O Balanço das Coisas

Se por ventura estivesse assinalado na posição de título

O Balanço das Coisas

- Não, não se trata de um conto erótico, diríamos entredentes.

Entrementes, saberíamos discernir as nuanças, os meios-tons e as semínimas.

Ou não?

Vide o “exemplar exemplo” da música pop.

Nos anos 80, ouvíamos os puristas tecerem loas quase exclusivamente ao roque sessentista que desaguou em vertentes metálicas nos anos 70. Janis, Jimi, Doors, Led, Deep Purple, Genesis, Pink Floyd e tantos congêneres, sejam “con” ou divergentes.

"Aquilo que era música!", exclamavam os entendidos (sem duplo sentido, please!), ao se referirem aos gigantes da década anterior.

Prince e Michael Jackson? Com restrições. Quase toda a produção norte-americana no período? Descartável, superficial e pueril. Rock inglês? Coisa de bibas melancólicas.

No Brasil, boa parte da crítica especializada (em MPB, diga-se de passagem) torceu o nariz para a primeira safra niu ueivi do rock brasileiro: Ritchie, Blitz, Ultraje, Barão, Lobão, Paralamas. Depois da consolidação de uma unanimidade burra, subsequente ao sucesso explosivo destes e outros artistas, e diante de um panorama que desalojava outros gêneros estabelecidos há décadas para albergar roqueiros em profusão, jornalistas e programadores de rádio integraram a cena rock ao status quo, tornando-a mainstream. Mas continuaram subrepticiamente a contrapô-lo (o tal rock errou) com a vetusta MPB, mais séria e pretenciosa, que imortal e imorredoura subsistiria além dos modismos.

Com o tempo, viria a coroação de artistas consagrados em detrimento do investimento em novos nomes; a cena roqueira não se renovou e praticamente se extinguiu nos anos 90, com a hegemonia sertanejo-soteropolitana-collorida.

Mas alguns nomes permaneceram, senão na ativa, em evidência, sendo (re) descobertos pelas novas gerações, caindo na boca do povo em novas versões (ainda que nem sempre dignas) de seus grandes ou menores sucessos, permanecendo no imaginário popular.

No exterior a superexposição dos eighties é o que é, super, mesmo. Basta ver que, para os que cuidaram dos bofes, há possibilidades como a que criaram para si os membros da banda alemã Scorpions, através de seus fãs-clubes, na mais longa e popular megaturnê de uma banda dita de metal nesta década. Ou os recordes constantemente batidos pelos públicos dos Stones ou do U2 - que são caso à parte, sem longos hiatos na carreira, constantemente produzindo e tocando há décadas. OU a volta dos que não forma, permaneceram tentando timidamente ao longo dos anos, para novamente experimentarem o gostinho do sucesso, como ACDC e Guns.

No Brasil há também o time dos que tentam, dos que persistem tentando. Alguns com mais brilho e desenvoltura, outros que voltaram a ser apenas medianos como no instante do primeiro e fugaz hit. E há os que sempre se renovam, e apesar de veteranos, parecem estar em movimento, e não voltados para o breve passado de glórias.

(Um bom exemplo é o Pato Fu, que é dos 90, cujo casal de frente vive momentos-família no simpaticíssimo "Música de Brinquedo", que recria de maneira brilhante "Sonífera Ilha", "Rock and Roll Lullabye", "Live and Let Die", "Pelo Interfone" e "My Girl" - minhas favoritas - entre outras.

Fernanda Takai, John Ulhoa & família constroem um verdadeiro trabalho artesanal de desconstrução e reconstrução, reproduzindo arranjos com fidelidade harmônica, porém timbricamente descompensados, causando um impacto progressivo, que se demanda um certo esforço para o ouvido, mas se revela, cada vez mais, mais benfazejo e prazeroso a cada audição. Muito parecido com os efeitos de adicção a médio prazo do trabalho solo de Fernanda, também extremamente bem cuidado.

Fernanda mantém-se firme em uma dualidade que de tão explícita chega a incomodar: como explicar que voz tão doce e interpretação tão e apenas correta tenham repercussões tão marcantes que nos façam enxergar, em suas releituras, um trabalho quase autoral?)

Mas os que ficam, e ficarão, serão sempre aqueles cujas músicas mantêm o apelo popular.

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