Perdemos a paixão pela Seleção

Nasci em maio de 1978, infelizmente a melhor das seleções brasileiras não vi jogar, a de 1982. Sempre nutri um profundo saudosismo, parafraseando a frase do momento “saudades do que não vi". Até hoje sinto nostalgia do que não poderia assistir por conta do meu nascimento, essa citada seleção e a de Pelé, de 1970.

Como eu gostaria de ter visto Garrincha e seus dribles desconcertantes, Rivelino, Didi e os gênios da bola.

Mas na Copa de 1986, lembro-me da derrota nos pênaltis para França, depois do empate por 1 X 1, com gols de Zico e Platini, que me marcou profundamente. Pois junto com ela veio a decepção sobre Zico, o maior jogador do meu time, o Flamengo, de todos os tempos, que perdeu um pênalti na decisão. Zico, Careca, Sócrates, Edinho e outros craques ao perderem levaram uma nação inteira ao choro e desespero profundo. Acabaram com o sonho e churrasco de muitas famílias.

Depois veio a Copa de 1990, outra grande decepção: fomos derrotados por nosso maior inimigo, a arquirrival Argentina, com um golaço de Caniggia após a jogada de Maradona. Assim o Jornal O Globo da Época comentou o fato:

“Pelas oitavas de final, o Brasil enfrentou a Argentina em 24 de junho, no Stadio Delle Alpi, em Turim. Na primeira meia hora, a Seleção Brasileira mostrou um futebol digno de seu prestígio. Entretanto, o tempo foi passando e o gol não saía. Aos 30 minutos do segundo tempo, a Argentina saiu jogando e a bola foi parar nos pés de Maradona. Em apenas oito segundos, o craque tirou Alemão do lance, escapou de um carrinho de Dunga, passou por Ricardo Rocha e tocou para Caniggia, que driblou Taffarel e chutou para o gol, que estava vazio. A partir de então, a Seleção Brasileira saiu dos eixos. Lazaroni chegou fazer duas substituições: Mauro Galvão por Silas e Alemão por Renato Gaúcho. Quando o árbitro Joël Quinou apitou o final do jogo, o Brasil estava fora da Copa, com uma das piores participações desde 1966, quando foi eliminado nas oitavas ”.

Em 1994, enfim o tetra campeonato com show da dupla infernal Bebeto e Romário. O grito de campeão mundial entalado desde 1970 foi solto de maneira emotiva e desesperada por Galvão Bueno abraçado com Pelé aos berros “É tetra, é tetra, é tetra...”, com certeza foi a narração mais apaixonada e entusiasmada do Galvão. Essa Copa marcou-nos profundamente, digna do país do Futebol cujo povo é apaixonado por esse esporte de massa.

Já a Copa de 1998, foi a meu ver a maior decepção de todos os tempos depois da Copa do Mundo do Brasil de 2014 e do maracanaço de 1950. O começo, na minha análise um tanto leiga, estava claro a falta de entusiasmo, de paixão e a notória passividade da Seleção brasileira. Pois todo torcedor reconhece quando seu time do coração ou seleção do seu país perde para um adversário mais forte ou num dia inspirado. O que ninguém aceita de jeito nenhum, é a apatia, falta de luta, de entusiasmo numa final de Copa do Mundo, ainda mais sendo a França, a anfitriã do evento.

O Brasil perdeu por três a Zero, dois gols de Zidane, o craque da Copa, e um de Petit. Foi um vexame tão grande que parte significativa dos brasileiros e comentaristas esportistas acredita até hoje que aquela Copa foi vendida. A história da convulsão de Ronaldo Fenômeno, poucos minutos antes da partida ainda, é um episódio sob suspeita.

Mesmo o Brasil se sagrando campeão mundial em 2002, com uma seleção brasileira com time mediano, que não era a franca favorita, não teve a paixão, o entusiasmo e o fervor dos tempos de outrora. Tivemos derrotas no passado que foram muito mais sentidas do que a vitória nesse campeonato. A população brasileira não era a mesma em relação à seleção.

De 2006 em diante, pelo menos na minha cidade, acabou-se uma das tradições mais lindas e apaixonantes feitas pelos torcedores, que pintavam as paredes das casas de verde e amarelo, desenhavam caricaturas dos nossos heróis-jogadores e penduravam bandeirinhas nos postes. Coisa mais linda e sincera é a devoção do povo a sua seleção. Infelizmente, meus filhos nunca viram tal manifestação de amor e talvez, nunca verão. Uma pena! Algo lastimável!

Nem em 2014, com a Copa do Mundo Fifa no Brasil, a população recuperou a paixão pela seleção brasileira. E o pior é que parte significativa da população do “país do futebol” contestou o evento, dizendo que ao invés de gastar bilhões em construção e reformas de Estádios, deveriam investir em hospitais públicos melhores e em educação. Contestar o Mundial na nação considerada ultra-apaixonada por futebol e que chorou vigorosamente com derrotas e vitórias em muitas Copas, é uma inversão de valores que expressa o fim do entusiasmo com nossa seleção.

O Brasil não é o mesmo. A paixão acabou. Pouquíssimos são os brasileiros que mantêm amor pela nossa seleção.

O 7X0 da Alemanha no Brasil no Mineirão foi a pá de cal que faltava para enterrar a paixão e amor de milhões de brasileiros.

Esse desamor pela Seleção só tem aumentado, principalmente por terem transformado os estádios em local privilegiado das elites e da classe média alta. Com os preços exorbitantes dos ingressos, a população pobre, foi expulsa do palco dos jogos. Agora só podem assistir às partidas pela TV. Fazer do esporte de massas um privilégio de ricos é assassinar o esporte ou matá-lo paulatinamente.

Hoje, em plena Copa América, o segundo campeonato mais importante para a Seleção Brasileira, vemos a população se queixando da interrupção do campeonato brasileiro. Uma disputa entre 20 clubes empolga mais que uma seleção recheada de atletas milionários, que não representa mais a nação. A que ponto chegamos! Estamos com saudades de ver o Flamengo, Corinthians, Palmeiras e os demais clubes brasileiros e querendo que a Copa América acabe logo, sem nos importarmos se a nossa seleção será campeã ou não.

Chegamos ao fundo do poço! Infelizmente não parece ter volta. Só temos que lamentar!

Texto escrito em 29/06/2019.

Acioli Junior
Enviado por Acioli Junior em 20/04/2020
Reeditado em 30/12/2020
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