MÍDIA, IGNORÂNCIA e VOYEURISMO

Programas como o Big Brother e a Casa dos Artistas investem pesado na fórmula que já garantia sucesso a outros programas de audiência: cenas em que uma mulher toma uma ducha ou se depila diante das câmeras; lutas corporais na lama, dentro de banheiras com espuma e de casais em pleno ato sexual cobertos por edredons ou lençóis.

Este tipo de programação induz o telespectador a uma atitude de voyeur.

Devidamente catalogado e estudado pela psicologia, o voyeurismo ou mixoscopia, é definido como perversão sexual, distúrbio de comportamento originado pelo medo de entregar-se a intimidades, ou apenas insegurança sobre seu próprio desempenho. O voyeur procura surpreender a intimidade à qual não tem coragem de se entregar. Na impossibilidade de controlar a realidade ou sua sexualidade, o medroso desenvolve então tendências compensatórias, como o ato de espreitar, porque este ele tem a certeza de dominar.

Sendo uma desordem sexual que leva à curiosidade mórbida por tudo o que é privativo, o voyeurismo é justamente a excitação, o prazer mórbido proporcionado pela observação de uma pessoa na sua intimidade; e esta não precisa ser necessariamente sexual.

Embora estes programas exibam diversas gincanas em que concorrem os participantes, o voyeurismo é a verdadeira fórmula de sucesso.

Nos países europeus, reduz-se o tempo de publicidade e evita-se o sensacionalismo nos programas; a especulação em torno da violência e do constrangimento é considerada de mau gosto. Na América Latina, diferentemente, os canais de televisão defendem a idéia de que ética, cada um faz a sua, e o que prevalece são as técnicas mercadológicas e os índices de audiência. Quebrados todos os tabus, vale tudo.

São instituições como a família, a escola e os próprios meios de comunicação com suas propostas culturais que modelam o público. Programas em que o espectador acompanha intrigas e espia intimidades são experiências pouco capacitadoras. Conforme cresce no país o número de alunos de ensino médio e superior, espera-se que melhore a capacidade da população para distinguir o que nos afasta ou aproxima das experiências de consumo estético e cultural.

Nós, cidadãos do consumo, temos cada vez menos capacidade de intervenção nos espetáculos a que assistimos. Somos cada vez menos capazes de reagir à informação, à violência e à falta de ética que nos é imposta. “Evoluir” rumo a uma sociedade sem conflito é o que o capitalismo selvagem propõe em última instância. Sociedade dócil, mackdonaldizada e uniformizada e medíocre.

O cidadão dito ajustado (entenda-se ajustado às conveniências do sistema) repete ao infinito letras de músicas que o reduzem à condição de “tigrão” e de “mulher-cachorra”. Comportadamente, senta-se diante da TV e deixa que o transformem em voyeur.

Pubicado em O Progresso, Dourados, MS

Publicado em Jornal da Praça,MS

Anabela Bingre de Négrier
Enviado por Anabela Bingre de Négrier em 27/05/2006
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