A importância da solidariedade

O que dizer de um natal e um final de ano em plena crise política e econômica? Muito difícil escrever quando as pessoas esperam palavras de esperança, fé, amor, tolerância e compaixão. Talvez, mesmo longe das crises – fenômeno tão conhecido no Brasil para os que têm mais de 30 anos – já não tínhamos muito o que comemorar. A humanidade fracassou em seu sonho de modernidade e nossa história como humanos não é das melhores. De todo modo, reagimos e é por aí que aposto em algumas possibilidades interessantes:

Em primeiro lugar, é nos momentos de crise que devemos auxiliar o outro. São nesses momentos que encontramos a possibilidade de exercitar a solidariedade, tanto a individual, pois penso que nos ajudamos até mais, e a coletiva, dado que o outro dificilmente responde com ousadia a um clamor que na maioria das vezes não foi desejado. Logo, momentos difíceis são fortes produtores de solidariedade, de relações amigáveis, afetivas e de humanidade.

Em segundo lugar, e a questão está associada ao que afirmei antes, é a necessidade das relações de solidariedade não somente pingarem, tipo: “eu fiz minha parte”, “doei aquilo e isso e agora é com eles”. Não adianta e não importa. Relações solidárias dão trabalho, um pouco de desprendimento e necessitam de continuidade. O bebê não aprende a andar sozinho, o adolescente precisa ouvir e aceitar os valores socialmente aceitáveis e o adulto deve entender que não é nada em meio a ninguém. É preciso entender que somos responsáveis pela dor alheia de muitos e a opressão e o sofrimento imposto por poucos (a política está aí para não deixar o argumento se ferir). A capacidade humana de tecer relações virtuosas aparece em momentos de anomia social e a história é repleta de casos e mais casos de superação, ação e reconfiguração de novos meios e formas de vida.

Em terceiro e último lugar, é clara a necessidade da criatividade, da ousadia, do jeito, do acordo e das inúmeras formas de sociabilidade possíveis. Da família que cria galinhas que entregam ovos no quintal, ao homem que vende panos e amola alicates na rua percebemos o como homens e mulheres, especialmente no Brasil, fazem para encontrar estratégias de sobrevivência. Falta dinheiro, vende-se o carro. Ainda falta e vende-se um imóvel, os móveis e a turma vai se virando, se ajeitando à espera de um cenário melhor. Na crise aceitamos salários menores, esquecemo-nos dos benefícios e privilégios e acabamos encontrando nossa insignificância. A luta diária não oferece trégua e nela temos de cuidar do eu e do outro. É a possibilidade de ressignificar uma vida de relações que outrora de bonança agora é de respeito, caridade, calma, temperança, economia e ajustes de contas. Todo acontecimento carrega o seu contrário. Que o tempo natalino e de ano novo nos ajude a ver o outro lado da lua, um monte de estrelas no caos do céu e muitas nuvens de chuva porque delas estamos precisando.