O EMBATE ENTRE CRISTIANISMO E ATEÍSMO

“O Cristianismo é civilizatório; o ateísmo, barbárie”. Esse é o título de um artigo escrito por um cristão do site humanitatis.net. Será que ele está correto? Vamos refletir.

Cristãos argumentam que o cristianismo trouxe valores humanistas em um mundo onde reinava a selvageria. De fato, na Roma antiga os costumes eram abomináveis e o cristianismo promoveu grandes reformas, que trouxeram uma nova consciência de paz, de caridade, de compaixão, de tolerância e de amor ao próximo. Cristãos citam os vários benefícios que o cristianismo trouxe ao mundo e não entendem como podem existir críticos à sua doutrina, e pessoas que defendem o ateísmo.

Vamos tentar entender alguns motivos da crítica ao cristianismo:

Apesar de muitos autores reconhecerem alguns aspectos bons e úteis na religião cristã, eles apontam uma série de problemas em sua doutrina que a desqualifica como guia moral da Humanidade. Vou apresentar alguns:

1. A exigência de acreditar em seu deus, sob pena de padecer no inferno para toda a eternidade. A teologia ensina que não importa o quão bom você foi; não crê em Jesus como filho de Deus, trilhões e trilhões de anos trancado numa prisão de sofrimento. A tática cristã de conversão é semelhante a de governos tirânicos: através da ameaça de uma punição que acarrete sofrimento naqueles que se recusam a aceitar suas ideias.

2. Basear sua moral e seguir leis de um livro que a Igreja de maneira mentirosa, ensina que é a Palavra de Deus.

Os maiores especialistas do mundo em Bíblia têm anunciado que as leis de Moisés foram inspiradas em códigos antigos e não em Deus. Os sacerdotes hebreus usaram o nome de Deus para dar mais credibilidade à sua legislação, como era comum em tempos antigos. Erros, contradições, ensinamentos perigosos e cruéis desqualificam a Bíblia como um livro orientado por Deus.

A Bíblia (sob ordens do deus ali representado) apoia a escravidão, o racismo, a homofobia, permite que um pai venda a própria filha como escrava, aprova o estupro de meninas virgens, discrimina as mulheres, os deficientes físicos, autoriza o exército de Moisés matar idólatras, até bebês e crianças eram mortas a fio de espada, pelo crime de seus pais cultuarem outros deuses: “nada que tem fôlego deixarás com vida” (Deuteronômio 20,10).

Em razão dos ensinamentos bíblicos, a Igreja cometeu uma série de perseguições e assassinatos ao longo de sua história:

Assassinato de pagãos e destruição de seus templos a partir do século 4 (quando o cristianismo é elevado a religião oficial do Império Romano); Cruzadas, a Noite de São Bartolomeu, 1572 (repressão aos protestantes na França pelos reis franceses, que eram católicos – cerca de 70 mil protestantes mortos, segundo algumas fontes), a Santa Inquisição Católica. Inclusive os protestantes achavam a Inquisição uma justa forma de eliminar os inimigos do luteranismo, tais como os anabatistas, grupo cristão crítico da Reforma. Milhares deles foram executados por simpatizantes de Lutero. A Igreja cristã só parou de matar graças à separação do estado e da Igreja (1789). Com a secularização (lei humana) do estado ao invés do estado teocrático (lei de Deus), a ciência e a medicina puderam avançar sem medo, criaram-se leis em favor dos direitos humanos e da liberdade de expressão (que o cristianismo é veementemente contra), e ninguém mais temia ser jogado na fogueira.

Segundo os críticos, a religião cristã é vingativa: promete um castigo no inferno pior que o reservado a Sodoma e Gomorra para as cidades que não ouvirem a mensagem.

Demente: diz que quem tiver fé “poderá pegar serpentes com a mão e beber veneno que nenhum mal lhe acontecerá (Marcos 16,18). “Se teu olho pecar, arranque-o; se tua mão pecar, corte-a (Mateus 5,28).

