Máquina de moer gente

E essa máquina de moer gente na cidade de Belo Horizonte? Ele MOVE, mas morde. Quebra a coluna: deixa a criança doente, o adolescente ansioso, o jovem torto, o adulto "puto" e o velho, aos poucos, mais perto dos sete palmos. O BRT (Bus Rapid Transit - ou Transporte Rápido por Ônibus) difundido no Brasil desde a década de 1980, não passa de uma experiência que já deu o que tinha que dar. Falo por uso e por tudo de errado e ruim que percebo na imobilização cotidiana desse sistema. Tal como o goleiro Bruno do Flamengo vamos por partes:

Em primeiro lugar, é observável que o coletivo é lento e não melhorou a mobilidade. A espera nos pontos - impossível de mensuração - é constante e nervosa. Filas e mais filas de virar quarteirão compõem o cenário hoje exposto nessa capital de ninguém. Logo, o "cliente" que paga os impostos tem um veículo de locomoção de péssima qualidade. Motoristas e trocadores - retirando os que tem compaixão - estão nervosos e claramente impacientes com o trabalho. O pessoal que tenta explicar nas cabines também. Como informação a PBH tem a cara de pau de entregar um papelzinho que tenta ser explicativo, mas ninguém entende o 51, o 50 e o 52. Os erros são constantes e muita gente perde o bonde. Os de bom coração dizem que "é o começo! Aí erra assim mesmo".

Em segundo lugar, é preciso comentar sobre a operacionalidade do veículo. Não sou nenhum técnico no assunto, mas como usuário gostaria de ajudar dizendo que as "paradas" na cidade, especialmente nas ruas mais estreitas e movimentadas, não estão claras. As placas não estão devidamente colocadas e muitas não indicam o lugar correto no qual o "usuário da droga" tem que ficar para pegar o que não "Move". No que tange às plataformas ridículas é crucial denunciar que existe um vão (digo, um buraco) entre o ônibus e elas. Em um dos dias em que utilizei o Move três coletivos pararam porque uma senhora havia prendido a perna nele. Mais que isso, para chegar à região dos hospitais, o moribundo que pegar o ônibus corre o risco de não chegar. Sugiro um especial para este caso. No interior do veículo, é comum o ar condicionado tornar as coisas tão frias que é melhor ficar em uma geladeira. Uma idosa bem humorada disse, "não adiantou nada tomar a vacina da gripe". Coitados dos alérgicos.

Em terceiro lugar, a boiada continua ouvindo os trocadores gritando, "pode ir, já desceram". Eles a ainda batem as pratinhas e dizem, "Vamos! Está liberado". E as freadas para ajeitar o povão ainda são utilizadas ostensivamente. Vale mencionar a descrença no outro, haja vista que as catracas internas, agora controladas por um dispositivo, barram a entrada. Depois do pagamento, o trocador libera como se o usuário tivesse a intenção de não pagar. Um clima de suspeita se forja entre os usuários que estão agarrados na catraca para não cair. No interior das cabines (algumas ainda em construção) as pessoas esperam entristecidas, cansadas e melancólicas. Um ferro é onde elas podem sentar. Ainda existem poucas cadeiras e idosos, gestantes e portadores de necessidades especiais ficam se equilibrando no ferro lá exposto. O ferro não comporta tanta gente. "É preciso chamar os direitos humanos", disse um jovem irritado. Outro, entristecido, "vou chamar a polícia, pois ela passa toda hora por aqui". Além disso, algumas estão mal iluminadas e ao redor de outras não existe sequer uma luz. Neste caso, as cabines são locais de oportunidades para roubo, furto etc. Em tempos de diminuição de "fatores de risco" contra a violência e a criminalidade o poder público erra e feio.

Finalmente, alguns coletivos, apesar da modernidade, ainda possuem um sinal ensurdecedor e tenho dó do motorista. O coletivo ainda “arranca” com as portas abertas. Sabemos de um dispositivo através do qual o motorista só pode dar a partida com as portas fechadas. Segurança é tudo. Detalhe, a TV interna não funciona e os Moves tentam imitar com certa incompetência o metrô. As pessoas que entram pelas portas sem saber nas paradas no interior da cidade são chamadas em alto e bom som pelo trocador: "Olha aí gente! Tem que pagar". É a estratégia da vergonha e da violência simbólica em alto e bom som. Para completar a incompetência, a prefeitura ainda teve a ousadia de jogar todo o trânsito dos carros menores para as avenidas laterais. Quilômetros de engarrafamento se formam todos os dias e duas horas é pouco para chegar a algum lugar e é verdade que as pessoas nos automóveis não respeitam a faixa exclusiva para o "novo navio negreiro" ou o novo "transporte pós-moderno". O sacrifício no interior da cidade é tão grande que motoristas e trocadores, além das setas colocam mãos e o pescoço para fora no intuito de avisar aos outros motoristas. A disputa pelo espaço se dá por gritos e buzinas e, logicamente, pelo tamanho do automóvel. Acho que vou estacionando por aqui. Desculpem-me o mal arrumado das palavras. Escrevi indignado e isso não é bom. Acho que fui contaminado pelo Move. Estou quase parando. Como o povo, estou cansado e estressado. O meu cartão está amarelo e após minha retrospectiva anual fiquei no vermelho ou no caos tal como está a capital de Minas Gerais.