O dilema dos jovens rurais: ficar ou sair do campo.

Diversos trabalhos na área de Ciências Sociais, sobretudo na Sociologia Rural no Brasil e em outros países, vêm pesquisando sobre a saída e permanência dos jovens no campo. Essa questão vem sendo analisada nos últimos anos por diversas perspectivas. Pesquisas como o de Abramovay (2003), Carneiro (1998), Paulo (2010), Wanderley (2013) e Stropasolas (2006) destacam que a saída dos jovens agricultores em direção às cidades vem se intensificando nos últimos anos no país.

A juventude parece um desses termos óbvios, cercado de entendimentos tácitos, sendo, assim, uma dessas palavras que se explica por ela mesma e/ou um assunto sobre o qual todo mundo tem algo a dizer. Por isso, em algumas pesquisas que retratam a juventude rural, as associações negativas sobre juventude quase estão ausentes. “É como se nos jovens rurais fossem coladas imagens de uma vida rural idílica, por proporcionar maior contato com a natureza, onde a vida é mais calma, as pessoas mais simples e o ambiente menos competitivo, portanto em contraposição às imagens da vida urbana nas metrópoles” (TAVARES, 2009, p. 3). Por outro lado, um dos estereótipos em relação aos jovens rurais é de que eles se encontram em uma situação que não têm alternativas de vida e que, na sua condição rural, resta-lhes apenas a escolha da migração.

Na perspectiva de Paulo (2010) a característica fundamental daquilo que define a juventude está diretamente relacionada aos seus contextos de vida e a complexidade de aspectos que se efetivam a partir daí. O que se evidencia, com isso, é a multiplicidade e singularidade da juventude, pois ela apresenta trajetórias e percursos distintos. Nesse sentido, muitos jovens rurais têm alternativas para permanecerem ou saírem do campo. O antropólogo da CEPAL, John Durston (1997), ao estudar a juventude rural dos países latino-americanos, destacou que os jovens desenvolvem pensamentos e ações estratégicas em vários campos de possibilidades. Em um primeiro momento, por meio da imaginação e da fantasia, para depois progressivamente modificar suas ações sociais em objetivos que orientam as possibilidades de realização de projetos para o futuro em curto, médio ou longo prazo.

Enquanto o projeto para o futuro dos jovens urbanos significa um processo de escolha de uma profissão; para os jovens rurais, pode ser carregado de uma tensão maior, à medida que implique na decisão entre ficar ou permanecer com a família no local de origem. Souza (2001) destaca alguns fatores determinantes que podem contribuir na escolha da profissão: a oferta de escolas e centros de formação geral, a diferenciação social, a valorização do campo e a precariedade das condições da unidade produtiva.

De acordo com Wanderley (2013), as expectativas de permanência nas atividades agrícolas da juventude rural estão condicionadas a fatores socioeconômicos externos e internos relacionados à propriedade familiar, especialmente naquilo que diz respeito à escolha profissional e a valorização da profissão de agricultor em relação a outras atividades. Tais situações, somadas à escassez de oferta local, podem comprometer o projeto para o futuro dos jovens, pois a busca de melhores condições profissionais e educacionais fazem com que muitos migrem para municípios vizinhos ou outras regiões do país.

Dada à precariedade das alternativas locais e existindo a possibilidades de trabalho e estudo em outros municípios, muitos jovens agricultores migram como estratégia de sobrevivência. “Migrar pode vir a ser um sinal de libertação. Ao decidirem tentar a vida em outro lugar, é como se dessem um basta à situação em que ali vivenciam” (MENEZES, 2009, p.276). Assim, a migração pode ser considerada uma maior autonomia para o jovem agricultor diante da subordinação anteriormente vivenciada.

Segundo de Souza e Cruz (2015) dentre as diversas instituições sociais, a família se destaca por ser um ambiente privilegiado para a escolha profissional por ser o primeiro grupo de contato social dos mais jovens. Mas, o projeto de vida dos jovens rurais, apesar de sofrer influência dos familiares, tem como referência fundamental a figura paterna. Trata-se de uma relação de solidariedade e de subordinação aos objetivos familiares vinculados à autoridade do pai.

