A Ética e o berço

“A arte, expressão física do pensamento, é feita de conhecimento e ação. Também a Ética, enquanto arte do agir, comporta estudo e prática. A Ética é uma investigação acerca do Bom e uma observância daquilo que foi entendido.” (MARCHIONNI, Antonio. Ética: A Arte do Bom. Petrópolis: Vozes, 2008).

Acredito que o conceito de Marchionni sobre Ética vem a ser um bom ponto de partida para que possamos inferir sobre quem seriam os maiores responsáveis pela formação ética das pessoas. Sim, pois já que a ética comporta estudo e prática, e o caráter de uma pessoa vai-se formando desde o momento da concepção no ventre materno (bagagem genética), e praticamente define o que a pessoa será ainda na infância, eu diria que o papel dos pais é fundamental na formação ética dos filhos. E, porque esse “estudo” da criança na mais tenra idade se dá pelo exemplo dos pais, enquanto vão se formando suas ligações cerebrais, não hesito em opinar que o seio familiar vem a ser o maior responsável pela formação ética do ser humano, seguido da escola, cujo papel também é de suma importância nesse contexto.

Com efeito, “estudando” o comportamento dos pais em várias situações, a criança aprende, e ao mesmo tempo vai pondo em prática o que capta, tomando o que vê em seus pais como seu primeiro e maior referencial de conduta - e isso é para toda a vida. É claro que sempre há as influências do “mundo extra-lar”, mas o que acaba imperando mesmo é aquilo que se aprende em casa, e que depois vai sendo lapidado e consolidado na escola. Desvios de conduta podem acontecer, sobretudo na adolescência - a chamada “fase da rebeldia”, da experimentação, do “se descobrir” -, mas, passada a “turbulência” desse "voo solo e rasante", salvo raras exceções é certo que finda por prevalecer na idade adulta o aprendizado adquirido na infância.

As interações que também ocorrem no convívio social e na vida profissional, com seus padrões próprios de comportamento ético, somam-se, como uma espécie de complementação, à “espinha dorsal ética” calcificada quase que integralmente nos primeiros anos de vida, quando se convive a maior parte do tempo com os pais, e também com os irmãos e demais familiares.

Considerando que os padrões éticos podem variar, e variam, em função da cultura de cada povo, acredito que é numa sociedade estranha à qual se deu a formação da pessoa o lugar onde se torna mais difícil ser ético, não porque não se quer, mas em razão do desconhecimento dos padrões éticos desse ambiente “estranho”. Desse modo, pode-se vir a enfrentar dificuldade em “ser ético” numa situação assim.

Agora, se o contexto for a própria sociedade em que se nasceu e se criou, penso que talvez seja mais difícil assumir uma postura ética (ou, melhor dizendo, mais fácil não assumir uma postura ética) “entre quatro paredes”, seja no banheiro ou no quarto, ou até na cozinha, vez que na intimidade solitária ou “a dois”, muitos dos “enquadramentos éticos” que o convívio social exige acabam ficando “da porta pra fora”. Há que se ter em mente que a ética é de natureza autônoma, ainda assim, quando se trata de regras e padrões impostos pela sociedade pode conflitar com o que no íntimo cada um tem como valores pessoais – daí, a dificuldade de ser ético em alguns lugares ou situações.