SOB PRESSÃO / UNDER PRESSURE

SOB PRESSÃO / UNDER PRESSURE

“Quando RESISTÊNCIA é vaiar as vaias e reafirmar o talento de quem brilha enquanto os tacanhos se envergonham e nos envergonham”

Para surpresa geral, sessões de cinema a exibir a aclamada cinebiografia do grupo de rock Queen Bohemian Rhapsody (EUA/Reino Unido—2018) não foram notícia pela expectativa dos fãs ou pela pertinência da homenagem ao cantor Freddie Mercury, mas sim pelas vaias e reações homofóbicas que se seguiram às cenas em que o famoso protagonista troca beijos e carícias com outros homens… Os relatos de xingamentos, desaforos, vaias e abandonos nas salas que exibiam o filme ocuparam manchetes em todo o país e mesmo no exterior.

Ainda que tenham sido comportamentos isolados e irrefletidos, duas coisas saltam aos olhos: o desconhecimento sobre o artista cuja vida foram assistir no cinema e, sobretudo—como reflexo dos dias difíceis que temos presenciado—a falta de pudor em manifestar o próprio ódio preconceituoso à afetividade homossexual. Além das palavras de ordem homofóbicas, houve inclusive relatos de manifestações de apoio ao presidente eleito, explicitando se tratar de um ato político e ideológico a postura que defendiam: “Bolsonaro vai pegar vocês!”

Temos andado todos sob pressão. Há um inusitado entendimento de que a vontade da maioria expressa nas urnas dê suporte para toda espécie de agressão gratuita. No entanto, mais do que nunca, percebe-se que tanta raiva contra às minorias na verdade oculta medo. Sim, há exagero no anseio de calar todas as vozes estranhas ao discurso extremista majoritário pela mera constatação de que esse extremismo não suporta o debate. Ou melhor, apenas vocifera cada vez mais alto qualquer bobagem que abafe o ruído dos murmúrios que já se percebem. É por medo de explicitar as evidências de que um bando de despreparados fora eleito para nos governar que nada pode ser contestado.

Afinal, por que temer tanto os perdedores que se reúnem em torno da ideia de RESISTÊNCIA? Razões para ter medo do que virá nós temos, mas, e eles? Eles têm medo de encarar o mito de pés de barro que está diante deles apoiando, pasme-se, a intervenção prévia da Presidência sobre as questões do ENEM! Em nome de quê? Mais homofobia…

Como não falar em RESISTÊNCIA em face de um estado de coisas que só se degrada à medida que a superficialidade dos discursos se torna a superficialidade das ações? Sob quanta pressão é preciso viver antes que se abra mão do direito à visibilidade homoafetiva e todos homossexuais serem recolocados à força nalgum armário que lhes agrade? Porque os mesmos que vaiaram o beijo de Freddie Mercury são os que agridem na rua dois homens de mãos dadas! A sensação que fica é que não é mais condenável sentir ódio de minorias quando o próprio presidente o externa censurando professores e conteúdo do ensino público.

Àqueles que pretendem esvaziar a ideia de RESISTÊNCIA é forçoso afirmar que, mais que uma postura de desobediência civil, trata-se antes de sobrevivência. Parafraseando o lema armamentista tão repetido por bolsonaristas: “ódios matam; ideias, não!” Ter medo de ideias de minorias acuadas é a mais perfeita manifestação do quanto eles temem verdades diversas das próprias…

“Caring about ourselves / This is our last dance / This is our last dance

This is ourselves/ Under pressure /Under pressure/ Pressure”

(David Bowie / Queen)

É isso.

Betim—10 11 2018