A Utilidade
 
O homem pensa.
Pensa conceitualmente quando utiliza os saberes de seu tempo e reconhece a natureza mais íntima, a finalidade, a razão de ser dos acontecimentos, eventos, episódios, fatos.
O mundo das coisas vai se revelando na indagação criteriosa do sujeito pensante, pondo em atividade a razão.
É essa razão que leva cada um de nós a realizar contatos com o outro e com mundo, para o bem ou para o mal. A razão é aquela potência que faz de cada um de nós sujeito de si, sujeito em busca de seus anseios, liberdade, bem-estar, no que desenvolve uma capacidade de reconhecer aparências, aspectos, feitios, feições e de criar regras de convivências.
O que é bom ou mau, o que o social aceita como padrão de convivência ou de repudia, essas atitudes são codificadas nessas regras de convivência. Regras escritas ou não. Nessa convivência surge o erro ou o acerto. É erro aquilo que faz a iniquidade da atitude, a maldade da ação, contudo, o erro não está no ato em si, mas na intenção de causar o dano ao outro. É o ato doloso. É a manobra ou artifício que é inspirada em má-fé, na decisão de violar a lei ou os costumes padrões da sociedade, seja por ação, seja por omissão e com pleno conhecimento do que se está fazendo.
Assim, há uma razão dos nobilitados de virtudes que engrandecem a vida e contribuem para o fortalecimento da humanidade do homem. Há, também, a razão dos desvairados que empobrecem o valor da vida e impedem o desenvolvimento do outro.
Nada disso é novidade.
Essa contraposição e convivência do bem e do mal esteve sempre presente ao longo da história da humanidade. O bem e o mal existem: há os pensamentos venturosos que fazem o mundo ganhar encantamento e existem as ideias negativas, postas como barreiras, que dificultam a realização das esperanças.
A utilidade surge no corpo dessa vivência do ser pensante, do sujeito portador de uma razão que confere intenção naquilo que faz. É mesmo no exercício da razão que o sujeito escolhe para si benefícios, num esforço constante de maximizar o nível geral de felicidade e de bem-estar: “Utilidade é o equilíbrio entre prazer e dor, entre o bem-estar e o sofrimento” (Jeremy Bentham, 1748-1832).
Esse equilíbrio tentado na teoria de Bentham tem um alcance para além do prazer individual, ele (o equilíbrio) somente se tornaria completo por meio de sua extensão para o maior número possível de pessoas.
Na sociedade onde vivemos, é inimaginável o equilíbrio isolado, individual, pois vivemos em esferas sociais dependentes umas das outras, família, trabalho, lazer, religiosidade, saúde, educação... Todas essas esferas são importantes e é a partir delas que fazemos nossa rede social de sobrevivência. Em cada uma dessas esferas e em suas relações, há uma utilidade a ser considerada, há um equilíbrio a ser levado em conta.
A utilidade não é algo que surge espontaneamente como resultado da convivência social, ela é uma construção. A utilidade resulta da decisão consciente de ordenamento da vida humana: há uma identificação do bem e uma correspondente ação para alcançá-lo.
Um exemplo simples é a ideia sugerida no canto Mora na Filosofia, de Caetano Veloso (1942): “Eu vou te dar a decisão/ Botei na balança/ E você não pesou/ Botei na peneira/ E você não passou/ Mora na filosofia/ Pra que rimar amor e dor [...]”.
A tomada de decisão da vida de cada um de nós seria impedir rimar amor e dor. É fugir do sofrimento ou não deixar a dor confundir a sublimidade do amor.
A escolha do caminho de como estabelecer o equilíbrio, que constituirá o bem-estar, é de cada um. Uns buscam isso na religiosidade, outros no lazer esportivo, outros buscam nos ganhos econômicos, outros, como o poeta Vinicius de Moraes (1913- 1980), procuram o prazer no amor à mulher amada, como na estrofe inicial de seu Soneto de Fidelidade:
 
De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Antonio Pereira Sousa
Enviado por Antonio Pereira Sousa em 16/08/2018
Código do texto: T6420601
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