Truman Capote em versão genérica

Truman Capote (1924-1984) é, ao lado de apenas uma dúzia de outros autores, o que há de melhor na literatura americana do século XX.

Como Fitzgerald, Hemingway e outros, Capote atravessou o caminho usual dos novelistas da época, aperfeiçoando sua técnica em contos publicados pelas melhores revistas da época até ganhar o prestigiado prêmio O. Henry em 1946.

Seu primeiro romance, "Other Voices, Other Rooms" (1948), foi um grande e polêmico sucesso, basicamente pela maneira pouco usual de abordar o tema do homossexualismo. Por esta época já era um nome reconhecido, o que, se ainda não lhe trouxera fortuna, era o suficiente para alimentar uma vida de dândi.

O livro de contos "Breakfast at Tiffany's" trazia na "faixa-título" a célebre personagem Holly Golightly, eternizada nas telas, posteriormente, por Audrey Hepburn; mas também demonstrava que seu autor, mais que um criador de histórias, era um arguto observador da vida humana, um construtor de figuras arquetípicas que importavam mais que a história, em si - como diriam alguns críticos.

Foi somente com seu auto-declarado "romance de não-ficção" "In Cold Blood" (1958) - relato de uma chacina cometida por dois jovens no estado do Kansas - que Truman Capote ascendeu efetivamente ao Olimpo das Letras americanas. O livro, um verdadeiro "tour-de-force" pelo submundo interiorano, com sua paz de fachada escondendo conflitos internos indeclaráveis, foi fruto de uma investigação jornalística na qual não faltaram lances de paixão, desejo, traição e pura canalhice.

Tudo isso vem à tona agora com o lançamento de "Capote", o filme (2005). Ou não, como diria Caetano. Pois o filme é "tudo isso" e nada disso ao mesmo tempo. Incensado pela crítica do mundo todo como uma obra digna do gênio do autor, o filme derrapa na superficialidade com que trata o relacionamento entre Capote e os dois assassinos, na construção (?) de personagens rasos a partir de originais especialíssimos (como Harper Lee, autora de "To Kill A Mockingbird", um clássico; co-investigadora no início da "reportagem" e melhor amiga de Truman no filme), na sonegação sistemática de informações ao espectador. Detalhes básicos da chacina, por exemplo, só são revelados no final da película, quando nem a atuação soberba de Philip Seymour Hoffmann consegue mais nos prender a atenção.

Enfim: um filme aquém das expectativas, que se sustenta tão somente pela absurdamente eficaz "incorporação" do personagem pelo ator protagonista - um dos melhores de sua geração. Hoffmann realmente "tira leite de pedra" ao construir sua réplica de Truman Capote com economia e precisão, sem jamais revalar no histriônico além do que a História nos fala do autor.

Renato van Wilpe Bach
Enviado por Renato van Wilpe Bach em 19/02/2006
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