A PERDA, O LUTO E A VIDA

A vida é curiosa. Basta parar e olhar ao redor onde a vida acontece. Parei esses dias para ver as reações. Claro, a minha, os da minha família, dos amigos e conhecidos.

No dia da morte do Pr. Joaquim deparei com a minha própria reação. Essa foi a primeira a ser analisada. A incredulidade! Nossa! Como é difícil crer que alguém que conhecemos a tanto tempo, que temos afeto e, de repente, ela se ausenta para sempre. Minha reação imediata foi me dirigir para onde ele e sua família estava. Precisava ver, precisava enterrar para poder me conformar com sua ida. Claro que num misto de incredulidade e dor, o choro acontece. Para uns, o choro é de um alarido sem tamanho, para outros, um choro silencioso, contido, mas cheio de dor; uma dor profunda. Está não pode ser medida.

O outro instante, foi ao descer no aeroporto, bateu uma ansiedade, uma urgência, uma impaciência que só foi aplacada quando, finalmente, três horas depois, pudemos ver seu corpo inerte. Ali, pude ver a extensão da incredulidade. Fiquei simplesmente parada, olhando; pareceu-me uma eternidade. Só então, olhei ao redor e vi uma igreja lotada de pessoas constrangidas, sentidas, chorosas. Gente de todas as idades, desde um garoto de 11 anos chorando copiosamente e filho de um pastor. Andei por todos os locais possíveis da igreja, apenas observando. Em um dado momento, durante a cerimônia, pude então, dar vazão ao choro que estava preso, mas sem escândalos.

Ao sair da igreja, andei pelas ruas principais da pequena Kennedy e vi o comércio fechado. Ao saberem da noticia, o comércio fechou as portas e as pessoas também estavam pasmas com o acontecido.

Mais curioso, ainda, foi ver a solidariedade dos irmãos daquela igreja. Pessoas que demonstraram seu amor para com seu ex-pastor, não somente abraçando, mas cuidando. Que coisa chocantemente linda! Isso, sim, comoveu-me muito! Os verdadeiros amigos, nós sabemos quem são, quando algo drástico acontece, eles estão presentes; na alegria, eles estão presentes. Não com palavras vazias, do simples cumprimento “meus pêsames” ou “meus sentimentos”.

Durante o período em que estive com a família enlutada (minha família), pude ver cenas de carinho, cuidado, amor. Não entraram lá apenas para chorar, mas para alegrar, e dizer que a vida continua, e continua com a sua ajuda, o seu carinho, o seu auxilio. Fiquei curiosamente encantada. Jamais vi cena de tamanho cuidado.

Às sete horas da manhã, batiam a nossa porta, dizendo: viemos tomar café. Traziam algo nas mãos, pão, leite, bolo, queijo, etc.

Curiosamente, não sentíamo-nos invadidos, mas alegres, porque esta era forma de dizer que estavam cuidando de nós. Durante todo o dia, alguém sempre chegava e dava alguma coisa, e em alguns minutos paravam e escutavam minha irmã e a filhas falarem dos anos de convivência, das alegrias e tristezas.

Davam seu ouvido para ouvir. Curiosamente, dei meu ouvido para ouvir, só ouvir, chorar, sorrir. Tivemos momentos de riso, de alegria, apesar das circunstâncias, pois aqueles que estavam ali, prontos para consolar, com palavras e atos que iriam estar presentes.

Fizemos um culto de gratidão no domingo a noite, pela casa que a família estava construindo que, o Pr. Joaquim que queria agradecer e não teve tempo, com a presença de alguns irmãos da igreja que estavam ali, de recesso, por causa do carnaval. Estavam conosco o Pastor Luis, diretor executivo do campo capixaba, o Pr. Cenildo e o Pr. Gelson, amigos do Pr. Joaquim, Pr. Sérgio Andrade, nosso amigo de longa data, entre outros. E tantos outros pastores que, por não conhecer melhor o campo capixaba, cometo o erro gravíssimo de não dizer-lhe os nomes. Foram palavras de ânimo para a família e os para os amigos.

Foram tantos os momentos durante aqueles oito dias. Saí de lá, agradecendo e agradecida a Deus, por ter tido a oportunidade de presenciar o amor, o cuidado, o carinho, de pessoas que nem precisavam se importar. E eles continuam presentes, nos emails, nas ligações telefônicas, nos encontros, nos alimentos que trouxeram, e em tantos outros, que curiosamente, e incredulamente, jamais presenciei nestes últimos 36 anos de vida cristã.

Eles não nos conheciam, mas nos trataram como se fossemos amigos e irmãos de longa data. Isto curiosamente encantou-me. Claro, curiosamente, aqueles irmãos pertencem a uma igreja que tem problemas como qualquer igreja onde há seres humanos, mas naquele momento eles foram servos de Deus, servindo a quem precisava.

Mas, outro fato ainda mais curioso vem acontecendo. Enquanto aqueles irmãos das duas igrejas, de Kennedy e de Alvorada fizeram e estão fazendo pela família do Pr. Joaquim, dando apoio, ouvido, ajuda; outros se afastam. Por que será?

Curiosamente vejo indivíduos que esperam ver um alarido, digno de um circo, com direito a choro compulsivo e quando não vêem isso, ficam frustrados. Talvez alguém até pense que onde não choro, não há sentimentos. Claro que precisamos respeitar a postura das pessoas. Algumas pessoas não têm capacidade de lhe dar com situações onde há perda pela morte ou por outra circunstancia qualquer e, não há nada de errado nisto. Simplesmente, essas pessoas não têm esse dom.

Curiosamente, tenho observado a reação das pessoas que tem nos observado. Alguns dizem: “como fulana é forte, por ela não chora ou como fulana está sentida, ela tem chorado.” As pessoas esperam que se cumpra um ritual. Isso é chocantemente curioso.

Eu aprendi não esperar nada de ninguém, nem de bom nem de ruim. Não dar o céu nem o inferno até que o indivíduo prove o contrário. Isto foi um processo doloroso. E continuo assim. Por isso, fiquei curiosamente perplexa com a capacidade de uma igreja demonstrar amor, cuidado, atenção com alguém ou algumas pessoas que, naquele momento experimentam as surpresas que a vida nos convida a passar.

A grande lição que podemos tirar é que a vida é dinâmica. Ela continua, apesar desses momentos. E aqueles que ficaram vivos precisam se acostumar com a ausência, seguir em frente e viver. E viver mais sabiamente. Tirando lições preciosas dessas experiências, que inclui dor, tristeza, angustia e solidão. Ninguém pode invadir a mente do outro para saber exatamente o que o indivíduo está passando. E luto cessará e a vida continuará e, o sol nascerá novamente brilhante forte, cheio de esperanças, porque é assim que são construídas as teias onde e tecida a vida.