O que diria Sócrates?

O que diria Sócrates se chegasse ao Brasil hoje? Podemos fazer inúmeras suposições da forma como ele viria. Numa nave espacial, reencarnação, abertura dos céus e num raio do sol desceria caminhando com sua túnica e longas barbas.

Brincadeiras à parte, o que ele diria se chegasse ao Brasil e visse o caos jurídico que o país vive?

Certamente, a primeira coisa que diria é que perdemos a noção de valorização do nosso país. E por que diria isso? Simples, basta ler Criton e teremos a noção do Dever. Após ser condenado à morte por ter contrariado o interesse de um grupo, inúmeros amigos tentaram convencê-lo de fugir. Mas todas foram rechaçadas por ele. Nesse livro Criton, inclusive, é a véspera da execução da pena e em nova tentativa de libertá-lo, Sócrates faz um discurso sobre o Dever, o respeito às leis do país que ele morava e cumpriria a pena, justa ou injusta, não importa, mas a cumpriria. Demonstra ainda que se fugisse, destruiria tudo aquilo que passou a vida toda construindo. Certamente não o conheceríamos como o conhecemos hoje. Pois seu discurso estaria desconectado com sua ação. E Sócrates só é Sócrates por ter agido a vida toda com integridade.

Mas poderão dizer que as leis de Atenas não eram como as de hoje. Que hoje vemos as leis serem feitas para beneficiar um grupo em detrimento de todo o país. Leitura superficial, sem dúvida.

Toda lei é feita por um grupo e imposta a outro. É falsa a imagem de que é voltada para o povo. Na verdade, é o interesse que as rege. Pode ser que haja grupos que percebam a importância de se legislar em prol de toda a comunidade, pensando na valorização da vida, na sua preservação, na organização, no bem-estar. E nem sempre a lei deve ser agradável. Mas sempre deveria ser benéfica.

E novamente Sócrates apareceria para dialogar sobre o que é ser benéfica, sobre a beleza da lei, sobre a importância dela. Possivelmente pensaria se a beleza de um texto posto no papel condiz com sua praticidade. “Será essa lei bela?”, talvez perguntasse. E então faria um discurso sobre o belo, sobre a harmonia que o belo cria, sobre a necessidade de ter aquele belo. Talvez o que é belo nas palavras não seja belo na prática…

E então Sócrates convidaria aqueles que legislam e aplicam as leis a refletirem sobre o Dever. Será que agem em prol do que é belo, do harmônico, da busca pela excelência? Ou será que usam da retórica, do discurso, das palavras para benefício próprio? É justo? É injusto?

Pensando bem, se Sócrates chegasse ao Brasil de hoje é possível que fosse novamente condenado por expôr a ignorância daqueles que se julgam sábios. E não seria necessário sicuta, Bastava deixá-lo em alguma rua de uma grande cidade para que uma bala perdida da impunidade o levasse ao encontro dos deuses.