Os projetos profissionais fora das atividades agrícolas também recebem uma forte influência familiar. Mas, as estratégias de escolhas de uma profissão dependem das oportunidades oferecidas no local ou da disposição que o jovem tem para se deslocar de forma temporária ou permanente.

Contudo, a migração das moças e dos rapazes nem sempre está diretamente relacionada à falta de condições básicas no meio rural, mas à complexa dinâmica cultural e social. Segundo Rendin (2014), a saída do campo para os jovens pode estar atrelada a diversos aspectos que envolvem: a busca de lazer e entretenimento propiciados pelos espaços urbanos, um status midiatizado do jovem urbano e a busca de oportunidades que atendam as suas aspirações pessoais (seja no campo profissional, social, econômico ou cultural).

A questão da migração é de fundamental importância para a compreensão da realidade da juventude rural, por ser a maior parte dos migrantes jovens e por existir uma grande variedade de situações no interior da migração juvenil (DURSTON, 1997). Ademais, as trajetórias migratórias ou suas possibilidades, em alguns casos, permanentes, captam as nuanças entre o momento histórico e social dos jovens agricultores camponeses e das unidades familiares nas quais eles pertencem, estando direta e indiretamente as estratégias de sobrevivência e, em certo grau, ao seu projeto de vida.

Em suma, no mundo rural, as expectativas para o futuro desses jovens são caracterizadas por uma dinâmica social e temporal interligada ao passado das tradições familiares; o presente e o futuro se expressam principalmente por meio de escolhas profissionais, de práticas de herança e de estratégias de migração temporária ou permanente.

Referências

ABRAMOVAY, Ricardo. O Futuro das regiões rurais. Editora da UFRGS. Porto Alegre, 2003.

CARNEIRO, Maria José. Ruralidade: novas identidades em construção. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, n.11, p-53-75, ou. 1998.

Juventude Rural: Vida no campo e projetos para o futuro. Ed. Universitária da UFPE, Recife. 2013.

DURSTON, John. A juventude rural excluída da América Latina: reduzindo a invisibilidade. Trabalho apresentado no Congresso de La Asociacion Latinoamericana de Sociologia (ALAS), 1997.

______. Juventud rural em Brasil y México: reduciendo La invisibilidad. Santiago do Chile: CEPAL, 1998. Disponível em www.cinterfor.org.uy. Acesso em 05/04/2018.

MEDEIRO, Inã Cândido de. Os sujeitos da formação profissional: Os jovens agricultores. In: MEDEIRO, Inã Cândido de. A formação profissional proposta pelo Serta: Construindo o futuro dos jovens no campo. Recife: Ufpe, 2017. Cap. 2. p. 54-60.

MENEZES, Marilda Aparecida; SILVA, M. S. Uma experiência histórica do campesinato do Nordeste In: GODOI, E.P,; MENEZES, M.A., MARIN, R.A. (ORG) Diversidade do campesinato e categorias, Estratégias de reprodução.V.2. São Paulo: Editora UNESP; Brasília, DF: NEAD, 2009.

PAULO, Maria de Assunção Lima de. As construções de identidades e diferenças entre jovens rurais e urbanos em um pequeno município. Tese de doutorado. Recife, UFPE /PPGS, 2010.

RENDIN, Ezequiel. O futuro incerto do jovem rural. Pombal - PB: Intensa, v. 8, n. 1, 30/11/2014.

SOUZA, Romier; CRUZ, Renilton. Educação do campo, Formação Profissional e Agroecologia na Amazônia: Saberes e práticas pedagógicas. Belém: IFPA, 2015.

TAVARES, Mauricio Antunes. Caminhos cruzados, trajetórias entrelaçadas: Vida Social de jovens entre o campo e a cidade no Sertão Pernambucano. 2009. 350 f. Tese (Doutorado) - Curso de Sociologia, PPGS, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2009.

WANDERLEY, Maria de Nazareth Baudel. Juventude Rural: Vida no campo e projetos para o futuro. Ed. Universitária da UFPE, Recife. 2013.

Inã Cândido
Enviado por Inã Cândido em 13/04/2018
Reeditado em 18/05/2018
Código do texto: T6307435
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