Despreza o conforto e se interessa apenas pela possível recompensa numa vida após a morte: “Não ajunteis para vós tesouros na terra”.

Arrogante: diz que somente quem for batizado e crer em seu Deus vai para o céu (Marcos 16,16).

Apesar de todas as vitórias do secularismo, a moral cristã ainda traz problemas para homossexuais; mulheres, ciência, religiões de matriz africana, divorciados, crianças, etc. Muitos problemas de ordem sexual, segundo explicam os especialistas, são causados pela moral sexual da cristã, pois é calcada na premissa de que o sexo é sujo, pecaminoso e nos afasta de Deus.

Pensadores e filósofos cristãos contra-atacam e dizem que o ateísmo é uma ideologia criminosa e assassina. Dão como exemplos os governos comunistas de Josef Stalin, Mao Tsé Tung e Pol Pot, que realizaram chacinas em massa em seus países e proibiram qualquer tipo de manifestação religiosa.

Citam frases de célebres comunistas para provar que seus assassinatos eram justificados pela cosmovisão que professavam: “A Religião é o ópio do povo.” (Karl Marx). “Um marxista deve ser um materialista, ou seja, um inimigo da religião.” (Vladimir Lenin).

A objeção de ateus: o ateísmo não propõe a morte de religiosos, nem de ninguém. E, ao contrário do que muitos pensam, o ateísmo não é uma ideologia. É apenas a não crença na existência em Deus ou deuses. Ao contrário do cristianismo, o ateísmo não possui “livro sagrado”, não tem leis e regras de comportamento, não propõe a morte de quem não compartilha de seu pensamento (conforme lei do Antigo Testamento), nem ameaça com castigo quem não o segue (como ensina o Novo Testamento).

Portanto, os líderes comunistas citados acima matavam para impor sua cosmovisão de mundo, que achavam a mais correta: o socialismo. E não só os religiosos eram mortos, mas todos que se opusessem ao regime, fossem crentes ou não.

Cristãos costumam dizer que ateus são imorais e não podem ser nem bons nem felizes sem Deus. Será verdade?

Em países desenvolvidos, onde a secularização é maior (portanto, há menos influência da religião), devido ao alto grau de instrução, os índices de violência são muito menores do que em países maciçamente religiosos. Como exemplo, temos a Noruega, cujo padrão de vida está entre os maiores do mundo e possui o terceiro maior PIB per capita do planeta. Na Noruega, 72% das pessoas não acreditam em um deus pessoal. Em outro país europeu, a Holanda, 27% da população não acredita em nenhum tipo de força superior, Deus ou nada espiritual. A Alemanha abriga 24% de ateus e 26% de agnósticos. Declaram-se sem religião na Bélgica, 37%; França, 43%; e 54 % nos Países Baixos.

O mesmo acontece com outros países europeus, onde a secularização vai ganhando terreno a cada década. E não por coincidência, são nesses países com menos influência religiosa que os direitos humanos são mais respeitados, há maior liberdade de expressão e as pessoas são tratadas com mais igualdade.

A ONU divulgou em abril, o relatório World Happiness Report 2015, onde aponta que os países mais felizes são justamente aqueles onde cresce o número de ateus e a religião tem pouca influência: Suíça, Islândia, Dinamarca, Noruega, Canadá, Finlândia, Holanda, Suécia, Nova Zelândia e Austrália.

Já os países onde as pessoas se consideram mais infelizes, onde há mais pobreza, violação aos direitos humanos, opressão, baixa escolaridade, etc., são naqueles em que a religião tem forte influência na sociedade. Uma das exceções são os Estados Unidos, país com cerca de 90% de pessoas que creem em Deus, e, no entanto, líder na economia mundial, terra de liberdade que atrai milhões de estrangeiros todos os anos que desejam melhorar de vida. É que a terra do Tio Sam sabe separar negócios e fé. Lá, a maioria cumpre respeitosamente suas obrigações dominicais em templos e igrejas, mas durante a semana trabalha, se diverte e procura ser feliz com as milhares de opções de entretenimento que uma país capitalista e secular tem a oferecer.