada de domingo próximo, preparada por autêntico gaúchos, com que a nova gerência do bar "BOM FUTURO" comemorará a sua ré-instalação" (1).

No Bar Bom Futuro Verônica realizava grandes bailes, todos embalados pelas músicas de bandas de jazz. Nos fins de semana, além dos famosos churrascos, oferecia à clientela tartarugadas e vatapás. Na noite do dia 21 de outubro de 1950 inaugura o serviço de iluminação elétrica, dando adeus às lamparinas (2). Verônica de Oliveira comandou o bar até 1957, quando o põe a venda, conforme anúncio de 24 de outubro daquele ano:

"Flores

Bar Bom Futuro

Vende-se este conhecido bar com grande terreno e piscina assim como outra grande casa adjunta com 10 quartos e ainda outra menor. Aceitam-se ofertas. A tratar à av. 7 de Setembro n. 1293, ou por telefone com o n. 2499" (3).

Verônica iniciou suas atividades como prostíbulo no final da década de 1950, pois em 1959 já aparece nas páginas policiais. Naquele ano o jornal A Gazeta publicou uma matéria com o título Continuam as cenas de Sangue na "Verônica", na qual discorre sobre uma briga entre duas prostitutas, já bastante embriagadas, por causa de um cliente. Após violento embate, ambas foram levadas para o hospital, e de lá para a Delegacia (4). As brigas nessa boate eram frequentes e extremamente violentas. Em 1961, a jovem prostituta Teresa Gaspar da Silva, de 19 anos, foi "[...] ferida por outra companheira com uma gilete sofrendo ferimento inciso no braço direito" (5).

Um dos atrativos do estabelecimento era o igarapé que o margeava, o Igarapé do Mindú, servindo de banho para seus frequentadores. Estes, aliás, eram de diferentes classes sociais, indo do operário mais humilde ao funcionário público de carreira. De acordo com o pesquisador Ed Lincon Barros da Silva, "Verônica colocava algumas prostitutas vestidas de estudantes normalistas, que ficavam nas praças da Saudade e do Congresso atraindo clientes".

Além da prática do lenocínio e das brigas diárias, a boate também sofria investidas policiais por permitir a entrada de menores de idade, que ingeriam juntamente aos adultos bebidas alcoólicas e entorpecentes. Muitas vezes estes vinham da escola ou fugiam durante a madrugada para frequentar o local. Em 1962 o jornal A Crítica publicava a matéria Lupanar da Verônica é o preferido por menores desajustados. Uma ronda noturna da Vara da Família conseguiu apreender vários deles:

"Os menores foram os seguintes; JMR, de 17 anos, filho de Pascoal Rodrigues Rocha; EAR, de 17 anos, filho de Domicio Rocha; MPG, de 17 anos, filha de João Gomes; RMS, de 19 anos, filha de Francisco Braga de Souza; MIA, de 18 anos, filha de Antonio dos Anjos; MJS, de 17 anos, filho de Francisco Januario e MRPS, de 17 anos, filha de Antonio Romeiro" (6).

Também era palco de confusões envolvendo policiais. Em 1963, o policial Olímpio do Espírito Santo Lobato, lotado com outros colegas para fazer a segurança do local, enquanto tentava dar fim a uma confusão, foi esfaqueado com uma peixeira pelo funcionário público Jonas Castro de Moura, alcoolizado. Olímpio conseguiu, mesmo ferido, desferir dois tiros nas pernas de seu agressor, que foi imediatamente preso (7). Dois anos depois, em 1965, o policial José Aurélio de Oliveira desferiu uma facada no policial Milton Medeiros da Silva (8).

Entre 1968 e 1970 a boate foi fechada duas vezes. Nesta última ela já funcionava, além de Boate Verônica, como Hotel Madrid. Bastava um relaxamento na fiscalização e ela voltava a abrir. No ano seguinte encontramos a Verônica contratando:

"Empregados

Precisa-se de dois empregados (um homem e uma mulher), na Boite "Verônica". Tratar no mesmo local" (9).

Em dezembro de 1972, a Delegacia de Investigações Gerais e a Polinter (Polícia Interestadual), a par de inúmeras denúncias de moradores do bairro de Flores, fecharam novamente a boate por tempo indeterminado (10). Dois anos mais tarde, em 1974, a Verônica continuava a funcionar como Hotel Madrid. A Secretaria de Segurança Pública fechou o estabelecimento de forma definitiva, pois a prostituição continuava, prendendo Maria Verônica de Oliveira Sena e seu marido, José João Gabriel (11). Tinha fim um dos mais famosos lupanares da Manaus Antiga.

NOTAS:

(1) Jornal do Commercio, 06/01/1950.

(2) Jornal do Commercio, 21/10/1950.

(3) Jornal do Commercio, 24/10/1957.

(4) A Gazeta, 27/02/1959. Apud FILHO, Raimundo Alves Pereira. Lupanares e Puteiros: Os últimos suspiros do rendez-vous na sociedade manauara (1959/1969). Manaus: UFAM, Dissertação (Mestrado em História), 2014, p. 91.

(5) Jornal do Commercio, 04/01/1961.

(6) A Crítica, 30/11/1962. Apud FILHO, Raimundo Alves Pereira. Lupanares e Puteiros: Os últimos suspiros do rendez-vous na sociedade manauara (1959/1969). Manaus: UFAM, Dissertação (Mestrado em História), 2014, p. 93.

(7) Jornal do Commercio, 05/01/1963.

(8) Jornal do Commercio, 03/08/1965.

(9) Jornal do Commercio, 31/03/1971.

(10) Jornal do Commercio, 21/12/1972.

(11) Jornal do Commercio, 24/01/1974.