A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA NO RECANTO DAS LETRAS

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Nos dias de hoje existe uma palavra que aparece com inusitada frequência tanto nos textos escritos como nas declarações feitas na mídia; essa palavra mágica é “tolerância”. Todos afirmam ser extremamente tolerantes e condenam quem não o é. Atualmente, firmar de ser intolerante é politicamente incorreto enquanto a palavra tolerância tornou-se um estereótipo desconhecido na Antiguidade: com efeito, os Antigos não eram tolerantes pois, não sendo intolerantes, não precisavam se definir tolerantes. Mas, além das declarações de princípio, é necessário entrar em contato com a realidade cotidiana para averiguar até que ponto essas pomposas declarações de abertura mental encontram respaldo no comportamento cotidiano das pessoas e, como esse meu artigo está sendo publicado no Recanto das Letras, irei justamente tomar em consideração a atitude de, não digo todos, mas de uma parte significativa de recantistas que não sabe ou não quer dialogar.

Já tive a oportunidade de verificar como, quando o assunto é política, os leitores se digladiam chegando até a trocar ofensas. Não é um espetáculo edificante, entretanto não se pode negar que tal comportamento possui se não uma justificativa, pelo menos uma sua explicação. Objetivamente, devido uma determinada forma de governo impactar com a vida dos cidadãos, existem interesses divergentes envolvendo aspectos essenciais da vida cotidiana. É portanto evidente que quem fomenta um certo tipo de ação política pode gerar temores e raiva nos que pensam de forma oposta e é normal que, tendo em vista interesses materiais e sociais contrapostos, se chegue ao embate.

O que porém não faz absolutamente sentido são as agressões geradas por pontos de vista diferentes no âmbito da religião. Se, digamos, um livre cidadão afirmar que não acredita numa certa Divindade ou tem dela uma visão diferente daquela imposta pelos dogmas, qual mal ele pode fazer aos adeptos da religião? Objetivamente nenhum! E não pode ser de outra forma, pois as religiões tratam de assuntos metafísicos que, como diz a etimologia da palavra, nada tem a ver com o nosso mundo material e somente dizem a respeito de questões transcendentais que não serão minimamente afetadas pelo pensamento alheio. No entanto, durante quase dois mil anos, as perseguições mais crueis e as guerras mais sangrentas foram originadas pelas religiões e ainda hoje nada inflama mais os espíritos que as disputas sobre problemas teológicos.

Quanto ao Recanto, o que mais me deixa irritado são as atitudes daqueles que, mesmo sem nada saber do meu pensamento, sem nem ter lido uma linha sequer dos meus textos, já me rotulam como ateu e, portanto, como um ser desprezível (como se ser ateu fosse um ser monstruoso!). O que segue é o exemplo de uma conversa tida com um típico crente cheio de achismos incapaz de enfrentar um diálogo civilizado. Felizmente ele, tendo provavelmente se dado conta de seu comportamento absurdo, deletou providencialmente texto e comentários. Naturalmente, por motivos de respeito e de privacidade, não irei divulgar o nome, usando apenas falsas iniciais.

01/05/2019 06:27 - Richard Foxe

Sabe por que você é cristão? Porque cresceu num ambiente cristão, foi educado nessa religião desde que aprendeu a falar (se não antes), porque frequentou escola, paróquia, ambientes sociais onde a única verdade permitida e aceita era e é o cristianismo. Se você tivesse nascido no Iraque, seria muçulmano, se tivesse nascido em Mumbay seria induísta, se tivesse nascido na Tailândia seria budista, e assim por diante. Agora lhe pergunto: o que lhe faz pensar e acreditar que a sua verdade deve ser assim? Já tentou investigar as fontes da sua religião e ouvir, com mente aberta, a voz de quem pensa de outra forma? Caso esteja disposto a isso, na minha escrivaninha encontrará artigos e livros apresentando uma realidade bastante diferente daquela proposta por séculos e séculos pela igreja cristã. Tenha um bom feriado.

01/05/2019 06:49 - RST

Bom dia. O mesmo para vc TB é verdadeiro. Veja:Vc disse: "E se tivesse nascido no Iraque, seria muçulmano, se tivesse nascido em Mumbay seria induísta, se tivesse nascido na Thailandia seria budista, e assim por diante." Pergunto: Estes que nasceram em tais países TB não poderiam pensar do jeito que vc pensa, isto é, por ele ter nascido no ocidente acredita no que acredita? Logo, podemos concluir que tudo que vc pensa tb é fruto da sua cultura ocidental iluminista, cartesiana, etc, e de toda sua tradição que lhe foi ensinada. A relativização relativiza-se a si mesma. E quem disse que isso que vc pensa tb é verdadeiro? Por isso, meu caro o que vc faz nada mais é do que viver em círculo que não saí do lugar, ou melhor, como um macaco (não estou lhe ofendendo), que corre atrás do próprio rabo. Tenha um bom dia, meu caro.

