Lembranças de uma “tragédia anunciada”

Lúcio Alves de Barros*

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Foi mais que uma tragédia o acontecimento da queda de um viaduto em Belo Horizonte. Ele se foi na tarde de uma quinta-feira dia 03 de agosto, na Avenida Pedro I, entre os bairros Planalto (na Pampulha) e São João Batista (Venda Nova). O acontecimento não pode ser esquecido e tampouco os responsáveis não podem sair impunes. Falo isso sabendo que pouco ou nada vai acontecer. No Brasil a coisa é mais ou menos assim, as “tragédias anunciadas” acontecem, tornam-se casos de polícia e com o tempo tudo acaba no esquecimento, sai da memória coletiva e é cultural esperar as próximas vítimas. No caso do viaduto faleceu uma mãe trabalhadora e dedicada à sua família e um jovem homem que ia buscar a mulher no trabalho. Além disso, cerca de 20 pessoas foram feridas e muitos residentes próximos do outro viaduto sofrem do pânico dele cair. Detalhe: por pouco a tragédia não foi maior. As imagens, hoje na internet, mostram mais carros e um Move passando por baixo do viaduto. Sem muitas palavras é preciso apontar para:

1º - de alguma forma todos somos culpados. Votamos nas autoridades que estão por aí. Permitimos que elas brincassem de casinha na capital inteira e vira e mexe acontece micro problemas e fatalidades nas ruas e nas obras da capital de Minas. Ninguém faz nada. É um calar da mídia e dos órgãos responsáveis sem tamanho e, como não dá para esconder um viaduto, a coisa explodiu.

2º - Não é possível nem pensar em tirar a responsabilidade e averiguar como andam as atividades da Construtora Cowan S/A. Há tempos as construtoras e as empreiteiras ganham viadutos de dinheiro neste país e devem esconder coisas que até Deus duvida. Não existe vigilância e a coisa, com a COPA, foi feita em toque de caixa no intuito de maquiar a cidade para agradar a gringos e troianos. Absurdo maior é impossível. Outro detalhe: denúncias de problemas nas construções já haviam chegado ao poder legislativo (outro culpado).

3º - Toda “tragédia anunciada” resulta de descaso coletivo e, neste caso, a Prefeitura de Belo Horizonte, o Estado de Minas e a Federação que não vigiam o como o nosso dinheiro está sendo gasto são co-culpados e obviamente devem ser responsabilizados. O palavreado na mídia é que estão auxiliando os feridos e dando assistência às famílias. Poupem-me: assistência no Hospital Municipal e no Risoleta Neves é mais sofrimento. As vítimas merecem melhores condições de recuperação. E tais ações ainda revelam o perfil do governo em vigência que, definitivamente, vem mostrando que não gosta de gente. A ideia de cidade empresa, de empurrar casas e comunidades para fora da cidade, de levar a efeito a faxina social e mandar a polícia espancar manifestantes quer dizer muita coisa. É um absurdo e dificilmente não causa indignação à população o descaso governamental e a inércia em ações em prol do bem público.

4° - Por último, é impossível não pedir ao eleitorado que resignifiquem o processo eleitoral que está por chegar. Coloquem as contas em dia e observem com cuidado quem está pagando as contas. Também paga-se com o corpo, o tempo e a vida. Como sempre, apesar do sofrimento diário e dos transtornos que obras sem gerenciamento produzem, é o pobre, o miserável, a mulher e o batalhador (em sua maioria negra) é que pagam mais caro mantendo um pé no perigo e o resto nas ruas perigosas de Belo Horizonte. A queda do viaduto, um empreendimento que fazia parte do conjunto de obras de implantação do BRT Move é a maior lágrima que caiu na capital mineira após a Copa, sem esquecer as duas mortes dos jovens que também caíram dos viadutos em junho de 2013. Perto disso, o placar de “07 a 01” da Alemanha no Brasil não vale de nada.

*Doutor em Ciências Humanas, professor na Faculdade de Educação (FAE/BH/MG)