Resenha: John Wick 3 Parabellum

Quem assiste o filme John Wick 3: Parabellum imagina que só assistirá violência e mais violência, ou seja, cabeças cortadas, corações arrancados etc. E é tudo verdade. John Wick é um filme para entreter um público de cabeça cansada. Eu digo cabeça cansada não no sentido pejorativo, pois nem todos que descansam a cabeça (assistindo filmes de violência ou não) são pessoas menos reflexivas.

O filme traz à baila um aspecto bem interessante no que diz respeito ao “espaço sagrado”. Quem já estudou um pouquinho sobre religião sabe que espaço sagrado é um assunto antigo e muito estudado pelos teólogos e filósofos. A palavra religião vem do latim religio, que é formado pelo prefixo “re” (de novo, outra vez) e o verbo “ligare” (ligar, unir, vincular). Mas, afinal, quais são as partes vinculadas? São justamente o sagrado e o profano. O profano representado pelas coisas da natureza e do homem; e o sagrado, pelos deuses ou um lugar separado da Natureza.

Todas as religiões do mundo instituíram para si espaços invioláveis. Na religião judaica, por exemplo, quando Iawheh institui um espaço para o povo habitar – Terra Prometida – e, além disso, o lugar onde o templo fora edificado e, nele, posto a Arca da Aliança (um receptáculo onde ficava guardado os textos sagrados). Através da sacralização as religiões criaram a ideia de espaço sagrado. Os céus, o Monte Olimpo, o Templo de Israel, as igrejas modernas etc. Todos são espaços dedicados ao ritual religioso. Não é diferente com o Hotel Continental onde assassinos do mundo inteiro estão imunes a qualquer retaliação, vingança ou morte enquanto estiverem hospedados.

Um código de ética foi quebrado após John Wick assassinar o chefe da máfia Santino D'Antonio. Jowh Wick profanou o espaço sagrado dos assassinos e passou a ser perseguido pela Alta Cúpula (uma espécie de divindade entre os assassinos) sob a recompensa de 14 milhões de dólares.

Para se redimir Johw Wick vai em busca da Alta Cúpula e, para isso, caminha dias e dias pelo deserto. Um detalhe para o deserto. Sempre utilizado pela religião como figura simbólica do lugar de encontro com a divindade. Jesus passou 40 dias jejuando no deserto (Mt 4).

Jonh Wick no seu retiro espiritual consegue um encontro com a divindade da Alta Cúpula. O todo-poderoso da Alta Cúpula pergunta-lhe: Por que você deseja permanecer vivo? A resposta de Johw surpreende: “preciso viver para manter viva a lembrança da minha esposa”.

Ou seja, mais uma vez o sagrado sendo lembrado em um filme tão sangrento e “irreflexivo”. Sagrado não é só o espaço dedicado ao culto religioso. É também, sobretudo, o lugar das lembranças. Quantas vezes já não choramos quando lembramos dos conselhos de uma pessoa falecida? Um conselho de mãe? Ou quem sabe a lembrança do primeiro beijo? Pois bem, as nossas emoções, lembranças e momentos também são LUGARES SAGRADOS. O sagrado também se manifesta na vida íntima das pessoas.