01/05/2019 07:47 - Richard Foxe

Você se engana redondamente. Em primeiro lugar ninguém me ensinou nada, aliás, se lesse o meu artigo intitulado "Por que não sou cristão?" iria descobrir que fui crescido e educado num ambiente católico, sendo eu mesmo fervente cristão até completar os meus vinte anos de idade. Foi muito tempo depois que comecei a questionar a "verdade" e a buscar respostas às inúmeras questões que não se encaixam na doutrina católica e o meu raciocínio não deriva do "iluminismo", mas já estava presente no pensamento dos grandes filósofos da Antiguidade. Também não pretendo ter a verdade no bolso, mas nos meus textos demonstro que os alicerces da sua religião foram constantemente manipulados e falsificados por aqueles que tinham e tem interesse no poder espiritual. Isso não é relativismo, é apenas objetividade histórica.

01/05/2019 08:16 - RST

Entendi. E quem te garante que os filósofos antigos tb não poderiam estar errados? Eles TB não poderiam ter lhe manipulado? Não seria prepotência demais vc achar que através dos seus textos encontraremos a verdade plena e absoluta do mundo? Me responda uma coisa: De onde deriva seu senso de justiça? Como vc prova empiricamente que devemos amar nossos pais, ser solitários com os necessitados, não racistas, sinceros, etc, tem como provar isso empiricamente, filosoficamente ou em laboratórios? Se for explicar por meio do pragmatismo ou utilitarismo, eu tb não poderia dizer que não estou nem aí para eles, e que, portanto, dane-se o amor pelos meus pais, a justiça, a solidariedade, etc? Quem poderia me condenar caso pensasse assim? Qual o sentido de tudo isso. Explique-me por que será que países que baniram a religião como o Kmer Vermelho, Antiga União Soviética, Alemanha Nazista, e outras, foram tão cruéis mesmo proibindo a religião? Aliás, vamos supor que de fato Deus não existe, certo? Explique-me por que há tanta maldade no mundo desde que o mundo? Se Deus não existe, por favor, me explica a razão do mal e do bem? Meu caro, já li de tudo que fala contra a fé cristã. Inclusive, de autores ateus bem mais capacitados que vc. Entendo sua raiva a fé cristã. Alguma decepção o levou a tão grande ódio. Ou vc é daqueles ateus militantes que diferentemente de outros ateus honestos que simplesmente não crêem, pronto e acabou, vive a atacar a fé cristã.

01/05/2019 08:30 - Richard Foxe

Caro RST, você continua se enganando! Quem lhe disse que sou ateu? Jamais, em meus textos (que você, do alto de sua sabença nem se dignou de ler) afirmei isso, muito pelo contrário, posso dizer que toda a minha existência foi fortemente caracterizada pela busca da espiritualidade, que é algo de bem diferente da religião. Também jamais afirmei de possuir a verdade: releia com mais atenção o meu post das 07:47. Quanto aos antigos filósofos, se eles estavam errados, como é que foram os primeiros a defender conceitos como amor, justiça, ética, respeito e os outros valores que estão à base da sociedade humana? Todo o resto de seu comentário é só um amontoado de achismos cuja finalidade é de me apresentar como sendo ignorante e desonesto. Posso aceitar um pensamento diferente do meu, mas por favor, me respeite, assim como eu estou lhe respeitando!

01/05/2019 09:02 - RST

Estou lhe desrespeitando não, meu caro. Vc que entrou no meu post se julgando o dono na verdade. Quem é vc, a não ser um simples e pobre mortal como qualquer outro, para vir no meu post e pagar de dono da verdade? Vc deveria no mínimo respeitar a fé dos outros, será que seus ídolos filósofos pré socráticos, Sócrates, Platão, Aristóteles, Confúcio, etc, não lhe ensinaram o respeito? Aliás, como eles provam que isso existe? Não poderiam eles estar TB te manipulando? No meu texto deixei claro que aquilo é o que creio e não impus nada a ninguém. É muita prepotência sua achar que SEUS TEXTOS, MEUS TEXTOS, etc, são os certos? Quem é vc que ao mesmo tempo que está aqui digitando pode do nada morrer? (não desejo isso). Menos, meu caro. Se vc por algum motivo se revoltou, se enganou ou se frustrou com a fé cristã, milhares e milhares pensam o contrário de vc. Então, por isso, eles estão errados e só vc, vulgo, sabichão da internet, está certo? Menos. Está noite podem te pedir sua alma, o que tem preparado para ela, rs? Sem mais. Quando quiser dialogar com respeito, só chamar. Por hora, deixo vc com sua rebeldia provavelmente sem causa. Passar bem. Ah, Jesus te abençoe. Ele te ama, rsrs.

01/05/2019 09:49 - Richard Foxe

Continua insinuando que eu seria um sabichão, prepotente, vulgo e irreverente: seria essa a sua forma de me respeitar? A meu ver é você que anda magoado com alguma coisa, mas esse é outro assunto pelo qual não tenho o menor interesse. Como não sabe sustentar um diálogo de forma civilizada, o problema é seu, pois nem eu estou impondo nada a ninguém, apenas tentando mostrar um ponto de vista diferente que, decerto, suscita o rancor dos intolerantes. Por isso a nossa conversa termina aqui. Quanto à possibilidade que a minha vida termine essa noite, não me preocupa nem um pouco, sendo que a minha consciência está limpa.

Provavelmente esse senhor, bastante sarcástico, faz parte daqueles para os quais quem não é cristão é automaticamente ateu e, como afirmam os cléricos das teocracias do Oriente Médio, um "inimigo de Deus".

Mais recentemente aconteceu algo de parecido, mas sem longas sequelas. Aconteceu que outro recantista comentou assim o meu texto de Teologia intitulado “Considerações sobre a existência de Deus”:

31/07/2019 16:34 - PGL

Não li nada. Não li e não gostei, mas pelo titulo e alguns comentários, nota-se que se trata de uma babaquice, querendo PROVAS. Na força de vontade, não existe algo para provar. No acreditar em um sonho não há como provar. As pessoas (medium) que ver os espíritos não há como provar. As pessoas que já viram ETS, não há como provar. Nem todos nós temos PERCEPÇÃO. Uma pessoa poderá ver um santo, apontar e ninguém MAIS estará vendo. As crianças enxergam os espíritos e não sabem explicar. São tantos anos, e as pessoas acreditando em um Deus, tendo os ateus etc. O porque isso lhe incomoda? Sabemos dos abusos das religiões, mas será que as pessoas irão desacreditar de Deus devido a um artigo de Richard Foxe? Pra que serve isso? Cruz credo.

Esse sujeito, não tendo lido o texto (inclusive me pergunto como se pode abominar algo que não se conhece) ficou imaginando que eu estivesse negando a existência da Divindade quando, na verdade, a minha era apenas uma consideração de tipo filosófico, daquelas que tanto perturbavam Miguel de Unamuno, e quem acompanha os meus escritos sabe que sou Deísta. O fato de não ter encontrado provas científicas da existência de Deus não nos leva à conclusão que Deus não existe. Por outro lado falei claramente de indícios e a questão permanece em aberto. A minha opinião pessoal, que fica às antípodas do ateísmo, se encontra no meu artigo intitulado "Universo Pessoal" (24/03/19): basta ler o texto para conhecer o meu pensamento.

Entretanto, a minha forma de raciocinar baseada na lógica desagrada também aos ateus e a prova se encontra nessa breve troca de comentários efetuada com um famoso recantista ateu que todos conhecem:

16/06/2019 08:45 - Richard Foxe

Mesmo que Deus não exista, existe o Universo, provavelmente oriundo de uma D-brana ou alguma outra coisa anterior. Qual o problema se eu chamar de Deus essa "coisa anterior"?

16/06/2019 08:56 - XYZ

Foxe, quero ser gentil, porém, o mesmo delírio.

Voltando ao assunto inicial, o problema da tolerância, reputada como ponto de início de um diálogo entre pessoas com ideias e ideais diferentes, quando muito acaba gerando uma postura na qual prevalecem a paciência, a suportação e uma atitude de aceitação que se concretizam numa forma de caridade superior, não muito diferente daquela das religiões monoteísticas com relação a quem vive no erro e comete pecados. O próprio Mahatma Gandhi, a respeito desse problema, escreveu: “Eu não gosto da palavra “tolerância”, mas não consigo encontrar outra melhor. A tolerância pode implicar uma suposição gratuita da inferioridade das outras religiões, ao passo que a ahimsa (não-violência) nos ensina a ter o mesmo respeito pelas crenças religiosas dos outros assim como fazemos com a nossa, admitindo assim a imperfeição dessa última. Essa admissão será prontamente feita por um buscador da Verdade que segue a lei do amor. Se tivéssemos alcançado a visão completa da Verdade, não seríamos mais meros buscadores, mas teríamos nos tornado um com Deus, pois a Verdade é Deus. Mas sendo apenas buscadores, nós procedemos nessa busca e estamos conscientes da nossa imperfeição. E se somos imperfeitos, a religião como concebida por nós também deve ser imperfeita [...] sempre sujeita a um processo de evolução e reinterpretação [...] E se todas as fés delineadas pelos homens são imperfeitas, a questão do mérito comparativo não existe.”

NOTA: Esse texto foi adicionado ao meu E-book intitulado: "Artigos, Contos & Textos de Humor" que pode ser baixado grátis na seção E-livros da minha escrivaninha.

Richard Foxe
Enviado por Richard Foxe em 11/08/2019
Reeditado em 05/09/2019
Código do texto: T6717836
Classificação de conteúdo: seguro
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